Capítulo XI - A missão de Plínio

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    Alguns minutos depois, Nestor chegou ao centro de comando acompanhado pelo ancião. Thurgon estava sentado na cadeira ao centro da mesa. Terminava de escrever algo em um pergaminho, que enrolou e selou quando os convidados chegaram. Ambos os homens entraram na tenda e fizeram reverências ao rei, que colocou o pergaminho de lado, acenou e disse:

— Diga-me Plínio, qual atitude acha que devemos tomar?

— Meu rei, estou certo de que os elfos estão preparando uma armadilha. Eles querem que saíamos para combatê-los, fingem ter poucos guerreiros para nos incitar a isso. Mas quando saímos da cidade as tropas que estão escondidas nos atacarão. Mas nós não temos escolha a não ser fazer o que eles querem. Os suprimentos que temos aqui não serão suficientes para todas as pessoas que estão na cidade no momento. Podemos nos alimentar por três dias, talvez quatro e depois enfrentaremos a fome; e enquanto ficamos aqui os elfos podem percorrer o território e fazer o que bem intenderem. Inclusive trazer mais tropas. Penso que devemos atacar.

— E quanto ao povo? Devemos embarca-los quando saímos para combater os elfos?

— Essa é uma questão difícil. Caso embarquemos o povo, seus navios podem ser perseguidos e aqueles que forem alcançados pelo inimigo serão mortos. Mas caso os deixamos na cidade, se tudo der errado e nós formos derrotados, certamente não haverá salvação para nenhuma dessas pessoas. – Plínio parou em silêncio por alguns segundos. A mão fina e ossuda puxava os longos pelos brancos que cresciam sob o queixo – Devemos embarcar as pessoas antes de sairmos para combater. Melhor arriscarmos a salvação de alguns que condenarmos o todo à morte.

— De fato é uma dura decisão. Mas há sabedoria em suas palavras. Nestor, em quanto tempo os homens estarão prontos para combater?

— Todos já estão de sobreaviso senhor, caso dê a ordem para irmos à luta levaremos menos de uma hora para nos organizarmos.

— Ótimo. Então cuide para que os homens se alimentem e diga que se preparem, pois ainda hoje iremos à batalha.

— Sim senhor! – Nestor fez uma reverência e se retirou a passos largos.

— Também devo me retirar senhor?

— Não agora. Tenho outro assunto a tratar com você, velho amigo. Quero que faça outra coisa por mim.

— Diga, meu senhor, e eu o farei.

— Quero que você parta junto ao povo nos navios.

— O quê? Meu senhor, como Lorde-Protetor da cidade, eu devo ficar aqui, fazendo tudo que puder pelo bem do povo que foi a mim confiado. E mesmo que eu não possa mais lutar, ainda posso dar meu conselho na guerra.

— Ouça-me, Plínio. Seu amor e compromisso com nosso povo e o reino são louváveis. Não é à toa que está nesse posto desde os dias de meu pai. Mas na situação atual, o melhor que pode fazer é se juntar às pessoas nos navios. Sei que quando era jovem você navegou inúmeras vezes por essa costa e conhece essas águas tão bem, talvez até melhor, que esses jovens capitães que estão encarregados de conduzir o povo. Você pode guia-los pelos caminhos das águas e sua experiência pode ser a nossa salvação caso os elfos façam um ataque naval.

— Ainda assim não estou convencido.

— Ainda não terminei. Esse não é o único motivo meu amigo. Diga-me, para onde essas pessoas irão quando fugirem? Quer dizer, os planos são de fugir para a ilha de Ulster, mas nosso povo não pode ficar lá para sempre. John e seu povo não podem nos abrigar por muito tempo, e de maneira alguma arriscarei a fúria dos elfos sobre um amigo que está socorrendo meu povo nesse tempo de aflição. Não Plínio, nosso povo tem que procurar um novo local para se estabelecer. E quero que você os lidere. Mais ainda, caso tudo dê errado, evacuarei Vestfold e também confiarei as pessoas da capital a sua guarda, inclusive Talon o único filho que me resta. Quero que o tome sob sua tutela.

    Plínio ficou calado por um bom tempo enquanto digeria toda a situação. Os dedos escorriam pelos fios da barba enquanto pensava. Chegou a abrir a boca mais de uma vez para esboçar uma resposta, mas não encontrava palavra. Por fim conseguiu organizar os pensamentos e respondeu:

— Honra a este velho por me confiar tamanha tarefa. – Falou com um ar sem graça.

— Agora compreende que estou lhe confiando um fardo muito mais pesado do que aquele que possui aqui. Espero que me perdoe meu amigo, mas não há outra pessoa com capacidade suficiente a quem eu possa entregar essa tarefa.

— Se é assim, eu aceito o encargo, meu senhor. – Respondeu Plínio, solene.

— Ótimo. Tome este pergaminho – Thurgon pegou o pergaminho que havia acabado de selar e o entregou ao ancião – é uma mensagem minha para John. Entregue-a nas mãos dele quando chegarem a Ulster. Tenho outra coisa para lhe entregar – Thurgon levantou de sua cadeira e caminhou até o canto direito da tenda, pegou outro pergaminho sobre uma pequena mesa que estava posicionada ali, voltou e o colocou sobre a mesa onde conversavam – veja – disse enquanto abria o rolo e apontava uma localização com o indicador – esse é o mapa da saída de emergência de Vestfold. É um túnel subterrâneo que conduz até as praias ao sul da capital. Os refugiados da cidade seguirão por ele e depois tomarão essa rota em direção à floresta – à medida que o rei falava, seu dedo ia se movendo pelo mapa – Depois que o povo de Vinnfold chegar a Ulster leve os navios para resgatar as pessoas de Vestfold na floresta e quando a poeira da guerra abaixar, encontre um novo local para colonizar e reconstruir um lar para nosso povo.

— Isso tudo é precaução, meu senhor? – Plínio perguntou cheio de suspeita – chega a parecer que vossa alteza teve uma visão de que o futuro não nos reserva coisas boas e está tentando amenizar as desgraças que estão por vir.

— Tem uma mente aguçada meu amigo. Mas não tive visão nenhuma. Apenas sinto que devo ser cauteloso e estar pronto para o que está por vir. Um homem preparado talvez não possa evitar o infortúnio, mas certamente pode ameniza-lo. Não pense que essas são palavras de alguém que já se considera derrotado, pois farei tudo para que não cheguemos a tal ponto. Mas se chegar, teremos um plano para salvar nosso povo.

— Muito bem, meu senhor, que assim seja. Cada um a seu modo, vamos lutar pelo nosso povo.

    Os homens se levantaram e se abraçaram. Plínio pegou os pergaminhos e guardou dentro do casaco de peles de urso que usava.

— Vou para o porto, supervisionar e conduzir o povo. Lute com bravura, meu senhor.

- Tenha certeza disso. E obrigado velho amigo, obrigado por tudo. É como um segundo pai para mim.

— E você é o filho da minha velhice.

    Plínio beijou o rosto de Thurgon e se retirou. O rei ficou parado no mesmo lugar durante alguns minutos, observando o ancião se afastar. Depois chamou os serviçais e os ordenou que trouxessem sua refeição. Foi servida uma porção de carne de porco com cevada, juntamente com um pouco de vinho servido em um cálice de cobre. Alimentou-se ali mesmo, enquanto pensava na última refeição que fizera com Argon e se teria oportunidade de ter uma última refeição com Talon.

Crônicas de Eretz: Queda de Reis (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora