DIONÍSIO DI SAULO
Scoala, Academia Artrópode Artêmesis, Ilha de Artrópota.
13 de abril de 2018
Manhã
Aqui estou eu, sentado em um dos bancos do pátio principal da Academia Artrópode Artêmesis, esperando por Tuski sair de onde o Auto Concelho Artrópode está reunido. Reunido fazendo o que? Jogando baralho, talvez.É realmente revoltante não ter voz. "Adolescente paranoico", eles disseram. Tuski Di Saulo, meu pai, devia me ouvir mais. Ele é um dos Fundadores e me criou com toda a sua dedicação. Como posso confiar nele se ele não confia em mim?
Certo, vou tentar explicar brevemente: os Escorpiões vão fazer outra chacina. Simples. Não vão obedecer a padrões, como se espera. São sujos, são podres, são dissimulados, mas também são inteligentes. São acostumados a viver nas sombras, e gostam disso. Nas sombras de alguém, mais especificamente. E esse alguém é grande. Mas não me dão ouvidos. Mesmo eu sendo um Tropo, sou só o Representante Recruta, aprendiz principal do Tropo Superior, que é Tuski. Só o fato de ser aprendiz dele já poderia me dar moral nessa... Nisso aqui.O Auto Concelho Artrópode é formado pelos Tropos Principais (Alonzo, Úrsula, Kássia, Fred e Benjamin), pelo Tropo Superior Tuski, pela Princesa Ciara, pelo Tropo Verde Mr. Klock e pelos prefeitos de Ciarta e Ártiko (Cidades-Estados de Artrópota), Tyane e Rafaelo, respectivamente. Me impressiona todos pensarem que há realmente um padrão nos ataques. Não há lógica. Parece um absurdo condicionamento...
Temo pelos tamasianos fora de Artrópota. Já não deve ser fácil viver evitando ao máximo o contato com outras pessoas que não sejam tamasianas, ainda têm que viver se escondendo de algo imprevisível. É nossa responsabilidade protegê-los. Eles precisam vir pra Artrópota. Permitir a permanência deles no Mundo Externo foi tolice, na minha opinião. Foi ingênuo. Eles têm armamento tamasiano, mas isso é suficiente? Eles realmente acham que estão protegidos e seguros só pelo fato de terem um armamento de origem compartilhada com os Escorpiões?※※※
Quatro horas. "Apenas" quatro horas. Em quatro horas de reunião, só decidiram que os Escorpiões eram imprevisíveis. Tamasianos temerosos no mundo todo e a morte deles pode ser encarada como um imprevisto. Ao menos estudaram a possibilidade de eu estar certo. Se eu realmente estiver, se não existirem padrões de ataques, o próximo está chegando. Muito mais cruel, muito mais frio.
Papá me vê sentado e provavelmente já imagina o que estou fazendo ali. Ele e Paul são as pessoas mais próximas de uma figura paterna que tenho. Ele vem até mim, e não espero ele chegar para me levantar, ansioso.- Talvez esteja na hora de vocês estudarem mais a fundo aquela minha ideia, papa.
- Dionísio, já conversamos sobre isso. Não é questão de você ser jovem demais. A questão é que já há Tropos no mundo todo cuidando para interceptar ataques. Tem funcionado muito bem.
- Tem funcionado porque não era chegado o tempo de atacar ainda, señor Tuski. Veja: a primeira chacina ocorreu em 2004, onde até a Realeza Tamasiana foi vítima fatal. Deste dia vieram os primeiros Artrópodes formados, que hoje estão como investigadores e Tropos de Linha, os quais se referiu. - Ele começa a andar para sua sala, mas não paro o raciocínio. - A segunda leva de assassinatos foi 7 anos depois, em 2012. Artrópota estava mais preparada para essa e conseguimos salvar mais gente, mas ainda assim o número de vítimas foi alto. Estamos em 2018, e não acho que os Escorpiões vão ter paciência pra esperar os 7 anos. O terceiro ataque está próximo. Emitam um alerta...
- Conversamos mais sobre isso depois, certo? - disse bruscamente, colocando as mãos em meus ombros - Tenho missões em Linha para supervisionar. Vá para casa.
- Tudo bem, mas se lembre que é uma questão pessoal para mim também. Eu ainda estaria no México com meus pais biológicos se não fosse pelos ataques de 2004... Sou grato por ter me acolhido, papa, mas...
- Te entendo, filho, de verdade. Mas não deixe o rancor tomar conta do seu interior... Você é jovem, só tem dezessete anos. Nós vamos resolver tudo e teremos uma vida tranquila, você vai ver. Agora, se me der licença...
Fecho a cara, mas confirmei com um gesto de cabeça. Eu tinha que fazer alguma coisa. Em 2004, os tamasianos foram pegos de surpresa. Trinta filhos já adultos (de 25 a 35 anos) perderam seus pais (25 homicídios, ao todo). Destes trinta, dez supostamente se tornaram Escorpiões por nunca terem sequer conseguido chegar à Artrópota. Os vinte restantes se tornaram Resgatados, e, posteriormente, os primeiros Artrópodes. Depois desse ataque, foi decidido que, para sua segurança, revelar a verdade sobre tudo aos filhos seria melhor. Eles receberam distintivos que serviam como rastreadores e sinais de emergência, que foram instalados em colares, anéis, brincos, celulares... Tudo da forma mais discreta possível. Jovens adultos (20 a 26 anos) já teriam maturidade para lidar com possíveis perdas. Assim, em 2012, aconteceu. Quando o dia chegou, 21 filhos das 35 vítimas ativaram o sinal, e assim foram trazidos para Artrópota. Os demais foram, infelizmente, capturados por Escorpiões. As faixas etárias dos filhos dos descendentes diminuiu e o tempo se tornou imprevisível. Tenho motivos para acreditar que o próximo ataque não irá demorar. Eu posso evitar mortes. Ou salvar mais descendentes tamasianos das ágeis pinças dos Escorpiões, mas não sozinho. Tenho que fazer alguma coisa... E se eu falasse com Alonzo? Tuski certamente ouviria seu braço-direito aqui em Artrópota.
Gostaria que Paul, filho biológico de Tuski, estivesse aqui. Ele ficaria do meu lado, me compreenderia. Foi o Tropo Batedor que me encontrou na Cidade do México quando eu tinha apenas 2 anos e me trouxe para Artrópota, em 2004. Desde então vivo aqui, sem nunca ter retornado ao Mundo Externo. Paul tinha 19 anos quando me encontrou e acabou se apegando a mim numa relação de irmãos. Por querer passar mais tempo com esse novo irmão e por não ter me entregado para simplesmente ser criado solto em Artrópota, Paul acabou se afastando das atividades artrópodes por um tempo, mas retornou ao campo em 2012, no segundo ataque Escorpião. Depois ele foi promovido a investigador e hoje vive no Mundo Externo. De Tuski veio o apoio para cuidar de mim e de todas as suas outras responsabilidades que eventualmente teria. Inclusive, Tuski me adotou e hoje vivemos juntos em seu apartamento. Já a mãe de Paul, Senhora Tagmus, sempre desaprovou essa adoção. Nunca fez questão de disfarçar o olhar enojado que lança para mim sempre que me vê. Ela cuida da parte administrativa de Artêmesis: a quantidade de alimento que a escola necessita receber quinzenalmente de Élopo Norte, a supervisão dos alunos, o controle de gastos... Enfim, a parte chata é com ela. Há também seu outro filho, Ruben, gêmeo de Paul, que vive em Tâmasus como Soldado Tamasiano.
Tarde
Volto para casa, no centro de Ártico, para me arrumar. Tenho um encontro marcado com minha namorada, América. Somos amigos de infância desde que cheguei aqui. Seus pais são uns dos poucos tamasianos que não fugiram para o Mundo Externo durante a tentativa de invasão dos Escorpiões em Artrópota. Isso aconteceu porque a Princesa Louise e o Príncipe Dériko II iam ter seu primeiro filho e para salvarem seu sangue, tiveram que fugir para o Mundo Externo, mas alguns aproveitaram a situação conflituosa de quase uma guerra dentro de Artrópota para se aventurarem fora das barreiras. Não foram trazidos de volta para cá por terem tomado sua decisão livremente, e os governantes da Ilha não queriam impor nada. Esses tamasianos que fugiram foram, mais tarde, os mortos pelos Escorpiões. Ainda assim, atualmente, há alguns que vivem em várias regiões do mundo de forma teimosa e inconsequente.América detesta toda essa situação e sempre reclama do meu envolvimento nesses assuntos. Ultimamente eu tenho pensado bastante em me tornar um Artrópode - soldado de Artrópota -, desempenhando a função de Investigador. Essa minha ideia sempre desgasta muito nossa relação, mas não estou disposto a abrir mão disso e América sabe disso.
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Artrópota: Árvore-Mármore
RandomO que pode dar errado no paraíso? Há milênios, um grande reino com tecnologia muito a frente do seu tempo foi criado no interior da Romênia com o intuito de guardar as Grandes Riquezas da Terra. Batizado como Tâmasus, esse recanto que outr...