Elisa se virou quando a porta da igreja se abriu. Era uma igreja envelhecida e deteriorada, não havia iluminação além das velas que tremeluziam e lançavam uma luz fraca sobre os bancos empoeirados e a madeira manchada.
Quando ela entrou na igreja, parecia se mesclar à escuridão como uma espécie de entidade sombria, seus cabelos negros ondulando e absorvendo a luz das velas. Não estava sozinha, Ryan estava junto dela, ambos com roupas bagunçadas e amassadas, pareciam cansados como se houvessem saído direto da cama... como se tivessem dormido juntos.
Era quase uma e meia da manhã, afinal. Ainda era estranho, como se, de algum modo, ela estivesse traindo Liam, mesmo que não usasse mais a aliança.
Ela lhe viu, os olhos escuros arregalados e surpresos. Finalmente a garota abriu um sorriso que pareceu iluminar sua face e Elisa sorriu também, as duas se abraçaram com certa urgência. A ruiva quase suspirou de alívio. Ela podia lhe ver.
— Faz anos — murmurou Sara, de forma quase trêmula. Quando se separaram e lhe encarou, sentiu tudo voltando como uma onda, como sempre acontecia quando lhe via. As lembranças já não eram tão sufocantes, encarava tudo com certa nostalgia que ainda lhe apertava o peito.
O Ouija, o desespero, tudo o que passaram juntas até... Até morrer e se tornar uma querubim.
— Me desculpe, queria ser mais presente — pediu, sem conseguir esconder a culpa e Sara tensionou os lábios. Sabia que ela compreendia, mas não gostava nada daquilo, das barreiras que tinha com os humanos e o modo como Elisa e ela nunca mais puderam manter contato. Eram as regras, não podia simplesmente ficar entre os humanos, por mais que desejasse isso. — Você disse anos? — indagou, as sobrancelhas franzidas em confusão. Uma pontada de pânico lhe fez fechar as mãos em punhos quando pensou em Clarissa e no estado de coma.
— Dois anos e meio desde que você sumiu de novo — disse, em um tom quase triste. Elisa estremeceu. Havia perdido a noção do tempo da dimensão humana novamente, nem de longe tanto tempo havia se passado em Onyx. Sumiu de novo. Certamente, quando ela e Clarissa foram para a dimensão dos querubins.
Encarou Sara, seus familiares olhos escuros e os cabelos negros como a noite, ondulando ao redor de sua pele pálida. Ela parecia a perfeita personificação da Lua e da escuridão, sua beleza era estonteante e luminosa, ao mesmo tempo que a escuridão parecia lhe cercar como um perfume intrigante.
Não podia esperar nada menos da filha de Lúcifer, afinal.
« ♡ »
— Eu odeio aparecer só quando preciso de ajuda, mas... — murmurou, fazendo Sara sorrir. Ela colocou os cabelos para trás da orelha e Elisa percebeu que estavam bem mais curtos do que ela costumava usar antes.
As olheiras em sua face lhe preocupavam, o modo como os ossos de seu rosto estavam ressaltados lhe deixava minúscula, muito diferente daquela outra garota que conhecera. Tudo aquilo lhe preocupava, essa aparência de cansaço e abatimento era como um soco no estômago.
— Já passamos deste ponto, Liz — garantiu, dando mais um gole na bebida gelada. Os cubinhos de gelo batiam no vidro e Elisa conseguia sentir o cheiro de álcool dali. Até poderia beber enquanto estava na dimensão humana, mas estava ansiosa demais para isso. — Você me salvou mais vezes do que eu posso contar, ficarei feliz em ajudar como puder — completou, fazendo um nó surgir na garganta da ruiva. Fazia tudo o que podia para ajudar, para estar próxima, mas não parecia o suficiente e, de fato, suas visitas raras não eram de grande ajuda.
Sabia que havia ficado perdida quando seus pais morreram, que havia se isolado em uma bolha própria, mas Sara parecia ter levado o luto para um nível mais abaixo quando perdera o filho e se afastara do marido. Ela parecia estar se deteriorando aos poucos, tornando-se uma sombra da garota que costumava conhecer e isso lhe partia aos poucos.
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Delírio | Criaturas Celestiais
خيال (فانتازيا)•Criaturas Celestiais | Livro Um• "Garotas mortas ainda podem amar." Muitos consideram a morte como um descanso, um fim tranquilo depois de uma vida agitada, mas a morte foi apenas o começo das complicações para Clarissa. Quando Clarissa Byers...