"Quando você sentir o meu calor, olhe nos meus olhos
É aonde os meus demônios se escondem (...)
Não se aproxime muito
É escuro aqui dentro
É aonde os meus demônios se escondem
É aonde os meus demônios se escondem..." – Imagine Dragons (Demons)O ponto branco já não era mais sólido.
Meus olhos estavam pregados nele desde o momento em que os abri, despertando da inconsciência. Palavras duras ecoavam pela minha cabeça, a culpa destroçava o meu coração recém curado. Minha visão estava turva, desfocando o ponto no teto.
Pisquei. Uma. Duas. Três vezes.
Não estava funcionando. As palavras continuavam ali e as imagens do passado passando como um filme pelos meus olhos, quase sendo projetados nas paredes brancas do quarto.
Era tudo verdade. Sophia estava certa.
Eu nunca tinha feito nada para ajudá-la. Nós nunca movemos sequer um dedo para salvá-la do inferno. Ao contrário, nós a deixamos queimar por tanto tempo que mal sabia se existiria alguma parte sua para resgatar agora.
Por que demoramos tanto? Por que eu demorei tanto para cair na realidade? Por que eu nunca dei importancia para as consequencias das minhas escolhas, das minhas atitudes?
Por que cresci tão tarde?
A palavra mãe sempre foi tão forte. Sempre foi tão reconfortante. Sempre aquecesceu o coração. Será que ela não significava nada para mim? Para Josh ou Guilherme? Ela significava – é claro que significava. Ela fora o nosso bálsamo nos dias negros, fora a nossa fonte de amor e carinho, nossa luz, a pessoa que nos encaminhou para a estrada certa e não nos deixou desviar, quem nos ensinou o que era caráter. Quem nos moldou, quem nos abraçou nos momentos tristes, quem nos cobriu nas noites frias e quem nos beijava a testa antes de dormir.
Ainda sentia o toque quente de seus lábios em minha pele.
Ele destruiu tudo. Destruiu a nossa família, nossa relação entre pai e filho, acabou com a nossa paz, esmagou a chance de amar e o pior dos pecados: nos fez esquecer como amavámos nossa mãe.
Levantei com a mesma emoção com que acordei – nenhuma. Naquele momento, eu estava oco. Não havia nada a qual me apegar, além da tristeza de reconhecer, novamente, o quanto fui covarde perante Marcus Avellar.
Peguei o celular que estava em cima do criado-mudo e disquei o número de Josh. Há tempo essa conversa fora adiada, há tempo eu sempre deixava para lá, mas agora o tempo já não queria mais passar a mão em nossas cabeças. Ele tinha chegado ao fim.
Um. Dois. Três toques e Josh atendeu, sua voz gélida com um toque suave de ternura. Era assim que ele sempre fora: meio termo. Nunca mostrando realmente qual lado o dominava mais, apesar de sua postura deixar claro que gelado era seu estado.
- Josh – o saudei. Meu tom quase implorava por sua compreensão.
- O que houve? – ele me conhecia. Nos criou a vida inteira e sabia, até pelo modo que respirávamos, o que se passava em nossas mentes. Eu o amava com toda a minha vida e morreria por ele de todas as maneiras, se fosse preciso.
- Eu estava pensando na mãe. – disse, direto e claro.
O silêncio caiu profundo e repleto de mágoas do passado. Josh não tinha a melhor relação com a nossa mãe, por mais que os dois se esforçassem para mostrar diferente. Ele a afastava de todas as formas e eu sabia que ela tinha feito algo que o machucara tão fundo que a única saída para ele fora se trancar. No seu mundo. Dentro de sí.
Tão dentro que era difícil ter acesso ao seu interior.
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Romeu e Julieta
RomancePassaram-se dez anos desde da tragédia que marcou para sempre a vida de Caíque e Sophia. Se apaixonaram quando eram adolescentes mas suas familias nunca aceitaram o amor dos dois, fazendo com que se rebelassem e tentassem de todas as formas ficarem...