Capitulo II - Caíque

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Acordei na manhã seguinte com uma dor de cabeça fora do normal. Ontem, tinha exagerado especialmente no Whisky e o resultado disso tinha chegado para me tirar do meu sono e me carregar para uma chuveirada.


Quando aceitei o convite de Guilherme para tomar um chopp, não pensei que a noite seria tão boa que me faria acordar com uma tremenda ressaca no dia seguinte.


Suspirei de alivio quando a água gelada bateu sob minha cabeça, aliviando um pouco das marteladas que minha consciência estava dando ali dentro.


Ontem havia chegado tão cansado que do mesmo jeito que estive durante todo o dia e parte da noite, deitei e dormi. O que me resultou em dores pelo corpo e a inicial do meu nome, que mandei lapidar na abotoadura que sempre usava com meus paletós, marcada no meu rosto.


Fora isso, tudo correu tão bem que me assustei comigo mesmo.


Cheguei no Loo'b, onde tinha combinado com Guilherme que nos encontraríamos, e ele já estava lá com Carina e alguns amigos. Estavam jogando dardos, rindo e se divertindo de uma maneira tão leve que fiquei com inveja por não conseguir mais me divertir assim e com medo de estragar a noite de todos por não ser mais o cara extrovertido que era antes. Mas, no momento em que Guilherme me viu, e veio até a mim com um sorriso de orelha a orelha, me fez esquecer de todas as minhas preocupações, fazendo-me concentrar apenas em passar uma noite legal com meu irmão mais novo, tentando, pelo menos, recuperar uma parte daquilo que tinha perdido com ele.


Catharina também veio me cumprimentar, um pouco arredia, já que eu não tinha dado muita liberdade para ela nesses últimos anos. Tentei ao máximo não prestar atenção nas lembranças que ela trazia consigo e expulsei de dentro de mim o lado mais simpático que tinha. E a noite foi ótima. Os amigos de Guilherme, mesmo sendo muito mais novos, eram extremamente acolhedores e me fizeram me sentir no meio da minha própria "turma", mesmo que alguns deles estivessem tentando me bajular o tempo todo por ser Caíque Avellar, o maior empresário do ramo das pedras preciosas. Mas, rapidamente, joguei a bajulação gratuita para a minha lista de "o que ignorar nessa noite" junto com o resto.


Acabou que não me arrependi de ter aceitado me encontrar com Guilherme e mesmo agora, com uma dor de cabeça infernal e vontade nenhuma de encarar o mundo, também não me arrependia.


Sai do chuveiro, me enrolando na toalha e fui para o quarto colocar uma calça e uma camisa. Meu estomago, mesmo debilitado por causa do excesso de álcool da noite anterior, roncava desesperado atrás do cheiro que vinha do andar de baixo.


Desci as escadas, indo direto para cozinha e me deparei com Rosa colocando um prato de macarrão ao molho branco e champignon para mim, o meu preferido.


- Tienes un aspecto terrible, hijo - disse Rosa, com uma careta de reprovação.


- Consecuencias de una buena noche, Rosa - respondi, já devorando a comida que estava no meu prato.


- Sus buenas noches... Cuando usted se casará? Tiene hijos? Quiero cocinar más de una persona!


- Un día, Rosa, un dia...


Rosa era uma senhora de 63 anos, mexicana, baixinha e rechonchuda. Era como minha governanta, organizava tudo em casa desde que me mudei para cá. Quando cheguei na cidade, fiquei desesperado com todo o trabalho que tinha fora e dentro de casa e ela foi o maior achado de toda a minha vida. Além de me poupar da parte doméstica, ela era como uma segunda mãe. Sempre que eu precisava de um pouco de carinho, mesmo que eu não aceitasse muito bem, ela estava pronta para me dar. Ou quando precisava conversar, desabafar sobre alguma coisa que estava me incomodando ou simplesmente xingar tudo e todos que me rodeavam e me deixavam loucos no final do dia, ela estava lá para escutar pacientemente e me dar conselhos. Seus olhos pareciam duas jabuticabas e me sondavam todas as vezes que me via, sempre vasculhando dentro da minha alma. Isso foi uma das coisas que me fez confiar nela logo de cara: seu olhar meigo e compreensivo, mas ao mesmo tempo duro e imponente. Eu sabia que ao escolher ela para cuidar da minha casa, estaria também a escolhendo para cuidar de mim. E é o que ela tem feito, além de me colocar nas rédeas quando precisava.

Romeu e JulietaOnde histórias criam vida. Descubra agora