14. A Flecha Lançada Não Pode Retornar

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RAINHA KIARA

Castelo Prime T, Tâmasus, Romênia.
29 de janeiro de 1981

Manhã
Hoje meus filhos completam 25 anos de idade biológica, e é uma data mais que especial. Os efeitos da idade, por mais que discretos, começam a aparecer em Dériko e eu, então há alguns anos, decidimos que o uso do Vital começaria em doses progressivas a partir dos 25 anos de um usuário diretamente ligado à Coroa. Há quase um mês uma cerimônia que promete ser marcante, embora discreta, está sendo preparada, e também será para Eleonor, Tuski e Alonzo, mesmo que esse último já tenha 26.

As coisas mudaram muito por aqui nesse tempo, a começar pela população tamasiana. Foi criada uma vacina com base em Timpre para ser distribuída entre as demais pessoas a fim de compartilhar os benefícios desse minério com todos de forma justa. Aos já adultos, a dose é dupla e é tomada uma vez por ano, durante dois anos (o que já ocorreu). Aos recém nascidos é aplicada uma dose única que servirá para a vida toda. O Timpre se desenvolve no organismo, o que aflora as capacidades físicas e intelectuais do usuário com o devido estímulo. Lembrando que, mesmo contra a vontade da maioria, a vacina também foi distribuída e bem aceita em Scorpion Place.

Já na minha família, houve uma partida: Elizabeth se foi para o Mundo Externo, num convento na França. Não conseguiu deixar para trás os fantasmas de seu passado, mesmo tendo uma filha para cuidar. Nunca os revelou a ninguém, nem mesmo a mim. Ninguém, além de Elizabeth, sabe quem é o pai de Eleonor e ela já percebeu a relevância que isso tem em sua vida. Vive chorando pelos cantos, isolada, pensativa... Se sente rejeitada e insuficiente, mas o namoro com Tuski parece animá-la por uns instantes. Minha irmã nos envia cartas sempre que pode (o que é raro, levando em conta a distância e a insegurança desse meio para Tâmasus), descrevendo como é ser madre e o convívio religioso. Claro, é fachada, mas ela aparentemente está fazendo muito bem o personagem. Ensina enfermagem lá também, o que pode ter alguma serventia para nós algum dia. Sinto saudades dela, mas sei que sua permanência fora das barreiras de Tâmasus é saudável para todos nós.

Minhas crianças cresceram, se transformaram, são adultos. Riko se tornou bem mais responsável e visionário. Ele e os irmãos tomaram conhecimento do Projeto Artrópota e o estudam constantemente. É um ótimo estrategista e empunha sua espada como poucos. Sempre passeia pelas ruas de Tâmasus para conhecer pessoas novas, lugares novos... Mas sempre distante de Scorpion Place. Elói, por outro lado, parece ter perdido a curiosidade que costumava ter. Permanece quase sempre fechado em pensamentos, exceto com nós da família. Mal sai do Castelo e se dedica fielmente aos assuntos externos, como a partida de Elizabeth e a compra se materiais de fora, principalmente culturais, além da conservação de nosso porto na Grécia. O temos secretamente para o caso de alguma necessidade especial. Treinou arco e flecha com Alonzo por todo esse tempo e os dois se tornaram extremamente próximos. Ciara é bem mais receptiva e simpática: está uma bela moça, todos se tornaram muito belos, como o pai. Não há um só funcionário do Castelo que não tenha se encantado pelo seu acolhedor "bom dia" de cada manhã. Ela tem a graça de que fui privada e espero que jamais perca isso. Tuski desenvolveu o espírito de forte liderança do pai e a empatia da mãe, tornando-se um perfeito mediador. Sempre busca agradar Eleonor quando a percebe em seus momentos mais tristes e sou grata a isso. Não sei se seria algo que conseguiria sozinha. Alonzo foi aprendiz do melhor arqueiro de Tâmasus e faz coisas com seu equipamento que antes pareciam impossíveis. Um rapaz gentil, atencioso e tranquilo, evita atritos com quem quer que seja. Imagino se ele seria assim se tivesse continuado em Scorpion Place... Sempre passamos horas conversando sobre nada e sobre tudo, pois meu marido está quase sempre metido nos projetos da construção se Artrópota. Também pudera: duas cidades-estados para serem urbanizadas da maneira mais correta possível, além de Artêmesis e Élopo Norte. Élopo, a floresta, permanecerá intocada, e é melhor que seja assim. O projeto está indo como planejado e em breve devemos partir. Dériko mudou com o passar dos anos, e eu também. Isso é ótimo, pois o problema estaria na mesmice mesmo após 90 anos de convivência. Aprendemos a nos transformar e nos completamos assim. Hoje, somos mais amigos do que marido e mulher, mas não vejo isso como algo a se temer. O companheirismo, respeito e consideração não acabaram. Mas, claro, ainda há alguns traços da vida de casados.

Artrópota: Árvore-MármoreOnde histórias criam vida. Descubra agora