Também Desisto Das Espadas | Capítulo Nove

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Se atrasou propositalmente para encontrar Kenan no dia seguinte. Demorou para sair de seu quarto, enrolou enquanto subia os degraus de mármore e hesitou quando chegou às portas duplas, receosa de se ver de novo na dimensão humana, de estar no meio de alguma cena que a destruiria como aquelas duas últimas fizeram.

Por fim, Clarissa deixou que os dedos se apertassem em volta dos puxadores das portas e deixou que elas se abrissem enquanto permanecia tensa, esperando se ver no meio de uma rua escura, algum lugar em San Francisco.

Nada disso aconteceu, viu a sala se abrindo ao seu redor e milhares de Clarissas se refletindo nos espelhos que já conhecia. Sem nada de diferente ou surpreendente, sentiu-se desconfiada quando adentrou a sala, com passos lentos e viu Kenan de braços cruzados, ao lado do suporte de espadas.

Malusinal.

— Aposto que já me odeia o suficiente para querer me atacar, então eu prefiro que faça isso com uma espada. — Nada de oi ou qualquer cumprimento, ele foi logo lhe esticando a lâmina comprida que tinha em mãos e Clarissa franziu as sobrancelhas. Kenan não parecia se incomodar com o que ela pensava dele.

— Não vou usar uma espada — contestou, fitando-lhe nos olhos e Kenan sorriu com ironia, como se estivesse dizendo que não tinha escolha. Clarissa realmente queria atacá-lo e tirar aquele sorrisinho insolente de seu rosto.

— Acredite, você vai — respondeu, com uma calma excessiva que acabou com sua paciência.

— Eu leio sobre lutas, Kenan, não luto. Quero assumir uma função na biblioteca — explicou, revirando os olhos e mantendo o tom de voz seco. Nem isso pareceu tirar a calma de Kenan, que ainda lhe encarava com aquele sorrisinho sarcástico e os olhos cheios de chamas que poderiam lhe queimar se quisesse.

— A biblioteca, aquele lugar cheio de livros raros e poderosos que muitos demônios fariam de tudo para colocar as mãos? — questionou, levantando as sobrancelhas com um ar de desdém. — A biblioteca, que em importância só perde para o salão de armas e seria o lugar mais provável de ser invadido? — Clarissa mais uma vez revirou os olhos de forma irritada e enraivecida, engolindo o orgulho ferido ao pegar a espada que ele lhe oferecia e apertar o punhal com força demais. Sua imagem se refletiu na lâmina reluzindo em prateado, os cabelos loiros caindo em cachos bagunçados e desordenados.

— Tire essa expressão irritada da cara, Clarissa, será seu dever como querubim proteger essa dimensão e aprender a lutar para quando for necessário — retrucou ele, pegando a própria espada para que pudessem começar a prática. As lâminas cintilaram quando caminharam para o centro do salão e a loira observava a forma como segurava a espada pelo espelho, ajeitando a postura, exatamente como Lucas havia lhe instruído quanto tentara lhe mostrar o básico sobre espadas.

Havia algo no modo com que Kenan falara que lhe deixou nervosa. Aprender a lutar para quando for necessário. Não se for necessário, mas quando. Precisaria lutar e isso era uma certeza.

— Nada de missões na dimensão humana, então? — Voltou-se para Kenan, as sobrancelhas erguidas em uma expressão quase surpresa. Kenan sorriu, os olhos dourados cintilaram como os de Elisa, cheios de chamas internas.

— Suponho que não queira voltar tão cedo — sugeriu e Clarissa apenas forçou um suspiro profundo, assentindo.

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O salão ficou em silêncio quando a porta se abriu e o som dos saltos da ruiva reverberou por todo o local. Tanto Ethan quanto Lynn se voltaram para Elisa com um olhar surpreso enquanto a garota atravessava o grande salão, os saltos brancos afiados ecoando contra o piso de mármore e os cabelos parecendo refletir com o mesmo dourado dos arabescos de ouro na parede. O vestido longo flutuava ao redor de seus tornozelos de uma forma delicada, quase nobre, mas sua postura e seu olhar exibiam uma autoridade inquestionável.

Delírio | Criaturas CelestiaisOnde histórias criam vida. Descubra agora