Os lobos também amam

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Na noite de quinta, Henry e Cindy estavam agarrados no sofá assistindo a uma série policial. Ao fim do quarto episódio, quando os créditos estavam subindo, Henry encarou a mulher em seus braços. Sorriu. As pálpebras da morena já estavam grudadas e seus lábios formavam um bico, indicando que já dormindo há algum tempo.

Seu esposo colocou-a nos braços com cuidado e subiu com ela para o quarto, deitando-a na cama e arrumando o travesseiro abaixo de sua cabeça. Em seguida, desligou as coisas na sala e voltou ao seu aposento, aninhando-se ao corpo de Cindy. Não era sempre que podia dormir agarrado a alguém, então aproveitava quando ela estava ali.

De manhã, já arrumados para saírem, Henry e Cindy tomavam café enquanto trocavam algumas palavras sobre a série que haviam assistido no dia anterior. Como se sentisse que tinha algo naquele dia, o advogado olhou para o calendário digital que enfeitava a parede da cozinha. Voltou seu foco ao café e ficou calado, tentando disfarçar que havia sentido uma leve tristeza. Henry era muito bom em esconder os sentimentos, na verdade. Gostava de parecer o forte, o durão, e era muito difícil chorar. Mas nesses quase dois anos Cindy já tinha passado tempo demais com o esposo para saber decifrá-lo.

Ao perceber a tênue mudança do homem à sua frente, Cindy limpou a boca e as mãos e jogou o lencinho na mesa, apoiando os antebraços na borda e logo encarando Henry.

– Tem a ver com ela, não tem? – ele ergueu o olhar à morena. Cindy ajeitou sua postura na cadeira e cruzou os braços, ainda esperando uma resposta.

– O que tem a ver com o quê, Cindy?

Ela riu pelo nariz, não demonstrando um pingo de humor. Então, como de costume, passou a falar a língua que usava para praguejar: sua língua materna, o francês.

– Porra, Henry! Supera! EU to aqui! A gente passa um tempão longe um do outro e quando ficamos juntos você ainda fica lembrando dela. Ela tá MORTA!

O moreno travou o maxilar e parou de mexer na comida.

– Eu disse alguma coisa sobre ela? – ele perguntou pausadamente.

– Você acha que eu não te conheço, Henry?

No fim das contas, ela estava certa. Tinha a ver Mia. Sim, ele já tinha superado ela havia alguns anos, mas não era como se ele fosse esquecer que um dia ela fez parte da vida dele e se foi da forma mais trágica possível. E aquele fatídico dia estava "fazendo aniversário".

– Se me conhecesse teria o mínimo de empatia por mim, porra!

– E por mim? Você também não tem empatia por mim?

– Você tá com ciúmes de uma pessoa MORTA! – fez uma careta, como se fosse um absurdo.

– Não é ciúmes, Henry. É só que você se importa mais com uma memória do que comigo.

Emburrada, Cindy se levantou da mesa e ia em direção às escadas, mas parou no meio do caminho e voltou sua atenção a Henry.

– Sabe, Henry... Foda-se! Pinte quadros sobre a Mia, fale sobre a Mia, eu não ligo! Eu não sou o tipo de mulher que fica chorando por homem.

E de fato não era, muito pelo contrário. Era o tipo de mulher que fazia os homens chorarem.

– Cindy, você está exage...

– EU SÓ NÃO QUERO viver sob a sombra dela. – alertou-o, quase o fuzilando com os olhos.

Então ele foi deixado ali, sozinho na mesa. A diarista fingiu não ter ouvido nada, seguindo normalmente com suas tarefas. Henry, por sua vez, pensava no que ela disse... "se importar mais com uma memória". Essa não era a questão. O homem há muito tempo havia parado com o saudosismo e nostalgia em cima da figura de Mia, inclusive buscando ficar quieto toda vez que se lembrava de algo, como na situação que acabara de ocorrer. Mas Cindy agia como se Henry não pudesse ter alguns segundos de luto.

Os lobos também amam || Henry CavillOnde histórias criam vida. Descubra agora