— Temos? — perguntou Vanda virando-se para mim.
— Temos. Primeiro vou separar um pouco de dinheiro para irmos até a cidade comprar suprimentos. E amanhã vamos arrumar outro lugar para morar já que aqui não é mais seguro.
— Do que está falando? Este lugar é perfeito e com todo esse dinheiro podemos conseguir alguns porcos para criar.
— Todo esse dinheiro foi toda a economia dos meus pais, acha que eles o deixariam aqui? Eu esperava encontrar um pouco e ao invés disso encontrei tudo. Isso ê a prova final de que eles estão mortos.
— Você não sabe di... — Vanda começou a falar mas foi interrompida por Julian.
— Não. Já chega de criar expectativas falsas — Julian me olhou fundo nos olhos — O Ethan não é mais a criança boba que eu conheci, agora ele sabe como é a realidade de muitas crianças. É isso Ethan, tudo leva a crer que seus pais realmente foram mortos mas não precisamos nos mudar daqui.
— Quem você acha que colocou aquela placa lá fora? A fada madrinha? Foram as pessoas que acabaram com a minha vida, a qualquer momento elas podem aparecer aqui e aí estaremos em perigo novamente.
— Ou não, tiramos a placa e seguimos reconstruindo nossas vidas. Se alguém aparecer então nós matamos, prefere se vingar ou fugir?
– Dessa vez tenho que apoiar a ideia do Julian — Vanda se pronunciou — aqui tem muita grana, daria para comprar outro lugar mas quem venderia uma casa para três crianças com duas sacolas de dinheiro? Certamente nos mataram e levariam tudo.
— Então o plano genial de vocês é ficar aqui esperando para serem mortos?
— Não, nosso plano é ficar aqui vivendo e nos preparando caso alguém apareça — disse Julian — e se não aparecer melhor ainda, é claro.***
— Então foi o que eu fiz, retirei a placa e a queimei. Mas não sem antes anotar o número que havia nela. Fiz tudo isso naquele mesmo dia e só depois descemos para a cidade, aproveitei a oportunidade e usei um telefone público para ligar para aquele número enquanto Julian e Vanda faziam as compras. Fiquei sem palavras ao descobrir quem era o proprietário do número deixado na placa.
***
— Irmãs Grimes, garanhão. Quer marcar horário? — disse a voz feminina do outro lado da linha. Rapidamente encerrei a ligação, colocando o telefone de volta no gancho.
— Como assim? Por que desligou? — perguntou Julian ao lado de Vanda.
— O número na placa, eu conheço a proprietária, ou melhor, as proprietárias. — respondi enquanto me afastava do telefone público.
— Então por que desligou?
— Porque eu não sou idiota, por que o número delas estaria em uma placa anunciando a venda da minha casa? Elas não são donas de lá, meus pais são.
— Comece do início — disse Vanda — elas quem?
— Elas são conhecidas como as irmas Grimes, moram em um bangalô não muito longe daqui — respondi.
— E como as conhece?
— Eu fazia entrega de produtos para elas antes de ir parar no orfanato.
— Entendo, muito suspeito mesmo. Acha que elas podem ter algum envolvimento com tudo o que aconteceu? — quis saber Julian.
— Obvio.
— Calma ai gente — Vanda interferiu — não podemos simplesmente sair fazendo acusações tão graves assim. Existem milhões de possibilidades.
— Ah que ótimo, começou a garota das suposições — reclamou Julian.— Não posso fazer nada se eu tenho cérebro e você não.
— Parem de perder tempo, vamos logo comprar a comida — os chamei.
— Assim, do nada? E essas Irmãs? Não vai fazer nada? — Julian tornou a tocar no assunto.
— Agora não, temos a pista a ser analisada. Agora vamos nos restabelecer, nos alimentar adequadamente e descansar.
— Olha ai o meu garoto falando igual homem minha gente — Julian deu alguns tapinhas em meu peito e em seguida seguiu em direção a uma padaria — vamos logo comer algumas besteiras antes de comprar o que realmente é necessário.
E foi o que fizemos, gastamos comprando pães, salgados, sucos, tortas e bolos. Ao todo tivemos que carregar cinco sacolas cheias de besteiras.
— Que perfeição — Julian usou uma faca para cortar o presunto que havíamos comprado. Em seguida pegou um dos pães que estavam dentro de uma das sacolas.
— Eu quero a torta — falou Vanda retirando o que desejava, ela a colocou sobre a mesa de madeira e eu apenas os observei, aéreo. Eles reunidos ali naquela mesa me lembrava dos almoços e jantares com meus pais e irmãos. Um aperto tomou conta do meu coração e eu senti minhas glândulas lacrimais começando a entrar em ação.Esfreguei os olhos disfarçadamente para que ninguém percebesse e me mantive firme, não podia estragar aquele momento pois finalmente estávamos comemorando nossa vitória contra Cassandra.
— Me diga Ethan — Julian começou a falar com a boca cheia — Quem são essas irmãs? Que produtos você levava para elas?
— Não fale com essa bocarra cheia — reclamou Vanda.
— Calada — ele retrucou — Eu saí da pobreza mas a pobreza não saiu de mim.
— E quando foi que você saiu da pobreza, miséria?
— No exato momento em que coloquei os pés nessa casa. Eu tenho muitos planos para nôs deixar podres de ricos. Quero ressaltar que quando digo "nôs deixar" estou me referindo a mim e ao Ethan.
— Não preciso da sua ajuda para nada, e como uma criança esfarrapada poderia ficar rica?
— É simples — Julian colocou as duas mãos sobre a mesa, como se mapeasse algo — eu e o Ethan vamos usar o dinheiro para reerguer esta fazenda. Vamos espandi-la para abrigar mais animais e vamos vender esses animais em alta demanda, não entregando de casa em casa parecendo um camelô porco. Com o dinheiro dos animais vamos comprar mais terras e construir mais fazendas, o nosso reinado começa agora — ele terminou de falar dando um soco na mesa e fisgando outro pão dentro da sacola.— E onde eu fico nessa sua fantasia? — questionou Vanda.
— Você vai crescer e vai ter grandes peitos, e sabe o que eu aprendi? Com grandes peitos vem grandes responsabilidades, você vai atrair clientes quando essa hora chegar, até lá já terei um enorme bar.
— Vai se foder.
— Veja o lado bom — ele a encarou — você me deve uma e mesmo assim estou pensando em traze-la para o meu lado do negocio.
— Eu não te devo nada.
— Claro que deve, eu tirei você daquele lugar onde vivia sofrendo abusos. Sua buceta me agradece.
— Deixa de ser desbocado.
— Buceta? O que é uma buceta? — perguntei, interrompendo os dois, que me olharam ao mesmo tempo.
— Está vendo, idiota? Agora você definitivamente conseguiu fazer a conversa se tornar inconveniente.
— Ethan, você tem a porra de um pinto — começou Julian — o que acha que as meninas tem? Um pinto também? Bom... Algumas até tem — ele riu — mas esse já é um outro assunto.
— O que elas tem? O que as meninas tem? — aquela conversa despertou drasticamente a minha curiosidade em saber o que as meninas tinham, eu nunca havia parado pra pensar.— Cuide de tudo — pediu Julian a Vanda enquanto levantava-se — Ethan vamos dar uma volta. Está na hora de você saber a verdade, incluído a mentira que seus pais te contaram sobe como você nasceu.
— Tabom — o segui para fora da casa e a tarde não demoraria a dar lugar a noite.
— Árvore legal — comentou ele fitando a árvore na centro do mundo.
— É a favorita do meu pai.
— Vamos até lá — começamos a andar — então Ethan, essa era uma conversa que o seu pai devia ter tido com você, mas por ironia do destino você caiu em minhas mãos. Sorte sua que sou bem experiente nessa área.
— O que as meninas tem?
— Elas tem, bom, "buceta" me parece uma palavra muito pesada para um inocente como você. Vamos chamar de preciosa. Isso, preciosa, gostei.
— Preciosa? Como uma perola?
— Bem mais que uma perola, acredite.
— E como é?
— Como um pedaço de bife cortado ao meio.
— Ham? — eu realmente havia imaginado um bife com um corte e aquilo não me pareceu nada atraente.
— Olha, só saiba que é assim e pronto. Continuando, o seu pai colocou o pinto no bife da sua mãe e foi assim que você nasceu.
— Isso não faz sentido.
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A Garota Em Coma
RomanceEthan, um ex-soldado que sofre de esquizofrenia começa a trabalhar em um hospital e lá conhece Elizabeth, uma paciente que está em coma e terá seus aparelhos desligados em cinco meses.