Chegamos em Recife às oito da manhã, havíamos pego o avião pouco antes de cinco da manhã e deixamos São Paulo para trás sem muito apreço. Chovia na capital pernambucana, mas não fazia frio, o tempo estava fresco e apesar da chuva agradável.
Rafael nos levou para o Recife Antigo, bairro histórico da cidade, onde fomos recebido por outras seis pessoas em um sobrado amarelo antigo. O casebre era antigo, mas bem cuidado, tinha escadas em madeira polida e assoalho bem conservado, era um sobrado grande, de pé direito alto e vários quartos com janelas grandes que davam para a rua e de onde podíamos ver o caminho para a praça e o Marco Zero. A cidade atrás de nós se erguia em prédios modernos e altos, mas ali até onde a vista alcançava tudo tinha aquele clima histórico e bucólico.
Já tinham um quarto arrumado me esperando, mas surpreenderam-se quando viram que Geff estava comigo, por hora teríamos de nos acomodar juntos, mas Diana, uma das mulheres na casa disse que logo poderia arranjar outro quarto para ele. Nós dispensamos e agradecemos, disse que estava tudo bem, não tínhamos problema em dormir juntos.
Fiquei me perguntando se todos eles eram como eu e Rafael, mas não perguntei, achei que seria indelicado, todos pareciam tão hospitaleiros e acolhedores que eu não quis causar má impressão, nem embaraçar Rafael.
Mais tarde Rafael disse que ali poderíamos voltar a ter uma vida normal, que não precisávamos viver como nômades fugindo o tempo todo, se quisesse poderia terminar a escola e arranjar um trabalho, Geff também. Eu gostei da ideia, confesso que acreditei que tivéssemos de nos esconder, que não poderíamos circular como pessoas normais pelas ruas, que tivesse de viver em isolamento total, mas o que Rafael dizia me tranquilizou, pelo menos um pouco.
Nada de internet ou redes sociais, nada de fotos e passeios sozinho, apesar da liberdade haviam algumas regras. Todos ali tinham funções na casa e empregos formais, com exceção de Diana, que era a proprietária da casa. Eu teria um tempo até me ajeitar, poderia decidir o que fazer com calma, e se precisasse de ajuda a rede de contatos deles me ajudaria.
Eles se chamavam de Volitare, é latim descobri depois, significa flutuante. Eles usavam outros nomes para se identificar também, como Volantes e Gravita, também do latim, mas Volitare era o que mais ouvi eles dizerem.
Diana arranjou roupas para Geff e sapatos, eram de doação mas quase tudo coube nele. Agradecemos e então eu comecei a pensar que talvez Rafael não estivesse mesmo mal intencionado, que estivesse mesmo me ajudando, não parecia que algo ruim acontecesse ali, eram apenas um grupo de pessoas se ajudando, pensar isso fez eu me acalmar.
Eles eram uma rede bem grande com comunicação direta e privada entre as capitais, não eram amadores e sabiam o que estavam fazendo, se dividiam em pequenos grupos em sobrados como aquele por Recife e igualmente nas outras capitais. Poderíamos ter ficado em São Paulo, ou no Rio de Janeiro, mas Rafael tinha algumas desavenças com as coligações do sudeste e Recife era uma cidade mais hospitaleira de modo geral.
Naquela primeira noite em Recife pela primeira vez tive uma conversa normal com Rafael. Ele fora ao meu quarto ver se estava tudo bem e se precisávamos de alguma coisa, quando eu disse que sim, estava tudo bem, e que não, não precisávamos de nada ele pediu um cigarro à Geff e abriu a porta que dava para uma pequena sacada e ficou ali fumando, eu peguei um cigarro também e fui para a sacada com ele.
Ele me contou mais sobre meu pai e sobre meu irmão, era estranho ouvir ele falando da relação extraconjugal de meu pai e na de minha mãe, mas não me surpreendia, talvez por isso eles ainda não se entendiam bem, minha mãe engravidara três vezes para tentar manter o casamento, e sofrera muito com isso. Nenhum dos dois era santo, mas ainda assim eu não conseguia ver meu pai com bons olhos, nada que minha mãe fizesse justificava as reações e atitudes dele.
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VOLITARE | (Romance Fantasia Gay) | COMPLETO
Teen FictionVocê já sonhou que estava voando? Você já sonhou que estava caindo? Guilherme ficou internado durante três meses em um hospital psiquiátrico depois de uma suposta tentativa de suicídio e recorrentes sonhos e visões. Embora os médicos atestassem su...