Capítulo 67 - Kiara Ward - Parte 2

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— O cheiro está bom. Você realmente fez o jantar ou comprou em um restaurante?

Levo um pequeno susto ao ouvir Santiago falar, estava tão distraída que não notei sua presença. Sorrio ao me virar em sua direção.

— Não acredito que está me fazendo essa pergunta! — faço-me de ofendida — É claro que eu fiz, afinal esse foi o acordo e agradeça por eu não ter colocado fogo na sua casa. — lanço uma piscadela.

— Corria o risco de colocar fogo na minha casa? — Ele parece surpreso. Meu sorriso se alarga com sua expressão.

— Na verdade... — faço uma cara pensativa — Devo dizer que ainda corre esse risco. Você não sabe o perigo que é estar comigo por perto — provoco.

Olho diretamente em seus olhos com um sorriso irônico em meus lábios. Passamos alguns instantes nos encarando, instantes que pareceram uma eternidade. Vejo um brilho intenso em seus olhos azuis, o que me faz pensar no que estaria passando em sua cabeça agora. Santiago se aproxima um pouco mais, chegando bem perto colando nossos rostos. Sinto meu corpo enrijecer com sua proximidade.

— Você é quem não sabe o risco de dormir embaixo do mesmo teto que eu. — estremeço ao ouvir essas palavras quentes no meu ouvido.

Santiago se afasta de mim sorrindo, aquele sorriso cínico de quem sabe o efeito que causa com suas provocações e eu estou detestando a forma como meu corpo reage a ele. Isso não deveria acontecer, mas não consigo evitar. Eu o desejo.

— Quando vou poder comer? Estou faminto. — pisco algumas vezes voltando à realidade.

— O quê? Ah sim, o jantar claro — sinto meu rosto esquentar mas tento disfarçar. Aponto para a direção que vai até a área externa da mansão — Então vamos logo antes que a comida esfrie.

Seguimos até a área indicada em silêncio.

— Preferi arrumar a mesa aqui fora, a noite está linda. É uma pena ter toda essa vista e não aprecia-la. — falo quando chegamos ao deck.

— A ideia foi ótima, nunca parei para observar isso. — Ele olha em volta parecendo se dar conta do que estou falando.

— Pois deveria. Imagina, depois de um dia exaustivo poder tomar um vinho a beira da piscina apreciando essa vista maravilhosa...— aponto para a cidade iluminada — ... é terapêutico. Melhoraria até o seu mau humor.

Seguro o riso. Não é que eu queira ser desagradável, mas não consigo deixar de provocar o homem ao meu lado.

— Sabe o que melhoraria o meu humor? — Ele vai até a mesa e se senta, eu o acompanho — Tem uma coisa que me deixaria bem calmo. Acho que você poderia me ajudar, o que acha?

— Não tenho tanta certeza disso, mas... — começo a nos servir com a entrada enquanto Santiago nos serve com o vinho — O que seria exatamente? — me arrisco a perguntar e vejo ele sorrir maliciosamente.

Ele não responde minha pergunta de imediato.

— Isso está muito bom — fala enquanto prova a comida. Faço o mesmo.

— Realmente, até que ficou bom. — não havia provado nada do que tinha preparado, deixei que Mari experimentasse para dizer se estava no ponto certo. — Mas você ainda não respondeu à minha pergunta.

— Sobre o que me deixaria mais calmo? — ele sorri genuinamente — Que tal subirmos para o meu quarto e escolhermos um filme?

Eu não sei o que estava esperando ouvir, mas de repente me sinto decepcionada. Nem havia percebido que estava prendendo a respiração. Suspiro e olho para minha taça de vinho.

— No seu quarto? — pego a taça e giro lentamente o vinho dentro do objeto — A sala me parece ótimo para isso. — desvio meu olhar da taça para Santiago e a levo até os lábios, tomando um gole grande da bebida.

— Por quê? Tem medo de mim Kiara? Pode ficar tranquila, eu não mordo... Quer dizer, se você me pedir, pode ser que eu o faça. — sorri se divertindo com a situação. Franzo as sobrancelhas em desgosto — Não beba tanto, não quero que fique embriagada.

— Fala sério, medo? — dou um sorrio debochado — Não Santiago, não tenho medo de você. — Limpo a boca com o guardanapo — E a propósito, não tente me controlar eu sei muito bem a quantidade que devo beber, não sou uma alcoólatra.

Olho para o seu prato e vejo que já terminou a primeira refeição, não lhe dou tempo e o sirvo de mais comida, agora o prato principal. Coloco uma quantidade generosa e depois me sirvo. Ele encara aquela montanha de comida como se analisasse se conseguiria comer tudo aquilo.

— Não vejo a hora de comer tudo que eu tenho direito já que fui bonzinho durante esses dias.

— E quem disse que eu não estou sendo boa com você também? Não faz ideia de quantas vezes reprimi a vontade de socar esse seu rosto perfeito.

— Então quer dizer que acha meu rosto perfeito?

Não respondo, mas é óbvio que a resposta seria sim, que mulher não concordaria com isso? Eu posso não ter uma relação amigável com Santiago mas não sou cega. E ele sabe, o cretino sabe o efeito que causa nas mulheres. Tomo mais um gole da minha bebida numa tentativa de evitar responder sua pergunta e ele apenas sorri, como se tivesse lendo os meus pensamentos.

— Me desculpe — fala de repente — Não estou tentando te controlar, só não quero que... — ele para de falar, colocando uma pequena porção de comida na boca.

— Que...? — incentivo para que ele continue — Se a sua preocupação é que eu fique bêbada e estrague a noite, não vou.

— Você não estragaria nada, com certeza é a bêbada mais engraçada que eu conheço — sorrio lembrando das vezes que ele me viu nesse estado lamentável.

— Nem se eu quisesse eu ficaria bêbada com esse vinho, a não ser que eu bebesse a garrafa inteira e ainda assim duvido que seria suficiente para me derrubar. Ele é bem suave, eu o escolhi justamente por esse motivo. Não sou nenhuma especialista, mas tenho um pouco de conhecimento. Meu avô adora vinhos, acho que herdei dele o gosto pela bebida — sorrio ao pensar em meu avô — Quando eu era pequena ele me levava a um festival de vinho que acontecia todo ano na Itália, eles tinham a tradição de amassar uvas com os pés. Eu simplesmente adorava fazer isso até que atingi uma certa idade e isso deixou de ser interessante.

Penso com carinho nessa fase da minha vida. Percebo que acabei me empolgando ao falar sobre mim. Santiago ouve tudo atentamente e um sorriso escapa de seus lábios enquanto eu tagarelo sobre meu passado.

— Eu amo esses festivais, poderíamos marcar de ir. Quem sabe assim você não derreta esse seu frio coração e começa a ver que eu sou o homem mais incrível que entrou na sua vida.

— Oh céus! Isso seria impossível. — balanço a cabeça em negativa.

Ficamos em silêncio por um breve momento, cada um perdido em seu próprio pensamento.

— Pode não parecer, mas eu não tenho esse costume de beber muito, me embriagar como tenho feito — relaxo mais na cadeira e cruzo os braços. — É só que... tem sido dias difíceis, acabei descontando minhas frustrações na bebida, foi um deslize meu. — tento me justificar.

— Imagino. Descobrir que é herdeira de uma máfia não deve ser fácil. Eu e o meu irmão já crescemos sabendo disso, então foi mais fácil adaptar. — Ele fala tão naturalmente, mas logo muda sua expressão, como se tivesse falado algo que não era pra falar.

— Uaaauuu, você tem um irmão! — surpreendo-me e ignoro todo o resto. Jamais poderia imaginar. — Noto seu desconforto com esse assunto, suponho que seja uma relação conturbada.

— É... Eu tenho. — Ele faz uma careta — Faz tanto tempo que não falo isso que chega a ser estranho.

— Não precisa falar se não quiser, está tudo bem.

— Não, tudo bem. Não acho que vá sair por aí espalhando. — balanço a cabeça concordando — Ele é filho do meu pai com outra mulher, mas morava com a nossa família. Tínhamos um ótimo relacionamento, éramos tão próximos que até na hora de apanhar os dois preferiam apanhar juntos. — ele sorri sem emoção — Mas quando eles morreram, ele me abandonou e foi morar com a mãe, mesmo eu pedindo para que ele ficasse. Eu me senti traído, então decidi apaga-lo da minha vida da mesma forma que ele fez comigo.

Ouço com atenção tudo que Santiago fala, não poderia imaginar como é passar por algo assim, pois meu irmão sempre foi tudo para mim, mesmo exagerando algumas vezes, ele cuidou e me protegeu como um irmão deve fazer. E tenho certeza que ele jamais me abandonaria.

— Eu lamento por tudo que você passou. Não posso dizer que sei o que você sentiu, mas sei que não deve ter sido fácil. — coloco minha mão sobre a sua e acaricio levemente em um gesto de carinho e consolo, mas tiro antes que a situação fique constrangedora.

— Por um lado eu entendo ele, ninguém é obrigado a carregar um fardo que não é seu. Eu era o órfão, ele ainda tinha a mãe.

Fico em silêncio pensando em suas palavras, pensando em tudo que ele sofreu após a morte dos pais.

— Chega de falar sobre coisas tristes — Santiago fala, voltando ao seu estado normal acabando de vez com todo aquele sentimentalismo. — Lembre-se que ainda tem a outra parte do acordo.

— Então vamos acabar logo com isso, não quero ficar te devendo nada — levanto-me atônita. Santiago e eu entramos na mansão e seguimos para a sala principal.

— Vamos para o meu quarto — Ele fala quando chegamos na sala — É mais confortável, sem contar que a TV é melhor.

— Você não vai desistir de tentar me levar para o seu quarto, não é mesmo? — brinco — Tudo bem então.

Subimos em silêncio e quando chegamos, ele abre a porta e da passagem para que eu entre. Hesito por um instante, mas por fim acabo entrando no cômodo. Olho tudo ao redor, observando cada detalhe. O quarto é espaçoso em tons escuros e com pouca mobília, tudo aqui exala masculinidade e devo dizer, o cheiro é incrível. Vou até a cama e me sento um pouco tímida, estranho esse sentimento repentino e novo.

Santiago não perde tempo, assim que entra pega algo que parece ser o controle e ativa a TV que desce através do teto.

— Posso escolher qualquer um ou você tem alguma preferência?

— Fica a vontade para escolher — me ajeito na cama confortavelmente e o homem se joga ao meu lado todo largado. Ele me encara sorrindo e eu apenas reviro os olhos. É óbvio que está pensando em alguma coisa que não faço questão em saber.

— Aproveita, nenhuma mulher se deitou na minha cama antes. — ele se ajeita e coloca os braços por cima da cabeça, ainda sorrindo.

— Devo me sentir privilegiada?

Tá, devo admitir que essa informação me surpreendeu. Ainda não tinha pensado sobre isso, na possibilidade de outras mulheres terem passado por aqui, mas saber que nenhuma esteve me causa uma certa satisfação, nem percebi que ainda estava sorrindo parecendo uma idiota, agradeço silenciosamente pelas luzes estarem apagadas, apenas a TV iluminava o quarto.

O filme começa e tento focar a atenção no que passava na tela, mas estava difícil manter minha atenção em outra coisa que não fosse no homem deitado ao meu lado. Algumas vezes me pegava olhando disfarçadamente em sua direção, a luz da TV deixava a visão ainda mais atraente. Penso no que ele havia dito mais cedo no jantar "Tem medo de mim Kiara?".

Não querido, estou com medo de mim perto de você.

A Máfia Entre NósOnde histórias criam vida. Descubra agora