XIV. Visitantes forasteiros não solicitados

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— Eu vou visitá-la — disse a Stef. Não um pedido, um anúncio.

— Será que é prudente? — respondeu ela, com olhos gentis.

A resposta para isso era irrelevante. Stef sabia disso também.

— Ao menos leve seus amigos — pediu.

Concordei.

E foi isso.

Arrumei minha mochila de qualquer jeito, enfiando algumas camisetas dadas por Annabell. Só precisava ver minha tia, abraçá-la. Dizer que eu ia voltar pra casa logo e que ia começar a obedecê-la agora. Antes tarde do que nunca.

Anna bateu na porta já aberta.

— Stef não acha que é natural — falei como cumprimento, sem olhá-la. — Você acha que um de vocês pode descobrir se é um feitiço, uma planta ou algo assim e curá-la?

Segurei a bússola que estava no criado mudo e refleti. Coloquei no bolso de trás da calça.

— Sim, vamos tentar — respondeu ela de forma amena. — Como você está?

Balancei a cabeça, fechando o zíper da mochila.

— Não estou preocupada comigo. Melhor nos apressarmos.

Abri a gavetinha do criado mudo para checar se tinha esquecido algo; vi a adaga, mas deixei onde estava. Annabell olhou lá dentro. Ela pegou a pulseira de pedras azuis.

— Que baile, não? — comentou ela, depois franziu a testa. — O que essas pedras me lembram?

Parei no meio de um movimento e virei a cabeça para olhar para ela, perplexa.

— Os — comecei, mas me impedi de continuar. — O Mar Infinito — respondi, por fim.

— Os olhos de Luke! — exclamou ela, estalando os dedos, finalmente se lembrando do que tinha esquecido. — É! Logan comentou isso uma vez e por isso parei de usá-la. Tinha me esquecido completamente. — Ela riu. Eu a olhei sem expressão.

— Ah — fez Anna, se dando conta. — E você usou no baile, né? Foi mal.

Suspirei.

— Não tem problema.

Joguei a bolsa no ombro e saí do quarto, sendo seguida por Anna, com sua própria bagagem. Só algumas roupas para alguns dias.

Dizia a mim mesma que essa preocupação era infundada, pois minha tia ia ficar bem. Me preocupar era como me dizer que ela não ia, e não podia acreditar nisso.

Perto da porta da frente estavam os outros. Logan, que ia dar a Bênção a eles; Jake, não completamente curado, mas teimoso demais para ficar de fora e... Luke. Ele se virou para nos olhar quando descemos os últimos degraus. Ignorei o agito inconsistente no estômago. O que acontecera antes tinha sido besteira; eu era só a humana que viera de brinde e que ele era obrigado a suportar. E ele era só o feiticeiro arrogante e intragável que nunca fingiu estar satisfeito por minha presença. Tudo certo no mundo, como deveria ser. Eu não conseguia pensar nisso naquele momento.

Era de noite, então poucos ainda estavam de pé, usando os pijamas com o mesmo esquema de cores do uniforme. Recebemos olhares curiosos. Segurei as alças da mochila às minhas costas, como um casco de tartaruga.

— Devemos...?

— Sim, vamos nessa — concordou Jake com sua animação rotineira. Um sorriso surgiu em meu rosto; nos rostos de todos, felizes por ele estar bem.

Fiz um meneio com a cabeça e começamos a andar. Eram alguns metros até a Barreira. Eu estava desmaiada da última vez que fizera esse caminho. Nos braços do ranzinza Luke Hemingway. Parecia ter acontecido há uma eternidade. E, no entanto, eu ainda estava ali, falhando vez atrás de outra em encontrar a melhor pessoa que eu já tinha conhecido.

Os Últimos Descendentes - SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora