Não ficou exatamente surpresa quando Elisa bateu à porta de seu quarto, algum tempo depois. Uma parte de si estava meio que esperando aquilo.
Elisa a abriu lentamente quando a loira não respondeu, Clarissa estava sentada na cama com um livro no colo. Levantou o olhar para ela e as duas se encararam por um tenso momento, em um silêncio que poderia muito bem ser uma pequena pausa antes de um anúncio de guerra.
A ruiva suspirou, adentrando o cômodo e fechando a porta atrás de si.
— Eu odeio isso e agora também estou me odiando — disse, lhe encarando. Clarissa percebeu que seu tom de voz estava estranho e meio embaralhado, baixou o olhar e viu a garrafa em sua mão, como o líquido dourado pela metade.
— Ah, ótimo, você estava bebendo — murmurou, revirando os olhos. Elisa deu de ombros, indiferente enquanto observava a estante cheia de livros.
A dela era diferente das que via na biblioteca. As da biblioteca tinham livros extremamente organizados, combinando cores e tamanhos, mas a de Clarissa era bagunçada e desigual, certamente exalava vida e significava que era muito usada.
— Você é a única pessoa sensata em que confio o suficiente para me impedir de fazer algo errado e estou bem longe de estar sóbria agora — confessou, voltando-se para a loira. Clarissa deixou o livro de lado, levantando uma sobrancelha com desdém. — Não que estar sóbria signifique que eu tomo boas decisões — emendou, rindo fracamente, mas sem qualquer humor.
A loira lhe encarou por alguns segundos, em silêncio, e Elisa teve medo de que ela lhe mandasse sair e ficar longe. O olhar de Clarissa era quase duro, mas então se desmanchou em um suspiro fraco quando desviou o olhar.
Ela abriu espaço na cama, batendo levemente no colchão em um gesto para que a ruiva se aproximasse. É claro que Clarissa estava se questionando se aquela era a decisão certa, mas o que podia fazer, afinal? Era melhor saber que ela estava ali, bem, do que ficar imaginando se ela estaria nos braços de Asmodeus assim que a mandasse sair.
Elisa deixou-se cair na cama ao seu lado, o que fez uma onda de nostalgia tomar conta de Clarissa. Não foram poucas as vezes em que elas ficaram assim, lado a lado em uma cama enquanto Clarissa lia e Elisa assistia alguma coisa na televisão, ou apenas deitavam juntas, abraçadas, e comiam pizza enquanto assistiam algum seriado ruim de comédia.
Essa cumplicidade era o que mais gostava no relacionamento das duas, mas havia se perdido junto com as memórias de Elisa.
— Sinto muito, aquilo não deveria ter acontecido — começou ela, olhando para o teto. Os cabelos ruivos se espalhavam como rios de lava pelo travesseiro, Clarissa resistiu ao impulso de tocá-los e sentir sua textura familiar. — Eu sei que ele é um idiota, que não vale a pena, é só... não posso negar que há algo intenso e alguma química entre nós, mas é só isso. Você estava certa. Ele não se importa comigo, ele não está interessado em quem eu sou. — Aquilo fez Clarissa se silenciar, como se pudesse ouvir todas as dúvidas em seu interior e tentar se orientar para lhe dar uma resposta.
— Você fica me dizendo isso, mas nunca consigo dizer se sua sinceridade vai acabar quando encontrá-lo — murmurou, deslizando até estar deitada ao lado dela na cama. — Eu só estou tão confusa e tão irritada que poderia...
— Me beijar? — completou Elisa, com um sorriso que definitivamente fez algo dentro de Clarissa falsear e alguma barreira se quebrar. A loira revirou os olhos, pensando no salão e na discussão das duas.
— Sim, mas não vou fazer isso. — Desviou o olhar, sem querer encarar o sorriso dela e pensar em como ela estava próxima, como seria fácil beijá-la. Revirou-se entre os lençóis, afundando no travesseiro.
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Delírio | Criaturas Celestiais
Fantasía•Criaturas Celestiais | Livro Um• "Garotas mortas ainda podem amar." Muitos consideram a morte como um descanso, um fim tranquilo depois de uma vida agitada, mas a morte foi apenas o começo das complicações para Clarissa. Quando Clarissa Byers...