Por trás das ondas

Capítulo 39: Caminhadas

       Cheguei até a praia e encontrei Adrien sentado em cima da prancha me esperando.
        -Você está atrasada- ele levantou e chutou um pouco de areia na minha direção.
       - "Daqui a pouco" não é um tempo muito exato, sabia?- rebati, chutando areia nele de volta.
- Eu imaginei que você fosse vir logo depois do café da manhã.
Ele andou até a beira do mar e se abaixou.
- Nós temos que marcar um horário da próxima vez- eu disse, rindo.
Eu ia pegar minha prancha, quando algo me atingiu na barriga, por cima da minha blusa de surf. Eu percebi que Adrien tinha feito uma bola de areia molhada e atirado em mim.
- Ei-reclamei.
- Você chutou areia em mim, isso é só revanche- ele disse sorrindo, enquanto preparava a sua segunda bola.
Corri até a beira do mar também.
- Você que começou!
Nós ficamos naquela briga de areia por um bom tempo. Apesar de termos uma competição em apenas algumas horas, era apenas amistosa e eu adorava fazer esse tipo de coisa com ele, eu não queria parar para treinar. Eu gostava muito de surfar, mas eu gostava de um certo alguém mais.
        Eu peguei meu celular e vi que já estava praticamente na hora de nós termos que subir para nos arrumar e ir para a outra praia, onde seria o evento. Não ficava muito longe de onde nós estávamos, menos de vinte minutos de carro, mas mesmo assim era melhor que nós chegássemos adiantados do que atrasados.
      Eu falei isso para Adrien.
       - É, é melhor nós voltarmos para o hotel, mas eu vou dar um mergulho antes para tirar essa areia toda de mim- ele apontou para sua roupa e depois estendeu a mão para mim.
      - Você estava praticamente implorando para eu jogar areia em você!- eu falei, segurando a sua mão enquanto nós entrávamos no mar.

   ***

   Quando nós chegamos na praia, já havia uma multidão aglomerada a uma distância do mar: famílias, repórteres, pessoas com cartazes. Nós passamos perto de um grupo que pediu para tirar fotos conosco. Eu comecei a ficar meio receosa de tirar fotos desde que Adrien tinha me descoberto. Isso porque era uma foto de um jornal de cem anos atrás, qualquer mídia agora com a internet poderia durar muito mais tempo e ser achada bem facilmente. Sem contar que, se ele era imune, por algum motivo que eu ainda não descobri, outras pessoas também poderiam ser e achar o que ele achou.
Agora era tarde demais, eu já tinha aparecido em uma revista, em vídeos de internet e até mesmo na televisão. Não é como se algumas fotos com algumas pessoas fosse piorar a minha situação.
     Eu sorri e fui me juntar a Adrien no meio de um grupo.
     Depois de um tempo, Leo, Melissa se juntaram a nós na praia, as sereias e Yasirah chegaram e ficaram no calçadão, onde grande parte da plateia estava.
      Sorri para Adrien quando chegou a hora de entrarmos no mar.
      - Boa sorte.
      Ele piscou para mim.
      - Eu não preciso de sorte, eu tenho habilidade.

      ***

      Nenhum de nós ganhamos, no final.
      O título de vencedor foi para uma garota da California, Sarah.
      Mesmo não ganhando, Adrien ficou acima de mim no ranking, e parecia que ele nunca mais calaria a boca sobre o assunto.
     - Você perdeu- ele falou, colocando a mão sobre meu ombro enquanto caminhávamos.
     - Eu sei- respondi, tentando evitar revirar os olhos.
      - E você é uma sereia então deveria ser melhor em esportes aquáticos do que eu.
      - Eu sei.
      - Mesmo assim, você não é!
      - Essa competição foi um deslize- eu rebati- e acho que você está muito certo de que você é melhor do que eu para quem caiu da prancha na nossa última competição.
- Eu já falei, alguma coisa me prendeu, essa é uma comparação injusta.
Nós dois decidimos deixar nossas pranchas na van com nossos amigos e voltar a pé da praia da competição, mesmo que fosse levar uns vinte ou trinta minutos a mais para chegarmos no nosso hotel. Honestamente, o vento suave que vinha do mar, a areia nos meus pés, o barulho do mar e o garoto do meu lado faziam a caminhada valer a pena.
- Você acha que alguma coisa te prendeu, nós não temos certeza de nada ainda.
Ele deu um chute fraco na areia enquanto andávamos.
- Liza, você acha que existem outros seres sobrenaturais além de sereias.
Eu sorri com o apelido, mas meu sorriso sumiu no momento que ouvi o resto da frase.
- Acho que não- respondi depois de um tempo refletindo- se existissem, provavelmente as sereias saberiam sobre. E eu não sou sobrenatural, não me chame assim.
- Por que não?
- Não gosto dessa palavra- admiti- ela me lembra que, não importa o quanto eu queira, eu não sou humana.
Nesses últimos meses, eu me senti mais humana do que nunca, e se eu fechasse os olhos por alguns segundos, era como se eu realmente fosse. Eu me sentia mais feliz e leve nesses momentos e eu não precisava ser relembrada que eles não eram reais.
- Eu não quis dizer isso com um sentido ruim.- ele disse, tirando o braço do meu ombro para segurar a minha mão- Você consegue respirar embaixo d'água, nadar super rápido, e servir a uma causa importante- ele parou de andar e se virou para mim quando percebeu que eu fiquei tensa depois de ele mencionar a "causa"- Não me entenda mal, eu sei que deve ser muito difícil e eu provavelmente não conseguiria fazer o que você faz, mas pelo que você disse, é por causa de vocês que a água continua existindo, não é?
Ele segurou minha outra mão também, e eu senti uma lágrima cair pela minha bochecha.
- E mesmo fazendo isso com um motivo- ele continuou- você claramente se sente culpada. Liza, você se importa com as pessoas, você tentou me salvar na competição, é bondosa, tem esperança, acredita nas pessoas...- ele parou e levou sua mão direita até a minha bochecha- e são essas pequenas coisas que te tornam humana.
Me aproximei dele e encostei minha cabeça no seu peito.
- Obrigada, eu acho que eu realmente precisava dessa conversa.
Nós ficamos ali, abraçados, por um tempo.
- Nós já estamos bem perto do hotel- Adrien falou, quebrando o silêncio- você quer entrar no mar?
   Eu sorri.
         - Com certeza.
        Nós dois corremos em direção das ondas.