Eu estava me trocando para o almoço com Antoine. Ritual de amizade. Sorri ao lembrar, já com a roupa normal. Nos encontramos em frente a academia.
— Uau! Você está linda. — ele sorri, parecendo impressionado. Fico confusa. Eu estou com roupa normal. Olho atrás de mim, para ter certeza de que não tem mais ninguém ali.
— Mas eu estou normal... Você está falando comigo mesmo?
— Claro! Você é linda. Além disso, você parece animada. — nossos sorrisos aumentam e eu lhe dou um abraço, como cumprimento. Nos soltamos e começamos a andar.
— Vamos almoçar na cabana hoje? — eu pergunto — Ou você quer que eu cozinhe?
— Não pode ser os dois? Você cozinha e a gente vai pra lá? — ele diz, me fazendo rir.
— Temos que voltar para academia, então não sei se vai dar tempo. Eu já disse pra levar um fogão para a cabana.
Enquanto andamos, continuo olhando em frente. De repente percebo que estamos indo em direção a uma rua sem saída, com uma casa em chamas no fim. Olho aterrorizada para Antoine, mas percebo que ele não está mais ali e sim um dos meus sequestradores. Me viro para correr, mas percebo que há outro homem ali, com uma faca nas mãos. Atrás dele vejo uma Selena criança se contorcendo de dor enquanto tenta correr de mim com a perna sangrando.
— Lane? Você está bem? Acorda logo, garota! — ouço a voz de Selena me chamar e acordo, percebendo que tudo não passava de um pesadelo.
— Hã...? Estou, estou bem. — digo, atordoada.
— Você parecia agitada. Outro pesadelo?
— Sim. Mas já passou, estou bem agora.
Ficamos em silêncio por um tempo, encarando o escuro. Fazia muito tempo que estávamos ali e não havíamos trocado muitas palavras, apenas o necessário.
Todos os dias os mafiosos nos dão alimento, em horários específicos. São apenas 2 refeições: café da manhã e jantar. Dentro do galpão há uma espécie de banheiro onde podemos tomar banho na água fria e vestir roupas velhas e largas que ficam em um canto desse mesmo cômodo. Não tem uma lâmpada sequer e durante todo o tempo ficamos no escuro, o que faz com que eu tenha ataques muito ruins. Eu penso todos os dias em como podemos fugir, mas mesmo que tentássemos, fugir a probabilidade de sairmos vivas são mínimas . É agoniante pensar no que podem fazer comigo e com Selena, mas é a única coisa que posso fazer: pensar.
— Por que você não quis falar comigo depois daquele dia? — pergunto, quebrando o silêncio. Fico surpresa com a rouquidão de minha voz. Durante o dia entram algumas luzes pelas frestas, então não está tão escuro.
— O que? — ela diz, parecendo confusa pela pergunta feita de repente.
— Onze anos atrás, quando você... — faço uma pausa, me lembrando da história que contei aos meus pais — Caiu da escada com aquela faca e machucou a perna... Por que não falou mais comigo?
— Você se lembra que não foi isso que aconteceu, né? Você sabe que essa coisa da escada foi só uma forma que meu pai encontrou de tentar encobrir o que realmente aconteceu, não é?
— Eu me lembro, claro. Não poderíamos ter nos trancado em um armário sozinhas. Mas eu perguntei o porque de você se afastar. — falo, insistindo nisso. Ela se recusou a falar comigo depois do "acidente" e nunca explicou o porquê, é minha chance de saber. Olho novamente para seu rosto e ela desvia o olhar, virando o rosto para o lado. Não responde.
— Eu te fiz uma pergunta!— eu altero minha voz, explodindo de uma vez por todas — Eu estou cansada de nunca saber nada na minha vida. Por que você não me faz um único favor e me conta por que raios fui deixada pela minha melhor amiga, justo no momento em que mais precisávamos uma da outra.
Selena apenas abaixa a cabeça e continua em silêncio.
— Você imagina o quanto eu chorei quando você me esqueceu e ficou popular, já que todos gostavam da garota que mancava porque ela sim havia sofrido de verdade? Eu não tive nenhuma amiga. Nem uma única amiga que conversasse comigo sobre garotos, comesse brigadeiro enquanto víamos filme de romance, estudasse junto, chorasse junto, desse puxão de orelha, simplesmente uma amiga. Você sabe como me senti quando pensei que a maior parte da minha família havia morrido? Eu precisei ser forte sozinha, pra dar forças pra minha mãe e meus irmãos. Eles precisavam de mim, então eu estava bem, mesmo que por dentro eu estivesse gritando por socorro. Todos precisavam que eu fosse forte, eu não podia desabar, então eu não desabei. Eu não tive nenhuma amiga em todo esse tempo, mas pelo menos tive minha mãe, Luna, Brian e Joe. Eu só queria que você não tivesse sido tão egoísta e pensado que sua amiga talvez estivesse precisando de você. Você não me via sozinha pelos corredores da escola, procurando por um lugar seguro onde eu pudesse não ser incomodada? Você sabia que eu precisava de ajuda, mas não ajudou. Eu só quero saber por quê, Selena?
— Eu não sei. Eu não queria te envergonhar fazendo com que andasse com a asiática manca. Depois eu fiquei com raiva por você ser sempre tão perfeita. Quem é que dança balé? Lane. Quem é a melhor aluna? Lane. Quem sempre está de bom humor? Lane. Quem tem a melhor família do bairro? Lane. Quem nunca sentia medo de nada? Lane. — ela finalmente responde —Você era boa em tudo e eu nunca tive uma única qualidade. Eu não dançava, mas também não era inteligente. Se você não tivesse ganhado uma bolsa naquela academia de dança, poderia fazer qualquer outra faculdade que quisesse. Eu não tinha talentos e nem qualquer outra coisa que pudesse me ajudar: ou fazia uma faculdade qualquer ou trabalhava em uma lanchonete o resto da minha vida. Eu não queria que você pudesse ter tantas chances quando eu não tinha nenhuma. Mas eu não tenho culpa se você era solitária. Lane, todos queriam ser seus amigos, você quem não dava aten... — Selena para de falar quando ouve um barulho na porta. Nos levantamos e olho mas assustadas na direção de quem chega. Não estava na hora de nenhuma refeição e ninguém entrava lá pra outra coisa.
— Olá, meninas. Interrompo? Não importa. Está na hora de irmos, Portugal não é tão perto daqui. — era um dos caras que estavam no carro que me trouxe, reconheço pela voz.
— Portugal? — pergunto. Ele me observa por alguns segundos e sorri, me fazendo estremecer.
— Sim. O chefe não pode vir até aqui e nós precisamos das ordens dele. Façam as malas. — ele dá risada, abrindo mais a porta e deixando outros dois homens entrarem. Eles se aproximam de nós e nos levam até uma Van. — Chegaremos em Lisboa em no máximo oito horas.
Vai ser uma grande viagem, mas tento não me desesperar e pensar em uma forma de escapar. Talvez consiga. É uma grande chance, não posso deixar de tentar.
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A Máfia Entre Nós
ActionJá ouviu dizer que existem diversos tipos de vida que podem se conectar? Será que é verdade? Quando o maior mafioso de Portugal morre, surge uma pequena confusão em relação de quem tomará o lugar tão almejado. Mas até quando a paz reinará se todos q...