Os Últimos Descendentes - Sangue

XI. Derrotado

Segurei a lança apontada para o pescoço de Jake, que deu um passo para trás com os braços levantados em rendição. Os nós dos meus dedos estavam brancos por causa da força com que eu segurava a haste.

— Tudo bem, tudo bem — disse ele, recuando mais um passo. Girei a arma e a segurei ao lado do corpo. Só aí Jake riu. Ele bateu palmas.

Uma camada fina de suor cobria meu corpo e umedecia as raízes do meu cabelo preso em uma trança. Tinha uma mancha molhada na regata branca que eu vestia.

— Ela acabou com você, Sand, totalmente — zombou Logan, sentado numa parede da sala ampla de combate, adjacente àquela que abriga várias opções de armas.

Eu havia tentado espadas, arco e flecha e estrelas de ninja, mas finalmente tinha encontrado algo em que era boa.

Fazia uma semana desde o baile e, para escapar dos comentários, eu tinha passado a treinar com Jake, Logan e Anna sempre que podia. Já estava bem melhor em corpo a corpo agora, uma verdadeira evolução. Embora o assunto tivesse finalmente morrido, eu não parara os treinos. Era um jeito de evitar Luke também — eu não sabia como encará-lo.

Para o meu alívio, eles não tocavam no assunto. Visando evitar complicações, eu fazia minhas refeições com Odeya, que estava brigada com Allison. Era culpa dela o que estava acontecendo, mas ela me pedira desculpas e não via motivo para guardar rancor.

Não era que nunca tivesse beijado ninguém. Já tocara os lábios de um garoto com os meus, e foi isso. Me assustou completamente que Luke fosse de fato fazê-lo. Não era certo, fazer por coação. De certa forma, eu fizera um favor a ele.

Escutei Jake rir e mandar Logan levantar a bunda preguiçosa e experimentar ele mesmo então, e Logan dizer que estava afiando a mente e chamar o amigo de descerebrado. Os dois começaram a lutar de brincadeira. Logan era muito bom com facas e adagas. Eu ainda tinha a que Luke me dera, mas não era necessária havia um tempo, felizmente.

Fiz uma careta para o meu cheiro quando o inalei. Repousei a lança com as outras armas.

— Vou tomar banho — avisei para os garotos. Jake, que estava dando uma gravata em Logan, assentiu, distraído.

— Vai me bater com seu livro? — provocou ele rindo como um ogro. Balancei a cabeça e saí, desfazendo o penteado e soltando o cabelo.

Entrei no banheiro, segurando uma troca de roupas da escola e abri as torneiras, vapor quente subindo. Descansei enquanto a água morna me cercava na banheira.

Celeste atravessou a porta como se ela não estivesse lá, o pelo agora sem flores. Para o verão, existiam mechas luminosas como fitas de sol. Stef não havia mentido: as estações eram realmente mais amenas. Garoas caíam com frequência e a temperatura não nos fazia suar incontrolavelmente.

— E aí, menina? — disse com carinho, passando a mão por seu pelo macio quando Celeste passou ao lado da banheira.

Quando era menor, quis tanto ter um animalzinho de estimação, mas minha tia nunca deixara. Minha alternativa eram os insetos e bichinhos selvagens que fugiam antes que eu pudesse tocá-los. Contrabandeei um gato uma vez, da cidade. Ele fugiu depois de estragar o sofá e minha tia ter um ataque de histeria, e eu nunca mais o vi.

Celeste foi até onde eu havia deixado minhas roupas e começou a fuçar, cheirando. Tentei me lembrar se tinha deixado um biscoito em algum dos bolsos.

— O que está fazendo, menina? Deixe aí — pedi passando um sabonete cheiroso nos braços. A planta no canto soltava bolhas e quando uma chegou até mim, estourei com a ponta do dedo.