28.

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DAY

Alessandra passou dos limites e após inacreditáveis doze drinks, obviamente, ela perdeu a noção.
Eu a levantei da cadeira com muito custo e fui em direção ao meu carro com ela enroscada no meu pescoço. Seus pés tropeçavam neles mesmos enquanto ela cantava sem parar com a voz mais bêbada que já ouvi:
- É mágoa... Tô dizendo de ante mão!
- Shhh, Alessandra! Você tá causando muito, se controla!
- Ihhh, alá ela, ainda me chamando de Alessandra... Agora que eu canto mais alto: ATIREI UMA PEDRA NA SUA JANELA!
- Ei! Ei! Ei! Tudo bem! Alê, Alê, Alê! Você agora pode falar mais baixo? Tá me deixando constrangida.
Ela amansa a voz como num sussurro e continua a cantoria:
- Minha raiva quase transpassa a espessura do seu vidro!
Meu Deus! Ela não vai parar mesmo!
Eu a coloco dentro do carro e vou afivelar o seu cinto, quando ela segura minha mão no engate do cinto me fazendo ficar com as duas mãos apoiadas ao redor dela e nossos rostos muito perto. Perto demais.
Ela me olha nos olhos com aquele brilho no olhar que só ela tem.
- Day... Por que as pessoas são tão idiotas? Sabe, eu gosto mesmo daquela filha da puta, e ela nem me merece, hahaha!
Eu me sinto surpreendentemente desapontada por ela voltar a falar de Isadora.
- Não gosta não. Você acha que gosta.
Tento me soltar mas ela me segura.
- Como assim acho que gosto?
Eu faço um esforço puxando meu corpo pra longe do dela e volto a ficar completamente de pé.
- Vamos embora, você tá bêbada demais pra gente continuar esse papo.
Ela sorri como se tivesse esquecido o que acabou de me perguntar e volta a cantar:
- Água de torneira não volta! E eu vou embora, adeus!
Eu entro no carro e começo a dirigir enquanto ela embaralha todas as estrofes da música. Eu a olho de canto e não consigo deixar de sorrir, que companhia agradável! Por mais que a gente tenha cutucado nossas feridas a noite inteira, eu mal consigo me lembrar há quanto tempo eu não me sentia tão bem. Eu não sei nada sobre essa mulher mas, definitivamente, eu não quero que ela saia de perto de mim.

- Você conhece?
- O que?
- Essa música.
- Ah! Sim, claro. Ana Carolina é a rainha da minha sofrencia.
- Ela éeeee! Num é?! Nossa, ela é! Eu daria meu coração pra ela! Você não?
Eu rio do tanto que essa garota está bêbada e das coisas sem sentido que ela diz com tanta paixão.
- Tá rindo do que?
- De nada.
Ela vem e me dá um soquinho no braço.
- Falaaa! Eu tô passando vergonha, né?
- Tá tudo bem. Estou me divertindo aqui.
- Se divertindo com a minha cara, com o meu porre, né?!
- Também.
- Então eu vou voltar a cantar! VAMO CANTAR ANA! CANTA COMIGO!
Ela abaixa o tom de voz e segue cantando:
- Eu que não sei quase nada do mar descobri que não sei nada de mim...
Não sei mais parar de sorrir. Que dupla! Eu sorrindo que nem uma idiota enquanto dirijo ao lado de uma pessoa nitidamente bêbada cantando músicas de sapatão derrotada.
Eu rio dessa cena como se eu a tivesse vendo de fora.

Assim que chegamos no estúdio ela vai em direção do carro dela.
- Ei! Aonde você pensa que vai?
Ela quase cai virando pra trás pra poder me olhar.
- Pra minha casa, ué.
- Só por cima do meu cadáver você vai dirigir assim. Vamos entrar, você toma um banho, e quando você tiver melhor você vai.
O rosto dela se ilumina.
- Vamo continuar cantando???
Eu rio da inocência que ela ganha estando assim tão vulnerável diante do alcool.
- Sim, vamos cantar. Vem, deixa eu te ajudar a subir.

- Ei! Me dá uma dessa!
Ela estica o braço do sofá pra poltrona onde estou sentada tentando pegar minha cerveja.
- Tá maluca! Você já bebeu demais por hoje, vai tomar um banho, isso sim!
Ela faz um bico.
Eu levanto e vou até o banheiro deixar uma toalha pra ela.
Quando volto pra sala a encontro apoiada na janela que, aberta, deixava a brisa gelada do final do inverno preencher o ambiente.
- Você vai ficar doente, Alessandra. Além disso você tá bêbada demais pra ficar debruçada no parapeito.
Ela permanece em silêncio como se eu não tivesse dito uma palavra.
- Você acha que eu não gosto mesmo da Isa?
De repente, Alessandra parece estar sobrea de novo. Aquilo que eu disse realmente ficou nem sua cabeça.
Eu vou até ela, me debruço ao seu lado.
- As pessoas confusas demais deixam a gente tão atordoada que a gente mal consegue enxergar um palmo diante do nosso nariz.
- Mas dói tanto, como pode não ter amor aqui dentro?
Eu fecho meus olhos e presto atenção no sopro gélido que bate em meu rosto por um instante.
- Você gosta. Mas não dá pra ficar romantizando dor. Entende?
Ela fica olhando pra mim e percebo que seus olhos estão fazendo uma baita força pra focar nos meus, eu não me aguento e rio de novo.
- Chega. Vamo pro banho.
Ela volta a fazer o biquinho.

Permaneço sentada na minha poltrona tomando minha cerveja enquanto saboreio Alessandra continuar cantando lá do chuveiro.
Um sorriso delicioso não sai do meio da minha cara por nada.

De cabelos lavados, rosto mais sobre o me volta Alessandra pra sala.
- Melhor?
- Um pouco hahaha!
- Senta aí, vou preparar algo pra você comer, não comeu nada hoje, só bebeu.
- Valeu, mamãe!
Eu sou só sorrisos e risadas com essa mulher.
- A senhora é vegetariana? Vegana?
- Vegetariana.
Vou até a cozinha, pego o saco de pão e vou montando um lanche de queijo pra colocar no forninho.
Assim que volto pra sala encontro Alessandra dormindo sentada no sofá e meu coração, de um jeito muito assustador, bate errado. Uma tristeza profunda me domina.
Quão carente eu estou? Aff!
Alessandra era como uma pausa na minha dor, um absurdo alguém que conheço há tão pouco tempo conseguir me ajudar a respirar em meio a tanto sofrimento nos últimos tempos, mas ela conseguia. E o corte do som de sua risada e daquele seu olhar como se só ela me entendesse no mundo era demais pra mim. Eu também um pouco alterada pelo álcool não consigo me controlar, me sento no tapete, aquele mesmo tapete que tive Caroline, me debruco nas pernas de Alessandra e deito minha cabeça em sua coxa. As lágrimas começam a cair.
Num sussurro descontrolado eu me pego dizendo:
- Por favor, não dorme... Não me deixa sozinha... É tanta escuridão dentro de mim... Não dorme, por favor....
Sinto sua mão sobre minha cabeça e seus dedos se emaranhando nos meus cabelos.
Um cafuné.
Meu peito se enche de alegria novamente, mas ela para tão rápido quanto começou.
Era só um reflexo.

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