"Achei que você ia ficar mais tempo. Fomos dormir tão tarde". Essa foi a primeira mensagem que me deparei ao, finalmente, conseguir conectar meu celular em um carregador. Foi um pouco frustrante dar de cara com o irmão de Priscila, já que eu aguardava ansiosamente minha psicóloga suada chegar para tomarmos banho juntos e testarmos novas posições sexuais ao longo da manhã de sábado.
"Seu irmão não te falou nada?", respondi e deixei o celular de lado enquanto procurava algo para comer dentro da geladeira. O celular vibrou alguns segundos depois.
"Acabei de perguntar. Ele te mostrou a arma, foi?"
"Fingiu que era seu namorado, marido, sei lá. Depois perguntou se eu queria ver as outras armas... o maluco".
"Meu Deus, não acredito que ele fez isso... Vou falar com ele".
Visualizei a mensagem, mas não respondi naquele momento. Preparei um sanduíche de queijo e presunto e tomei meu café da manhã dos campeões junto com Nescau gelado. O ventilador do meu apartamento não estava dando conta do calor terrível daquela manhã ensolarada, então a imagem do quarto de Priscila veio à minha cabeça e também a saudade daquele ar condicionado marcando 19°. Comecei a assistir a um jogo de vôlei feminino que passava na TV, que parecia ser algum campeonato em que o Brasil jogava contra a Polônia. Aparentava ser uma partida fácil, mas o que eu poderia comentar sobre isso? Entendia quase nada do esporte, mas era divertido assistir. E, também, todos sabiam que a seleção feminina do Brasil sempre ganhava tudo. Outra parte boa era observar aquelas moças em shorts curtos e apertados se jogando no chão a todo momento, e as câmeras dando close nas bundas malhadas, principalmente aquela Rosamaria, que não era a melhor em campo, mas com certeza seria a melhor na minha cama.
Após lavar as mãos, vi que o celular já estava repleto de novas mensagens, como se todos os meus conhecidos tivessem acordado ao mesmo tempo. Para tornar meu dia um pouco pior do que já estava, a primeira mensagem que li foi a de Fernanda.
"10 dias depois de terminar comigo você já está por aí comendo vagabundas, mas isso não vai ficar assim. Anote minhas palavras".
O meu coração deu um salto assustado. Como ela sabia? Será que tinha ido ao bar ontem à noite me vigiar e me viu saindo com Priscila? Esse comportamento exagerado, beirando o doentio, foi um dos motivos que me fez terminar com ela. Após começar com as meditações, pude perceber finalmente o quão prejudicial aquele relacionamento estava sendo tanto para mim quanto para ela.
"Você está me seguindo, Fernanda?! Isso é doença!"
Larguei o celular de volta no sofá antes de ler as demais mensagens. Priscila podia esperar mais um pouco até eu conseguir colocar a cabeça de volta no lugar. Antes de desligar a TV, dei uma olhada no placar que já estava 2 sets a 1 para o Brasil, o que indicava que a vitória estava próxima, a única coisa que consegui decifrar sobre a partida.
Sentei-me ao chão, em frente ao sofá, na posição de lótus, e então comecei a colocar em prática os ensinamentos da minha coach emocional. Fechei os olhos e concentrei os pensamentos na minha respiração, aproveitando aquela manhã de sábado para relaxar e tentar me afastar dos problemas.
Após dez ou quinze minutos, abri os olhos novamente e, com a mente mais limpa, peguei o celular outra vez, pronto para ler a resposta de Fernanda sem entrar em autocombustão, mas, para minha surpresa, não havia nada. Ela visualizou minha mensagem e não a respondeu, estranhamente, o que não condizia com seu comportamento impulsivo característico. Melhor assim.
"O idiota disse que só estava brincando. Agora ele sabe que, se fizer algo assim novamente, tomará uma surra de chinelo", dizia Priscila.
"Duvido que ele não faça. O rapaz é encapetado, tem a alma com um pé no inferno", respondi instantaneamente. Olhei o resto das mensagens, mas eram só coisas engraçadas e o pessoal terminando de confirmar a reunião de mais tarde na casa de Marcos. Assinei a minha presença e voltei para a conversa com Priscila.
"Não fala uma coisa dessas, Deus o livre... Tem planos para hoje? Quero te recompensar pelo susto".
Quem diria, hein, Doutora? Como recusar uma proposta como essa? Só pegaria mal mesmo porque acabei de confirmar presença no evento da casa de Marcos, mas tenho certeza que ele e o resto dos meus amigos entenderiam a minha ausência.
"Zero planos", menti. "O que tem em mente?"
"Vou almoçar com meu irmão mais tarde, mas de noite estarei livre".
"Passo aí para te buscar então. Até lá resolvo onde iremos".
"Não precisa. Vou com meu carro, porque não vou beber".
"Relaxa, também não vou beber. Mais tarde passo aí".
Muito. Não vou beber muito. Não sei se ela acreditava no que havia dito, mas eu com certeza não confiava nas minhas palavras. Sair e não beber nada não combinava muito com meu tipo de evento, a não ser que fôssemos a um cinema, mas hoje não. Hoje seria uma noite de esbórnia.
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E se for tudo um sonho?
Romance"E se for tudo um sonho?" conta a história da vida de Henrique Polyakov, dividida em dois períodos de tempo distintos, um em meados de 2017 e outro no final de 2019. Aficionado em observar pessoas e seus comportamentos, o corretor de imóveis de 32...