Capitulo XXV - Sophia (parte 02)

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"Como você pode ver através dos meus olhos
Como portas abertas 

Conduzindo você até o meu interior 
Onde eu me tornei tão entorpecido?
Sem uma alma
Meu espirito dorme em algum lugar frio
Até que você o encontre e o leve de volta para casa..."  – Evanescence (Bring Me To Life) 

 A consciência voltou ao meu corpo entorpecido como um soco. Um soco forte e violento, daqueles que deixam uma dor de cabeça insuportável. 

Gemi, lamentando todos os danos que meu cerébro insistia em tomar nota a cada segundo em que ele tomava posse de todo o seu poder. Tudo em mim parecia doer com tanto afinco que estava tornando impossível até o movimento de respirar. 

E aquele era o único movimento que meu corpo produzia no momento: o subir e descer do meu peito desesperado em manter suas funções. Nada mais funcionava. Tudo estava em um estado de dormência infinita. 

O desespero começou a rastejar para o meu corpo com tanta rapidez quanto uma praga. Eu queria me debater, queria gritar por socorro, queria me soltar do que quer que estivesse me prendendo no banco daquele carro, mas meu cerébro parecia apenas funcionar para suas funções mais básicas. 

Deus, por que sempre comigo? – as lágrimas começaram a chegar aos meus olhos acionadas por aquela pergunta que parecia me perseguir por toda uma vida. E a resposta nunca chegava. Ninguém nunca sussurrou para mim qualquer tipo de explicação para as coisas ruins sempre cairem no meu colo ou o por que as pessoas á minha volta sempre queriam me machucar de alguma maneira. Nunca ouve nada além de um silêncio completo. 

Inferno! Eu não merecia isso! – eu merecia uma casinha branca em um bairro de classe média baixa, vivendo uma infancia feliz ao lado de um pai que não fosse mentalmente instável e uma mãe que não fosse covarde por toda a sua existência. Merecia ser tratada com respeito e carinho, não espancada até o último fio de consciência. Merecia ter uma história de amor livre de pais obcecados por dinheiro e por seus filhos. Merecia sempre ser protegida e nunca abandonada. Merecia ter uma vida em paz com a filha que eu uma vez perdi e com a filha que eu ganhei da vida. Eu merecia um romance tranquilo. Amizades tranquilas. Eu merecia mais do que cacos despedaçados em uma rodovia. 

Eu merecia algo mais do que essa porra de vida! Uma estrada a mais para seguir em vez de só as esburacadas. Deus, o que eu fiz para você? – eu queria gritar. Gritar até os meus pulmões arderem com o esforço. Gritar até que os tímpanos do maldito pai que a vida me deu estourassem. Mas, não podia. Minha boca estava amarrada com uma tira de pano grossa evitando qualquer movimento de abrir e fechar da minha mandíbula. 

Chorei ainda mais. Os soluços abrindo caminho pela minha garganta seca demais e ecoando pelo espaço silêncioso do carro. 

Eu não podia soltar nem a merda de um grito. Eu não podia mover o meu corpo de merda também. Então o que me restava nessa maldita vida além de chorar até perder as forças? De lamentar em ter sido arrancada do futuro sólido que eu estava construindo? O que me restava além de chorar pelos olhos verdes infestados de chamas que sempre me levaram á loucura? O que me restava além de lamentar com todo o meu coração em nunca mais ter as minhas mãos acariciando os caichinhos dourados e tão macios da minha pequena garotinha? O que me restava além das lembranças que eu nunca teria de Ellen se apresentando com sua dança impecável ao som de uma música que ela mesma compôs em seu futuro piano? 

Não me restava mais nada, essa era a resposta. 

Eu estava cansada de lutar contra o que eu destino queria. E ele queria que a minha vida fosse reduzida a pó em baixo dos pés de Pedro. 

Desliguei minha mente de tudo que me atormentava e pesava o meu coração. A minha cota de desastres nessa vida tinha acabado de chegar ao limite e eu estava entregando as minhas armas. Eu era uma soldada que tinha cansado da guerra. Uma desertora. 

Romeu e JulietaOnde histórias criam vida. Descubra agora