Romeu e Julieta

Bônus: Decisões

Dedicado a minha mãe, vó e ao meu pai-drasto, que cuidam, zelam e olham por mim em todas as horas, mesmo quando eu não mereço. Eu sei o que é ser mãe e amar como tal por causa de vocês. E nada mais digno do que dedicar esse bônus para vocês, já que ele é o começo de mais uma etapa, a mais especial de todas. Amo vocês. ♥ 

As flores do jardim balançavam com a brisa fresca que soprava suavemente, algumas mechas do meu cabelo prediam nos meus lábios enquanto estava sentada na primeira escada da varanda da enorme casa de madeira branca, observando a menina linda, dos olhos azuis e cabelos tão loiros que qualquer um que a visse deitada na grama daquele jeito, pensaria que eram milhares de fios de ouro reluzindo ao sol. 
Ela adorava ficar lá, olhando para o céu, sentindo o vento soprar sua pele, absorvendo toda a energia que a terra e as folhas pareciam dar para ela de boa vontade; adorava receber os raios bondosos do sol em sua pele e conversar com as flores que pareciam abrir-se e ficar mais coloridas quando ela estava por perto. Ela parecia fazer parte daquele ambiente, como uma flor humana. Tinha uma doçura e leveza invejável, uma compreensão das coisas que aconteciam ao seu redor que criança nenhuma deveria ter, era madura para apenas dez anos de idade. 

Eu tinha me apegado á ela desde o primeiro momento em que a vi, enroladinha em uma manta rosa, tão pequenininha e frágil, mas ao mesmo tempo tão decidida a viver neste mundo que já estava com os olhinhos azuis – que eu costumava chamar de bolinhas de gude – abertos, observando tudo ao seu redor e reconhecendo o seu novo mundo. 

Na época minha mãe não explicou muito bem como ela foi parar conosco, mas como nós sempre tivemos um orfanato, para mim crianças sem lar e família eram normais por ali. Só depois de um tempo, quando eu estava com idade o suficiente para saber de toda a história por trás daquela garotinha que eu tinha como uma irmã, é que ela me contou. 
Minha primeira reação foi o espanto por saber que ela tinha uma família que sempre a quis, a segunda reação foi o nojo dos dois homens que destruiram um laço que deveria começar e durar a vida toda, e a terceira foi o desespero de perdê-la em algum momento. 

Eu amava todas as crianças das quais cuidavamos, eu sempre tive esse lado materno ativo desde quando achei que tinha idade o suficiente para cuidar de outras crianças, mesmo que eu ainda fosse uma, mas Anabelle era diferente. O amor que eu sentia por ela era incondicional, um sentimento tão puro e tão forte que lágrimas brotavam em meus olhos toda vez que ruminava sua história e chegava a conclusão que já tinha passado da hora de atender ao último pedido de minha mãe. 

Fazia quatro anos desde que um acidente de carro a levou de nós, e por incrível que pareça, no mesmo dia em que saiu de encontro á morte, ela me disse que havia uma carta em cima da minha cama e que era para eu guardar até o dia em que ela partisse dessa para melhor, só depois disso ler o que ela havia escrito para mim. Suas palavras eram claras e desesperadas, e me doía muito, mesmo depois de anos, ainda não ter cumprido com seu desejo. 

Levei minhas mãos a cabeça e massageei minhas tempôras. Era tão difícil... 
Anabelle era tudo que me sobrara, toda a família que me restou e abrir mão dela assim para pessoas que ela nunca conviveu ou teve contato na vida me causava arrepios. 
Eu estava sozinha e ficaria ainda mais quando ela se fosse, mas eu não podia mais carregar a culpa de mante-la aqui enquanto existiam duas pessoas que a amavam e sofriam pela sua perda encenada. 

Malditos! Odiava aqueles que fizeram isso com a minha pobre irmãzinha... Se não fosse minha mãe, ela realmente teria o fim que todos pensam que levou. Lembro-me muito bem da feição aterrorizada de minha mãe quando me contou que o homem que mandou Anabelle para cá disse que não queria saber o que ela faria com o pobre bebêzinho, apenas que desse um fim nele. E como se não bastasse as palavras horríveis, ele ainda acrescentou que se ela não tivesse coragem de fazer, ele jogaria o pacotinho rosa e delicado em qualquer caçamba de lixo para que nunca fosse encontrado.