XXVII. Dragão de tinta

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A floresta era densa e arrepiante. Não havia trilhas, as copas eram cheias de folhas de um verde profundo, as raízes para fora atrapalhavam a caminhada. Os troncos eram cobertos de musgo e insetos.

Parei para beber água, sentindo o suor escorrer pela minha testa. Àquela altura eu tinha prendido o cabelo em um rabo de cavalo alto. A terra abaixo de nós era escura e macia de se pisar.

Olhei para cima. Mal dava para ver o céu. Eu não ouvia um pássaro sequer. Estremeci e guardei a garrafa. Apertei o passo para alcançar os outros. Tropecei numa raiz, mas Luke me segurou.

— Droga. Obrigada. — Voltei a me equilibrar. — Ei — chamei. Luke se voltou para mim novamente. — Obrigada por mais cedo também. Pelo escudo e por não me deixar me afogar ou ser comida por uns tubarões como num desses filmes ruins de animais assassinos.

— Não tem de quê — respondeu e sorriu. — Mas não posso levar crédito por tudo.

— O quê? Como assim?

— Você levantou aquele escudo, não eu.

— Não, eu... — gaguejei.

— Bem, eu é que não fui. — Ele levantou as sobrancelhas e afastou um galho baixo para que pudéssemos passar.

Não podia ter sido eu, podia?

— Então, temos uma rota ou o quê? — mudei de assunto.

— Não existem exatamente mapas de uma ilha que ninguém acredita que existe. Mas você que meu palpite? — Ele não esperou eu responder. — Acho que tem um vulcão por aqui.

— A lâmina vulcânica — lembrei.

— Ele tem que estar perto dele. Não deve ser algo difícil de ver considerando tamanho que deve ter, certo?

Não senti confiança em sua voz.

— Certo — concordei, apesar disso.

A noite caiu com rapidez. O breu era intenso devido à copa densa das árvores. Decidimos montar acampamento assim que ouvimos um galho se partindo a alguns quilômetros.

— A primeira vigia é minha — disse Diana, se posicionando com suas armas.

Erguemos umas barracas meio desajeitadamente pela falta de espaço. Nenhuma fogueira. Estávamos aquecidos por magia, o que, na verdade, era bem legal. Diana movimentou um braço.

— Escudo contra nossos sons, cheiros e todo o resto — avisou-nos. Aquilo era um alívio de se ouvir.

Entrei na minha barraca, larguei a bolsa num canto e arrumei meu saco de dormir. Sentei-me com as pernas cruzadas sobre ele, livre de sono. Olhei para cima no momento em que Luke pôs a cabeça pra dentro.

— Combinamos que o próximo turno é meu — disse ele.

— Sozinho? — perguntei preocupada.

— Arthur vai estar comigo, para garantir. Como professor, ele é meio que responsável por nós, junto com a Stef, a Diana e o Leaf.

Suspirei. Isso pelo menos me deixava mais calma. Remexi na bolsa atrás do chocolate quente na garrafa magicamente térmica. Abri a tampa e virei um gole reconfortante.

— Uhum, isso é muito bom. Cuidado — acrescentei, reparando que ele ainda não tinha saído.

— Se importa se eu esperar aqui com você até o meu turno?

Abaixei a garrafa.

— Luke...

Ele entrou mesmo assim e se deitou ao meu lado, encarando o teto da barraca. Parecia mais do que cansado. Parecia derrotado.

Os Últimos Descendentes - SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora