Cap 27: Horizontes espandidos

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Nós dois nos sentamos em um banco perto do parque e lá, eu comecei a contar minha história.
Eu contei para Adrien sobre o naufrágio. Sobre como perdi meus pais, como me tornei uma sereia para que meu irmão pudesse viver.
- E qual era mesmo o nome do seu irmão?- ele perguntou.
- Alex. Alex Saive.
Ele deu um sorriso fraco.
- Aposto que ele era uma ótima pessoa.
Meus olhos se encheram de lágrimas, que eu espantei com uma das mãos.
- Provavelmente era.
Continuei minha história. Como as sereias (as quais eu não nomeei) me acolheram e que as memórias da minha antiga vida foram sumindo, chegando em um ponto que eu não lembrava nem o nome dos meus pais, ou aonde nós morávamos, apenas do rosto e nome do meu irmão. Contei também sobre o Titanic e como a culpa daquele naufrágio me assombrava até hoje.
- Foi por isso que você estava tão estranha durante o filme. Quer dizer, a maioria das pessoas estavam tristes, mas você continuou chorando quase uma hora depois.
- Eu não quero mais falar sobre isso.
Continuamos conversando e eu contei toda minha história. Eu apenas menti sobre um detalhe: eu não contei que Mika e Kat eram sereias. Disse que eu morava longe das sereias que tinham me acolhido no início e que Kat e Mika eram apenas minhas colegas de quarto, que eu considerava minhas irmãs. Afinal, eu que decidi contar toda a história, se ele resolvesse espalhar e alguém acreditasse, eu decidi arcar com as consequências sozinha. Eu não arrastaria Mika e Kat comigo, mesmo achando que não chegaria nesse ponto. Eu confiava em Adrien.
Assim que eu acabei de falar, houve um tempo de silêncio.
- Posso apenas perguntar uma coisa?- ele perguntou e eu assenti com a cabeça- Por que vocês matam pessoas?
Ah sim, eu não tinha explicado aquilo.
- As sereias servem a Água. Ela, ao contrário do que as pessoas pensam é um ser vivo. E como todos os seres vivos, a Água precisa se alimentar.
   Ele levantou uma das sobrancelhas.
  - Você está me dizendo que a água se alimenta de corpos humanos?
  - Não exatamente- expliquei- a Água se alimenta das almas dos humanos que morrem dentro dela.
   Ele ficou em silêncio.
  - Isso significa que seus pais...
- É- o cortei por me sentir desconfortável falando desse assunto- eles morreram com suas almas sugadas pela Água. Mas foi pelo bem maior.
  - Nós dois temos significados diferentes para "bem maior"- ele murmurou- Mas eu ainda não entendi como você convence alguém a pular de um barco. Não é algo fácil de fazer.
  - Bem, nós sereias podemos cantar em uma frequência capaz de manipular os seres humanos. Bem, na maioria das vezes.
- Como assim, algumas pessoas são imunes?
Neguei.
- Teoricamente, a frequência deveria atingir a todos os seres humanos. Sem excessões. Mas elas não funcionam em um caso.
- Qual- ele perguntou.
- Nós não podemos contrariar os instintos de sobrevivência humana.
- Mas como assim? Vocês não obrigam as pessoas a pularem dos barcos?
- Certo. Mas essa é uma atividade normal do dia a dia humano. Eles sabem que a queda não vai matar eles, até porque os humanos pulam de alturas muito mais altas para o mar por diversão. Se eu chegar para alguém e cantar para eles pularem de um prédio ou para eles se enforcarem com um cinto, eles fazerem isso seria praticamente impossível. Quanto mais o pedido ir contra os instintos de sobrevivência, mais difícil é para as sereias.
- Então vocês conseguem mandar as pessoas pularem, mas não conseguem obriga-las a se afogarem?
- Bem, nós podemos, mas é muito mais difícil.
  - Então como elas se afogam? A maioria das pessoas sabe nadar hoje em dia.
  - Nossa líder consegue manipular a água para dificultar o movimento das pessoas. E nós normalmente fazemos isso em dias mais agitados.
  - Nossa...
  Ele começou a rir.
  - Você está bem?- eu perguntei.
  Ele assentiu.
  - Se isso que você está falando é verdade, eu realmente não estou louco! Você é realmente uma sereia! E me salvou naquele dia!
  - Sim. Não conte isso para ninguém, além de apenas poucas pessoas acreditarem em você, isso pode acabar em nós dois tendo problemas. Entendido?
   Ele assentiu com a cabeça.
   - Pode confiar em mim.
  Ficamos em silêncio por um tempo. Tentei pensar em alguma coisa que eu pudesse falar, mas não consegui pensar em nada.
   - Posso fazer uma última pergunta?
   Voltei meu olhar para seus olhos azuis que refletiam o sol de fim de tarde e assenti com a cabeça.
- Por que você me salvou?
Eu não esperava por aquela pergunta. Olhei para baixo.
- Não sei. Talvez eu me importe mais com você do que você pense.
Quando ergui minha cabeça, ele me beijou. Entrei em choque e não me movi ou correspondi seu beijo. Ele se afastou, meio sem-graça.
- Desculpa. Eu.. devo ter interpretado isso errado. Provavelmente eu deveria ir.
Ele se levantou, mas antes que pudesse ir, eu segurei a sua mão e o impedi.
- Não. Eu apenas me surpreendi. Mas eu não estou reclamando de nada.
Sorri e o puxei para perto, apoiando minhas mãos em seu pescoço. Ele sorriu e segurou minha cintura e nós nos beijamos enquanto o sol ia sumindo no horizonte.

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