IV. Casa dos Pinheiros

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A luz do sol atravessava minhas pálpebras, deixando tudo laranja.

Eu estava deitada numa nuvem.

Espera, o quê?

Abri os olhos. A sensação era como eu imaginava que seria dormir em uma nuvem se fossem feitas mesmo de algodão e fofura ao invés de vapor de água condensado.

Não, era uma cama de solteiro com lençóis macios e muito brancos. Duas paredes adjacentes eram de vidro. As outras duas — a que dava pro corredor e a que fazia divisa com outro cômodo — eram de madeira clara polida e estavam nuas. Nada de quadros, fotos, ganchos ou seja lá o que mais as pessoas põem na parede.

Meus cabelos castanhos claros estavam embaraçados e com folhas secas e destruídas, mas lá fora parecia primavera, o que era estranho, já que deveria ser outono.

Pisquei uma, duas vezes. A visão não mudou. Ainda num quarto desconhecido nunca casa desconhecida e... — uma espécie de lobo branco com asas e florezinhas crescendo com o pelo entrou como se a porta não estivesse ali — ... uma realidade desconhecida.

O bicho subiu na cama em que estava agora sentada com as costas na cabeceira almofadada, e eu me encolhi contra a parede o máximo que podia, tentando diminuir o meu tamanho até desaparecer.

Ainda estou desmaiada, só posso estar.

Mas se a Garota Bonita havia batido a adaga na minha cabeça e me feito desmaiar, então eu havia tido aquela conversa com minha tia sobre magia ser real e aquelas insanidades.

— Vejo que conheceu a Celeste. — Olhei para cima e vi a Garota Bonita. A porta estava aberta. Quanta privacidade. — Ela gosta de se esconder, mas deve ter gostado de você para vir até aqui.

— Onde exatamente é aqui?

— Bem-vinda à Casa dos Pinheiros.

»»※««

Ela deixou um copo de vidro com um líquido amarelo em cima do criado-mudo.

— Ah, é só suco — explicou, vendo meu olhar.

— Casa... Casa dos Pinheiros?

— Sei que não parece muito criativo, mas não é só pelos pinheiros ao redor. Tem essência da Old Tjikko na fundação. É um abeto, da família dos pinheiros; a árvore viva mais antiga de todas, ou quase isso.

— Olha, eu preciso ir embora. Minha amiga foi levada e...

— Stef quer falar com você sobre isso — interrompeu-me, sentando-se na cama com uma perna embaixo do corpo.

— Não sei quem é essa.

Ela mal me deixou terminar.

— É nossa diretora, ela...

— Não sei, mas tampouco me interessa descobrir — cortei. — Estou aqui porque vocês me nocautearam.

A garota de luzes pareceu magoada. Ela alisou as vestes azul-safira. Era uma capa longa com mangas, diferente das roupas de couro que todos usavam quando os encontrei na floresta.

— Eu sou Annabell, a propósito. Ou não te interessa descobrir isso também?

— Desculpe — falei constrangida. — Sou Juliet.

— Stef, nossa diretora, como eu ia dizendo, quer falar com você. Ela conhecia sua mãe.

— O que quer dizer com diretora? Como sabe quem é... quem foi — me corrigi — minha mãe?

Os Últimos Descendentes - SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora