Senti um forte ardor na palma da mão, que foi subindo pelo meu pulso, braço, ombro, pescoço, até chegar ao meu cérebro e me despertar do choque.
Literalmente.
Ainda estava caída na calçada, minha saia clara de cetim levantada o suficiente para revelar mais da minha coxa do que o planejado, com o pneu da bicicleta prateada entre a minha canela esquerda e o chão. E havia um menino também, parecendo tão desconfortável quanto eu, ou talvez mais. A pele dele era bem clara, apesar de um rubor no rosto e uma vermelhidão onde ele provavelmente havia batido ao cair da bicicleta. Seu cabelo era preto e ondulado, apesar de bagunçado — diferente do meu que era loiro e liso —, e seus olhos eram verdes como um jardim.
Antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, uma menina baixinha e morena chegou perto de nós correndo, tocando os ombros do rapaz e ajeitando o seu cabelo.
Ela estava vermelha como fogo, e com os olhos arregalados. Algumas pessoas começaram a ser aglomerar ao nosso redor e eu me senti corar, envergonhada — e ainda confusa.
Comecei a me levantar da queda e, ao apoiar os braços no chão, senti uma dor lancinante.
— Ai — gemi baixinho sem querer, voltando a me sentar no chão. Então, o menino de preto à minha frente tirou a bicicleta que estava entre nós e veio para perto de mim, preocupado.
— Meu Deus, menina... Você está bem?
Ele estava ofegante e cheirava a uma série de coisas diferentes, como suor, cigarro e shampoo chique. Olhe para o seu pulso e vi que sangrava.
— Você está sangrando — falei devagar. A menina morena olhou para nós e para a cena em volta dela, e correu para pegar algo no chão. Um celular destruído. Mesmo assim, ela levou-o até seu rosto e começou a dizer alguma coisa que não entendi, porque ela se afastou em seguida.
Finalmente, o menino olhou para o pulso embalado por um plástico filme com sangue manchando tudo em volta. Ele pareceu assustado, como se não tivesse dado conta antes da gravidade do ferimento que estava ali.
Alguns curiosos já se afastavam, após constatar que, na verdade, não tinha muito ali pra ver.
A Paulista estava movimentada como sempre, e o céu já estava em um tom de azul muito escuro, com um pequeno filete laranja no fim da avenida, entre os prédios que se estende ao longe. O trânsito era intenso, assim como minha dor no braço que ia e vinha a cada segundo.
— Estou bem, eu acho — ele responde incerto. — Merda, foi bem na tatuagem — ele disse baixinho, para si mesmo. — Mas, e você? Está bem? Eu te machuquei? Desculpe, eu não vi você vindo e...
— Calma, estou bem — respondi, enquanto ele tentava me escorar devagar, com medo de que eu me quebrasse com um simples toque. Levantei com a ajuda dele, e a menina ainda estava no celular. — O seu braço é que parece feio... cuidado para não infeccionar.
— Seu joelho — ele apontou — e suas mãos. Você também está sangrando. E sua bolsa — ele se abaixou para pegá-la para mim, e colocou uma mão na coluna antes de se levantar. Ele também devia estar dolorido e não queria demonstrar. Seria mais um momento embaraçoso em um espaço tão curto de tempo.
Peguei a bolsa e vi que meu fone de ouvido pendia para fora, arrebentado. Provavelmente, pela bicicleta dele.
— Droga... já era — falei baixo, colocando o que sobrou dele para dentro da bolsa.
— Merda... olha, não se preocupe, eu te compro outro e...
— Noan, era a sua mãe — ouvi a voz da menina morena, que entregou os cacos do celular para ele. — Já conversei com ele. E você, está bem? — ela perguntou, afobada, dessa vez para mim.
— Estou, eu acho — respondi, enquanto ela me examinava.
— Você está sangrando.
— Ele também — avisei, apontando com a cabeça para o Noan? Foi disso que ela o chamou?
— Não ligo pra ele... Posso cuidar dele daqui a pouco. Você quer ir para um hospital ou...?
— Sabi — o menino chamou, colocando o que sobrou do aparelho no bolso e em seguida, as mãos no ombro da amiga. — Está tudo bem... eu assumo daqui. — ele passou a mão pelo corpo repetidas vezes, como se quisesse ajeitá-lo.
A menina morena olhou para ele e compreendeu algo que a fez a assentir. Ela deu de ombros e saiu, gritando um "me liga" antes de chegar na esquina. Como os dois iriam se falar com o celular dele naquele estado, eu não fazia ideia.
— Olha, desculpa... Como eu estava dizendo, eu não vi você e...
— tudo bem, eu também estava distraída — interrompi um pouco impaciente. Aquela situação constrangedora já estava me deixando aflita, e eu, que já estava atrasada, provavelmente, já tinha acabado de perder o primeiro horário da faculdade. — Olha... Noan?
— Noah — ele respondeu.
— Mas, a menina... disse...
— Como preferir — ele me interrompeu, meio sem paciência. — Noah ou Noan, tanto faz. Como você se chama? — senti um calafrio pela forma direta como ele fez a pergunta, e me secando com aqueles olhos claros.
— Sina — respondi, ainda constrangida. Era bem possível que eu estivesse com uma cara ridícula.
— Sina. Prazer. — ele estendeu o braço com sangue pra mim, e, depois, estendeu o outro braço ao perceber que talvez não fosse bom que eu tocasse o anterior. Toquei na mão dele e ele mordeu o lábio inferior, abrindo um sorriso.
— Olha, eu...
— Calma — ele me interrompeu de novo, incerto. Pegou a bicicleta do chão e foi para o canto da calçada, para não impedir mais o fluxo de pessoas que passavam por nós, apressadas. — Deixa eu ao menos te pagar um café ali na frente. — ele apontou para a direção de onde eu sabia que existia um Starbucks. — É o mínimo que eu posso fazer, se você não quiser ir para o hospital.
— não estou ferida para ir a um hospital — respondi, sem muita certeza, ainda sentindo algumas pontadas vindas do pulso. Eu esperava que ele não ficasse inchado. — mas, também não sei se é uma boa ideia ir para o Starbucks sangrando assim. — indiquei com a cabeça os nossos arranhões e pele ralada.
— Lá tem um banheiro. A gente se limpa superficialmente, toma um café rapidinho e depois se cuida melhor. Nós acabamos de nos atropelar. Não posso deixar você ir embora assim. Vai que depois você me processa por não prestar atendimento? — ele perguntou quase sorrindo, e imaginei que ele estava brincando. Pelo tom, de fato, estava.
— E me levar ao Starbucks é prestar atendimento? — provoquei.
— Sina... você ainda não esteve comigo no Starbucks — ele respondeu, mordendo novamente o lábio inferior. E, por algum motivo, eu sorri. Chequei mais uma vez o relógio e eu estava ainda mais atrasada. — Vamos? — ele me chamou, estendendo a mão "limpa".
— quer saber? Dane-se a aula — respondi baixo. — Você vai me pagar um Frappuccino.Mais tarde eu posto mais 😗✌🏻
Xoxo ✨
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𝐀𝐒 𝐋𝐔𝐙𝐄𝐒 𝐌𝐀𝐈𝐒 𝐁𝐑𝐈𝐋𝐇𝐀𝐍𝐓𝐄𝐒 - 𝐍𝐎𝐀𝐑𝐓
Romance[CONCLUÍDA] Noah passou por uma fase terrível e seu coração ainda está despedaçado. Agora, ele decidiu viver um dia após o outro, tentando compreender as particularidades dessa cidade enorme que é São Paulo, onde ele vive, mas se sente sozinho. Poré...