Desperto somente no outro dia, sentindo os pelos do pequeno lobo a acariciar meus braços. Ele ainda está em um sono invejável, por isso me levanto com cuidado para não o acordar. Não sou muito eficiente na tarefa, porque em menos de cinco minutos, ele já está me seguindo pela casa. Tomo outro banho e me visto para treinar, pronta para voltar à rotina normal, fingir seguir o conselho de Hayley e dar um jeito na cara de morta viva. A mesma estranha sensação de familiaridade faz com que eu me detenha antes de abandonar o quarto, e levo o agasalho da noite anterior ao nariz, tentando reconhecer aquele cheiro, contudo, é praticamente impossível. A julgar pelo tamanho, poderia dizer que pertencera a Loki ou a Cato, mas eu nunca havia visto nenhum dos dois com aquilo antes.
Evito pensar muito sobre o mistério de quem me encontrara na noite passada, preparo-me para sair. Acabo parando outra vez, e fecho a porta novamente, absorvendo o som pesado do silêncio de olhos fechados, esperando que qualquer um dos meus fantasmas apareça ou que ao menos me diga alguma coisa. Permaneço do mesmo jeito por alguns longos minutos, mas todos eles se mantêm em silêncio. Não há Loki, Sander ou Heinrich, e eu sinto tanta falta de suas vozes. Acaricio o filhote inquieto em meus braços, que se retorce todo para olhar para os lados em busca do que tanto me perturba. Se ele ao menos soubesse que se trata apenas da ausência coletiva de todos os que me marcaram até hoje e que perdi, talvez saísse correndo e desistisse de acompanhar uma humana louca como eu. Vamos lá. Qualquer um. Por favor.
Suspiro, frustrada, ao perceber que ninguém virá, e começo a caminhar até a estação, sem saber ao certo o que devo fazer. Talvez haja algo mais que eu possa fazer pela família de Heinrich no Distrito 7. Não. Devo evitar coisas que me trazem tristeza se quiser viver com o mínimo de decência o resto de meus anos. Ser egoísta, de certo modo. Entretanto, ainda posso pedir a Amphion para deixar algo para os Stackhouse quando passar por lá em alguma de suas viagens. Parece errado tentar compensar a vida de Heinrich com dinheiro, mas não há mais nada que eu possa fazer, e se ele me visitou no sonho, deve haver algum motivo. Ele nunca aparece, não como os outros, então tendo a acreditar que suas visitas tenham um propósito.
O sopro frio das montanhas, enfraquecido pela distância percorrida por entre a floresta e todas as altas e firmes construções do Distrito 2, toca minha pele enquanto passo cumprimentando as pessoas discretamente. Junto com ele, os habituais sons ecoados da pedreira – homens gritando ordens e grunhindo com o esforço do trabalho pesado. Ao ver o estado no qual eles trabalham, entendo as razões pelas quais Cato prefere acreditar que participar dos Jogos é uma alternativa melhor do que passar o resto da vida ali. É quase um cenário de arena perfeito por si só, um lugar assombrado e de eterna penitência aos que tiveram o azar de nascerem pobres em um distrito rico. Já havia perdido a conta de quantos acidentes ouvi sendo relatados em todo o distrito, o próprio pai de Grill fora uma vítima, e agora me questiono se o caso foi mesmo um mero acidente. Pare de pensar nisso, lobinha.
Loki. Viro a cabeça em todas as direções possíveis, chicoteando o ar com o rabo de cavalo em meus cabelos, procurando por algum sinal de meu primo, sem ver absolutamente nada que possa me confortar. Nenhum sorrisinho malicioso, nenhuma companhia, nem mesmo a sensação de sua presença. Apenas uma frase solta no ar, sussurrada pelo vento frio dos mortos nos quais minha mente estava. Enfio as mãos nos bolsos da jaqueta, tentando me recompor discretamente.
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73ª Edição dos Jogos Vorazes
FanfictionVencer através do sangue dos inocentes nunca foi nada além de um mero detalhe no caminho para a glória na vida de Syrena Jaeger. Fruto do breve relacionamento entre um par de vencedores do Distrito 2, a garota passou seus anos se preparando e sonhan...