Quando acordei eles estavam falavam sobre mim. Eu não consegui entender direito o que eles diziam, o barulho do mar abafava a voz deles e enquanto conversavam Lena fazia café, mexia o tempo todo no fogareiro e para compensar o silêncio do dia anterior Augusto não parava de falar por um segundo sequer.
Eles não falavam mal de mim, pelo tom de voz quase paternal de Lena eu podia supor que eles se preocupavam e que independente do que diziam a meu respeito provavelmente era com afeição e carinho. Mas eu me sentia mal com aquilo, eu não conseguia me acostumar ainda com as pessoas falando sobre mim o tempo todo, querendo saber como eu estava, como eu me sentia, era estranho e toda vez que me perguntavam algo pareciam querer tirar da minha boca confissões que eu não sabia se precisava soltar.
Eu não estava triste, eu não me sentia mais sozinho, eu não queria morrer. Mas não existe um jeito certo de dizer essas coisas para as pessoas e fazê-las acreditar, parecia que depois do incidente eu tivesse me tornado uma granada sem o pino, uma espécie de bomba-relógio, sei lá, qualquer coisa assim que pudesse explodir a qualquer momento.
Eles mudaram de assunto assim que me viram saindo da barraca, Lena me deu um bom dia com um sorriso largo e disse que o café estava quase pronto. Geff fumava um cigarro enquanto Jonas contava quantas conchas havia conseguido encontrar na areia da praia, de pé ao lado de Lena, Augusto estava reclamando já do vento frio e de como o sal pinicava sua pele. Soltei um eu avisei para augusto e me sentei ainda sonolento perto deles.
A programação do dia era não fazer coisa alguma, só curtir a preguiça, admirar a paisagem e a solidão, ficar o máximo descansados possível, comer besteiras e falar besteiras também pois no dia seguinte acordaríamos cedo para ir à Ponta Negra e de lá pegar uma trilha um tanto quanto difícil até a Cachoeira do Saco Bravo.
De acordo com que o sol subia no céu o dia ia ficando mais quente, o vento soprava mais ameno e o mar parecia se acalmar também. As ondas ali não eram tão altas, a maré era fraca e era gostoso de se banhar, embora o sal irritasse a pele depois de seca.
Geff quis tentar pescar, mas Lena o dissuadiu a não fazê-lo, não dava para cozinhar peixe no pequeno fogareiro, ninguém parecia disposto a apanhar lenha para uma fogueira e ela começou um discurso comovente sobre matar peixes. É ômega três, Geff interpelou, carne branca, proteína animal, mas Lena embirrou e ele desistiu, afinal ninguém sabia se era permitida a pesca ali, e não pareceu uma boa ideia arriscar.
No final da tarde cansado de ficar sentado ou deitado eu fui caminhar pela praia, de uma ponta até a outra, Lena também estava entediada e foi comigo.
— Não consegui dormir nada bem essa noite — Lena disse enquanto andávamos devagar descalços na areia. — Geff ronca feito um trator e para piorar armamos nossa barraca perto demais da do Jonas, eles pareciam competir durante a noite.
— Sério? — eu perguntei rindo. — Eu não ouvi nada, mas acredito em você. Augusto não conseguiu dormir também, no meio da noite ele foi para minha barraca pedindo socorro.
— Eu quase fiz o mesmo.
— Se quiser fica com minha barraca hoje, sei lá, posso dormir com Geff e você e Augusto podem dormir lá.
— Não é de todo uma má ideia. Augusto fala demais quando tá acordado, mas pelo menos fica em silêncio quando dorme.
— Então combinado, vocês ficam com minha barraca, quando voltarmos eu troco os sacos de dormir e mudo minhas coisas de lugar.
— Você é um fofo, sabia? — ela disse parando e me olhando com aquele sorriso acolhedor que só ela sabia dar.
— Você facilita — eu respondi. — Ontem a noite Guto e eu conversamos um pouco antes de dormir.
VOCÊ ESTÁ LENDO
VOLITARE | (Romance Fantasia Gay) | COMPLETO
Teen FictionVocê já sonhou que estava voando? Você já sonhou que estava caindo? Guilherme ficou internado durante três meses em um hospital psiquiátrico depois de uma suposta tentativa de suicídio e recorrentes sonhos e visões. Embora os médicos atestassem su...