049|ɴᴏᴀʜ

1.4K 134 9
                                    

Tomo um susto quando saio do consultório e vejo a Sabi, como um sorriso no rosto e um Starbucks esticando na minha direção.
Sei que se fosse um outro momento, eu abriria um sorriso e implicaria com ela. Agora, só retorço a boca numa tentativa — muito — falha de tentar parecer simpático. Se ela nota, finge que não. Apenas dá de ombros e vira na direção do elevador, sorrindo.
— Como foi? — ela pergunta.
— Menos pior do que eu pensava — confesso.
— Já é um começo, né?
A porta do elevador abre e entramos, descendo em direção ao térreo.
— Talvez seja.
Ela sorri de novo.
— Marquei um compromisso para você. Espero que não se importe.
Olho para ela com um olhar de espanto, que ela, obviamente, ignora.
— Vai ser legal — ela tenta me convencer.
Então, a porta se abre, estamos no térreo e vamos até a saída do prédio. Ela empurra a porta de vidro e vejo Pepe parado sobre uma placa de PARE. É quase cômico. Mesmo assim, ainda quero matar a Sabi.
— Sabi, o que é que você está aprontando?
Ela me olha com os olhos brilhando, como se aquilo fosse um plano muito arquitetado e calculado por ela. É como uma criança prestes a ganhar um pote de sorvete, ou coisa parecida.
— Vai ser legal, já disse!
Pepe me encara sem graça, e não posso culpá-lo. Se eu fosse ele, não chegaria nunca mais perto dessa aberração que sou eu. Ainda me lembro dele me carregando para longe do colo da minha mãe, e a imagem me embrulha o estômago. Com certo pesar, penso que nunca foi um amigo muito bom para ele, considerando que quase não sei nada sobre sua vida. Mas sinto que, pelo menos, a Sabi sabe, e, de alguma forma, isso quase me basta.
A sensação de estar sempre sendo carregado por alguém ainda me perturba. Por Sabi, por Sina e até por ele.
Quando é que eu vou começar a andar sobre os meus próprios pés?
Sabi provavelmente nota minha expressão, pois pergunta:
— Você não está bem, né?
A frase vem sem julgamentos ou ironia, é só uma pergunta direta, crua.
— Não — respondo, sentindo lágrimas se formando nos meus olhos. Respiro fundo. — Eu não sei, é que sempre sinto essa sombra vindo atrás de mim o tempo todo e simplesmente não consigo... me livrar dela e...
Meus pensamentos nebulosos clareiam por um segundo quando Sabi segura na minha mão, e eu a encaro.
— Está tudo bem agora. Estou aqui com você, ok?
O que ela diz é simples e verdadeiro. Eu sinto. Sinto que ela está comigo. E é como se ela realmente pudesse me proteger. Eu me sinto um pouco mais seguro e calmo.
Sim... calmo.

....

Descemos do metrô na estação Paraíso. Caminhamos cerca de seis minutos na Vergueiro e, então, Sabi atravessa a rua.
Chegamos ao Centro Cultural de São Paulo e reconheço o lugar, apesar de nunca ter ido lá. É famoso por ter uma espécie de jardim suspenso na cobertura, e era um dos próximos destinos do meu roteiro com a Sina.
Desanimo um pouco mais.
O lugar é mais bonito do que eu pensava, é bem amplo, aberto e bem ventilado. Sabi sobe as escadas de mãos dadas com Pepe, e tenho a impressão de que ela já fez isso antes. Sigo atrás dela, degrau após degrau, até que a minha visão se acostuma à claridade que vem dali e meu coração bate mais forte quando entendo onde vamos chegar: estamos no terraço, no jardim, e é incrível!
O espaço é, na verdade, muito mais extenso do que eu pensava, e o plano verdes se estende até onde os prédios se erguem nas laterais. Nas beiradas não há nada, e é como se pudéssemos tocar o céu dali, mesmo com as enormes antenas no topo dos prédios e o barulho dos carros ao nosso redor.
Em alguns pontos há árvores, e bancos com pessoas lendo. Mesmo assim, está bem vazio e tenho a sensação de que poucas pessoas conhecem esse lugar. E, ao mesmo tempo em que desejo que ele fosse mais conhecido, eu me sinto grato por tê-lo só para nós agora.
Só então olho para Sabi e vejo seu sorriso cúmplice com o de Pepe, ambos olhando para mim.
— O que foi?
Pepe dá uma risadinha e Sabi segura a dela, o que me deixa confuso.
— Pe, traz algo para eu beber? Estou com sede — ela pede, e ele acena em confirmação.
— Você quer algo, Noahzito?
— Não, obrigado — respondo, enquanto ele sai e fico com a Sabi.
Ficamos em silêncio um instante, como se não soubéssemos o que fazer, como agir.
— Vem cá, vamos sentar ali — ela chama, indicando um banco à frente, perto de uma grade, que é a única coisa que nos cercam antes dos prédios que se erguem ao nosso redor.
Sentamos lado a lado enquanto a brisa fria nos envolve, e observo os edifícios que estão diante de mim. Algumas janelas estão abertas, e imagino o tipo de vida que há dentro de cada um daqueles apartamentos. Se eu morasse ali, veria esse jardim como uma espécie de quintal. E é um quintal que eu adoraria ter.
— Aham... Pepe, então... deu certo — comento.
Vejo que Sabi cora e dá um sorriso.
— Sim. Ele é bem legal. E os apelidos de vocês são parecidos.
— Ele é legal mesmo — concordo. — Ele me divertia na livraria.
— E vai continuar divertindo. Só mais dois dias de afastamento, não é?
— É, mas acho que vou voltar amanhã — confesso.
Sabi me encara como se eu tivesse dito algo absurdo.
— Amanhã, já?
— Sim... acho que já estou me recuperando. E eu preciso ocupar a cabeça também.
Só de pensar nisso já penso também em Sina, que há uma hora dessas está nos Estados Unidos, procurando ser uma profissional em algo que ela gosta tanto, imersa no mundo dos filmes que ela me fez amar ainda mais. E eu estou aqui, com a minha vida parada baseada em tomar remédios que controlem o meu próprio cérebro porque eu não consigo fazer nem isso.
Sou uma inútil.
Sempre me senti um nada, mas, quando tive Sina, ela me preencheu. Agora, voltamos a ser eu e esse vazio que parece querer me consumir.
— O quê? — Sabi pergunta, e olho para ela.
— O que o quê?
— O que você disse sobre a Sina?
Ela me analisa e só então percebo que pensei alto demais.
— Nada. Não foi nada.
Então ela chega mais perto e aninha a cabeça no meu ombro. Quase sinto uma força passando dela para mim. Estou tão fraco que isso é a única coisa que me impede de desabar.
— Noahzito... Sei que você a ama, mas você não pode ser tão dependente dela assim. Ela deveria transbordar você, e não ser um complemento... Você precisa ser o suficiente para você, sabe? É muito difícil, e você sabe como eu sofri para aprender essa lição, mas, agora como o Pepe, eu sinto isso. E, você sabe... tem algo de muito bom em compartilhar a vida com alguém.
— Eu sei disso. É que o tempo todo algo aparece para me deixar pior... Eu sempre estou confuso. Tudo o que eu faço é ferir as pessoas ao meu redor, quando elas não estão me ferindo. E agora ela se foi e tem um eco na minha mente o tempo todo, de coisas que vivemos e... e eu tento, sabe... eu tento. Primeiro a minha mãe. Depois o meu pai, e aí a minha mãe de novo. Sempre ela, o tempo todo. E depois, a Sina. Juro que tento ficar longe disso, mas não consigo... já percebi que é como se esse tipo de situação me perseguisse... e eu fico o máximo que posso quieto, na minha.
— Mas, no fim, não importa — ela me interrompe — , as pessoas continuarão sendo quem são e como são, independente dos nossos esforços para salvá-las, ou para nos manter distantes de toda a dor que emana delas.
— Isso — falo, depois de um tempo, assimilando as palavras dela.
— Te conheço o bastante, Noahzito. E sei que você vai voltar. — ela aperta minha mão. — E a Sina também vai voltar. E, sabe de uma coisa?
— Diga...
— Ela vai voltar para você, Noahzito. Ela gosta de você, eu sei disso. Percebi em todas as vezes que a vi. Ela é uma menina legal, e nem preciso falar do efeito que ela surte em você...
Sorrio.
— Ela é incrível — falo. — Mas acho que estraguei tudo.
— Talvez... mas sei que você vai dar um jeito de consertar as coisas. Ou ela... não sei.
— Espero que você esteja certa... obrigado. Você é sempre a calmaria quando está tudo um caos.
Então, Pepe reaparece ao longe e vem caminhando na nossa direção, com uma camisa polo listrada que só reparo agora, uma calça jeans e um tênis casual.
Não há nada de beber nas mãos dele.
— Você e Pepe, hein? Quem diria... — digo enquanto ele está longe.
— Pois é... — ela sorri, sem graça.
— Vocês estão namorando, de fato?
— Acho que sim, não sei... Não precisamos do rótulo, namoro, sabe? Mas gostamos um do outro, eu acho.
— Gostam, sim. — sorrio. — Já percebi que sim.
Ela sorri de volta, e só então percebo o quanto é realmente possível se sentir genuinamente feliz por outra pessoa. Por dentro eu estava um caco, tudo em mim partido e dividido em milhões de pedaços que poderiam formar uma constelação. "Noah em pedaços", talvez. E quando eu não me sentia oco, eu me sentia vazio. Essa combinação não é famosa por produzir sorrisos, mesmo assim, cá estou eu com um no rosto. E não é um forçado, ou um daqueles para manter as pessoas longe. Também não é um que poderia ter sido causado por Sina.
É um sorriso que só pode ser causado por Sabi, para a Sabi. E é daqueles que se dá quando se está feliz porque uma pessoa querida também está feliz, e é o caso agora. Quase me sinto um pouquinho melhor ao saber que eu juntei os dois, e vê-los felizes me deixa feliz também.
— Camisa bonita — digo para Pepe quando ele finalmente chega.
— Você que me deu, idiota — ele brinca. — No amigo oculto que fizemos na livraria do ano passado.
Sorrio quando me dou conta de que não fazia ideia disso.
— Se posso entrar no assunto — Sabi intervém — , fui eu que escolhi. Nem te conhecia, mas agora sei que foi um ótimo presente. Ficou ótima.
— Realmente — digo. — Sou péssimo nessas coisas.
Os dois se abraçam e dão um beijo rápido. Pretendo desenhá-los quando eu chegar em casa.
— Não havia nenhuma lanchonete aberta aqui no prédio — ele diz. — Podemos dar uma volta e vemos se encontramos algo...
— Não precisa — ela diz. — A sede passou.
Mais uma vez, eles trocam sorrisos cúmplices. Então, percebo que a Sabi fez isso de propósito para que ele nos deixasse sozinhos.
Sabi sempre sabe o que fazer.

Como eu amo o meu pepina 🥺💗Xoxo ✨

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Como eu amo o meu pepina 🥺💗
Xoxo

𝐀𝐒 𝐋𝐔𝐙𝐄𝐒 𝐌𝐀𝐈𝐒 𝐁𝐑𝐈𝐋𝐇𝐀𝐍𝐓𝐄𝐒 - 𝐍𝐎𝐀𝐑𝐓Onde histórias criam vida. Descubra agora