olhos castanhos

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Nos dias seguintes à primeira sessão fiquei um pouco dormente. Acho que foram os comprimidos que ele me receito, um efeito que não acho que seja mau. Até é melhor. Estou indiferente ao mundo. As coisas parecem paradas no tempo e eu não quero saber.

O autocarro branco está atrasado. Sinto alguém sentar-se à minha beira no banco da paragem de autocarros, mas eu não olho para ver se conheço.

"Olá." Uma voz masculina fala, muito baixo, obrigando-o a olhar na direção do som.

Observo um rapaz que nunca tinha visto na vida. Parece ser alto, ainda que esteja sentado consigo vê-lo, é definitivamente atraente e o seu perfume, embora um pouco exagerado, é encantador. Está muito bem arranjado e o seu cabelo bem penteado. Parece ser novo por aqui, senão não estaria a tentar conversar comigo. Ele sorri para mim de forma acolhedora, esperando uma resposta da minha parte.

"Olá." respondo curta. Não queria responder deste modo, mas é sempre mais forte que eu. No entanto, não me vou desculpar.

"Desculpa se estar a incomodar-te. É só que sou novo aqui... E pensei... Ah deixa estar. " disse um pouco envergonhado. Sinto pena, mas estou neutra.

"Hum, okay." Não sei o que dizer. Devo dizer que não sou muito boa com palavras ou pessoas. Simplesmente nunca foi preciso.

Não houve mais nenhum tipo de conversa entre nós. Apenas ficamos sentados no mesmo banco, silenciosos. Sentia que ele estava um pouco constrangido, mas eu não sentia nada.

Os malditos comprimidos.

E mais uma vez estava sozinha naquele banco, apesar de estar lá o rapaz. Sentia-me vazia, sozinha.

Pelo menos já sentes alguma coisa. O meu subconsciente decide aparecer, tendo estado afastado pelo que pareceram anos, e tenho de concordar com ele, embora esse sentimento não fosse o melhor de todos. Mas - outra vez - não tinha experienciado sentimentos muito positivos em toda a minha vida.

O autocarro aparece no horizonte e observo-o a encaminhar-se para mim a uma velocidade nunca antes vista, considerando que estamos a falar do veículo mais vagaroso da história.

Ele para à minha frente e eu entro quando as portas abrem-se. Dou o respectivo dinheiro e avanço para o meu lugar que felizmente estava desocupado.

Tiro rapidamente a minha mochila pesada das costas e sento-me o mais confortavelmente possível no banco.

Não sei realmente porque trago tanta coisa na mochila. Bastava sair com umas coisinhas que ninguém reparava.

Todos pensam que eu estou a ir para a escola. Bom, todos menos a minha mãe. Ela acha que isto é o melhor para mim. Eu não sei. Não sei se isto é sinceramente o melhor para mim, para a minha mãe, ou para alguém. Não sei e isso assusta-me. Eu só queria ficar quietinha no meu canto e deixar o que me atormenta para lá. Mas isso torna-se impossível quando o que me atormenta vive comigo dentro da mesma casa.

O meu único refúgio é este autocarro branco e sinto-me normal neste momento.

O autocarro avança pela estrada e eu fecho os meus olhos suavemente. Não quero pensar mais nos problemas, apenas quero fechar os olhos por um momento. Respiro fundo, apreciando os poucos segundos do tempo que estou a dedicar a mim. Estes momentos são tão raros.

O autocarro dá um solavanco que não estava previsto e abro imediatamente os olhos.

Quando o faço, lá ao fundo vejo o rapaz que me abordou na paragem de autocarros.

Nem o vi a entrar para dentro.

O rapaz olhava para fora da janela, como normalmente eu faço, mas ele estava feliz. O seu sorriso aberto denunciava-o, um sorriso que chegava aos seus olhos, iluminando-os. Sinti a sua felicidade. Senti os meus próprios lábios levantarem-se num sorriso, apenas por vê-lo a sorrir.

E fiquei feliz por ele. Fiquei feliz porque vi alegria e vida na expressão daquele rapaz que não sei bem o nome. Fiquei feliz porque finalmente tive um pouco de esperança de que a vida não é só a miséria que existe na minha vida. Independentemente do que ele esteja por detrás do seu sorriso, independentemente do que esteja por detrás de toda aquela alegria que ele transmite, independentemente de tudo, sei que naquele momento estava verdadeiramente feliz, talvez pela primeira vez desde que me conheço como pessoa.

"Menina, esta não é a sua paragem?" alguém falou.

Virei-me para trás vendo o motorista a olhar diretamente para mim. Olhei em volta e sim, esta era a minha paragem.

"Oh, sim, sim é. Obrigada. " Agradeci educadamente, levantando-me do meu assento com a mochila já às costas.

Caminhei para a porta de trás, um pouco por instinto, não sei bem porquê visto que estava mais próxima da outra porta.

Mas, ao olhar de novo para lá para o fundo, para o rapaz sem nome, o meu olhar dirigiu-se para um rapaz atrás de si. Ele olhava para mim, intensa e carinhosamente, como se eu fosse objeto de adoração. Os seus olhos pareciam esperançosos, um pouco cansados, mas mais vivos que os meus, o que me despertou. Naquele momento senti alguma coisa, não uma mera felicidade ao ver o sorriso de alguém, mas senti -me mais leve em apenas uma fração de segundos.

Fora apenas um olhar de raspão, pois saí de imediato do autocarro, mas no momento em que me virei e vi o autocarro distanciar-se, percebi que nunca mais me iria esquecer daqueles olhos castanhos.

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Oiiii

Nem sei bem o que dizer aqui. Dói-me bué a cabeça e tals...

Não era suposto nada do que aconteceu acontecer, mas calhou de acontecer e agora já está feito por isso..

Dúvidas, comentem. Eu sei que pode estar confuso, por isso digam alguma coisa para eu melhorar :)

Dedico este capítulo a @Adriananii porque ela foi a primeira e única a comentar e foi super fofa. Obrigada *-----*

Era só isso, acho eu.

BabyPopcorn xx

The White Bus |l.p|Onde histórias criam vida. Descubra agora