II

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Depois de torrar um pouco no sol, resolvi me molhar uma última vez na água doce, depois voltar para a pousada e tentar fazer o check-in. Não havia nenhum estacionamento e nem árvores por perto, então o carro estava pegando fogo. Caso eu tivesse trazido um ovo, este estaria certamente cozido. Peguei o celular, mas estava descarregado. Vesti uma camisa, calcei o chinelo e fui verificar com a mulher da cara redonda se já poderia ir para o quarto.

Ela me deu a chave do quarto número cinco. Voltei para o carro, peguei o resto das minhas coisas e fui até os aponsentos que ficavam no segundo andar. A pousada era em formato de "U", com os quartos rodeando a piscina que ficava ao centro e se estendia um pouco mais além, e, ao fim, um pequeno bar que servia petiscos e bebidas. A piscina estava vazia aquela hora, mas no bar havia um casal conversando, o que me trouxa a ideia de aproveitar a calmaria do momento e tomar um banho naquela água cristalina repleta de cloro. Fui até o quarto para pegar uma toalha e voltei até o deck, onde tudo permanecia igual, inclusive o casal conversando no bar.

A água estava na temperatura ideal para me refrescar sem fazer com que meu corpo tremesse de frio. Mantive os óculos escuros no rosto porque àquela altura o sol ainda estava forte, e a sombra da pousada não chegava até a piscina. Mergulhei algumas vezes e tive eventuais tentativas falhas de boiar na piscina, até que me dei conta de que a mulher agora estava sozinha e o seu namorado, ou marido, já não estava mais presente. No momento, ela se encontrava em uma posição mais próxima a mim, deitada na espreguiçadeira com um livro nas mãos. A curiosidade literária foi maior do que qualquer outra coisa, inclusive do que o medo de apanhar do rapaz de porte atlético que a acompanhava anteriormente. Nadei até a borda da piscina e consegui enxergar a capa inigualável do "Inferno" de Dan Brown dobrada, com o livro aberto aparentemente na metade. Eu já tinha lido uma vez, aquele que considero o melhor livro do autor, e visto o filme no cinema, que não se compara à qualidade da versão impressa. A jovem de cabelos pintados de loiro percebeu minha aproximação e me olhou rapidamente ao abaixar o livro, dando uma brecha para eu observar que havia nela qualidades que não enxerguei enquanto a avistei com o namorado. Dei de cara com grandes seios chamativos que me deram vontade de puxar assunto sobre o tema que mais gosto. Poderia iniciar uma conversa sobre o quanto tinha gostado do "Inferno" e indicar leituras mais interessantes enquanto fitava seus belos peitos, mas contive meu animal interior momentaneamente, atendo-me apenas a observá-la por detrás dos meus óculos escuros. A tentativa, porém, foi em vão, visto que ela percebeu os meus olhares demorados na sua direção, a única pessoa nas redondezas. Na minha cabeça, fui totalmente furtivo e ainda tive os olhos amparados pela escuridão das lentes, mas, às vezes, as coisas não acontecem muito bem como imaginamos. Ela então levantou os óculos para me encarar de volta, revelando seus olhos claros e atrativos, o que tornou a situação bastante esquisita e constrangedora, quase como um jogo de "quem piscar primeiro perde". O que inicialmente poderia ser considerado como um flerte, agora havia se tornado um desafio, em que eu teria minha honra abalada se desviasse o olhar. Subitamente, subiu os óculos e voltou a ler suas incansáveis páginas, desistindo do nosso jogo — provavelmente pensando que eu era algum esquisito.

— Você vai adorar o final — aproximei-me e falei sem pensar. A questão de honra agora era desvendar os mistérios da loira.

— Que? — perguntou sem entender nada, abaixando o livro novamente. Deparei-me com seus grandes seios outra vez, primeira vitória conquistada.

— É o melhor livro de Dan Brown. Já li todos.

— Parabéns — disse friamente, erguendo novamente o livro.

Escrota insensível.

— Estou de sacanagem contigo — abaixou o livro, revelando seu sorriso por detrás da capa vermelha de Inferno. — Devia ter visto sua cara.

E se for tudo um sonho?Onde histórias criam vida. Descubra agora