02. Linhagem

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Minhas despedidas não são cheias de lágrimas

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Minhas despedidas não são cheias de lágrimas. Na verdade, elas sequer se parecem com despedidas. Meus amigos e parentes fazem parecer como se eu estivesse prestes a sair em uma espécie de viagem de férias para a Capital. Observo as ruas movimentadas de meu distrito pela janela. O clima não poderia ser melhor. Não há como perderem este ano. Loki e eu somos garantia disso. Sinto um gosto salgado na língua e repreendo-me ao perceber que são lágrimas.

As portas se abrem para minha última visita e limpo o rosto bruscamente. No entanto, meu coração pesa novamente ao ver a única pessoa que realmente demonstrou sentir a possibilidade de me perder, que não se importa em mostrar seus sentimentos e parece saber dos meus mesmo que eu os negue e esconda com todas as minhas muralhas. Não é minha mãe, nem Cato, meus amigos da escola, e muito menos Clove. A pessoa para quem eu corro e me permito chorar com a cabeça enterrada no peito é Grill, e ele não diz nada, apenas me abraça enquanto afaga meus cabelos em uma tentativa de acalmar meu choro inapropriado.

— Grill, eu... — balbucio entre soluços. O que me atinge não é meu medo, fui ensinada a rejeitar tal sentimento. Minha única angústia é ninguém agir como se eu pudesse morrer, como se fosse a última vez que pudessem me ver, como se eu não fosse sequer uma pessoa, apenas um nome. Não preciso dizer aquilo em voz alta, meu treinador sabe, provavelmente soube no momento em que viu meu rosto manchado de lágrimas. Raiva toma conta de mim, mas ela não é direcionada a nenhum de meus visitantes, e sim para mim mesma, por sentir aquilo, por chorar como uma criancinha por algo tão pequeno. — Por que eu me importo?

Ele não responde, apenas continua me abraçando na mesma posição enquanto espero que ele me dê qualquer resposta inteligente apenas para que eu possa discordar uma última vez. Minha angústia aumenta ainda mais com o silêncio com o qual sou respondida, só então percebo o motivo. Ele está chorando, silenciosamente, e só posso notar pelos movimentos incontínuos de seu peito.

— Vá comigo, por favor — peço sem ao menos pensar no que estou dizendo. — Faria um bem danado para minha sanidade mental te ter por perto.

— Estará melhor nas mãos de seu pai, baixinha — ele beija o topo de minha cabeça e segura meu rosto com as duas mãos firmes, olha para mim sério, como quando quer ter certeza de que estou prestando atenção, os olhos verdes relva avermelhados pelo choro — Agora não é hora de amolecer, mas lembre-se que matar não deve ser fácil, nem para um carreirista. Deve permitir a si mesma sentir ou vai enlouquecer.

Pela primeira vez, eu apenas assinto, sabendo que não é um conselho do qual tenho argumentos para discordar.

Logo sou conduzida até a estação, onde o trem já nos aguarda. Praticamente o distrito inteiro está ao derredor para se despedir com gritos de incentivo e acenos. Rio discretamente quando vejo algumas garotas cheias de lágrimas nos olhos, duas mais tímidas e outra mais histérica implorando para Loki ficar ou então voltar vivo. Pelo menos um de nós é tratado como um ser humano neste lugar. Vejo Grill e minha mãe acenando um pouco mais afastados. Ela grita um arrase com eles e sorri. Aceno de volta com um sorriso amarelo, dizendo a mim mesma que não será a última vez que a vejo.

73ª Edição dos Jogos VorazesOnde histórias criam vida. Descubra agora