06. ...Rei Posto

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KIARA TAGMUS

Castelo Prime T, Tâmasus, Romênia.
10 de abril de 1900

Manhã
Ouço o fervor do povo lá em baixo, do lado de fora dos muros do castelo. Eu sou como eles. Muito deles me conhecem, e eu os conheço de muito tempo também. Dez anos atrás, eu não tinha a menor ambição de me tornar rainha. Queria sim abraçar o mundo, conhecer tudo o que há depois da barreira. Agora, minha responsabilidade se resume a tudo que está do lado de dentro. De dentro da barreira, de dentro do nosso pequeno mundo. Agora, este mundo, Tâmasus, me abraça. Me guarda. Me esconde. Nos esconde. Agora eu serei a Rainha Kiara I.

Meu marido está ansioso. Também pudera, acaba de enfrentar a morte do único parente consanguíneo que lhe restava, agora tem que ser coroado. Normalmente uma nova coroação só ocorreria meses depois da morte do antigo monarca, mas o povo cobra um novo líder e os assuntos de Tâmasus não podem esperar por mais tempo pela recuperação de um homem enlutado. Os preparativos já estão sendo feitos: banquetes com pratos variados, atrações de música e dança. Uma verdadeira festa em homenagem ao rei que Elói III foi, ao rei que Dériko I se tornará e, claro, à rainha que vou ser.

Gosto deste castelo movimentado assim. Gosto dessa correria e preocupação em nos agradar. "Tudo tem que ser ao gosto de suas futuras Majestades!", dizia o Cerimonialista Real passando pela cozinha, pelos salões, e sempre que dizia isso aparentemente era pra colocar medo nos funcionários e funcionárias. Não me importa nada disso, na verdade. Só quero ver meu Dériko bem.
Subo até nosso quarto e o vejo andando de um lado para outro ensaiando seu discurso. Está nervoso demais e não me viu entrar. Vou até ele e o abraço por trás passando minhas mãos pelo seu peitoral. Esse nervosismo não irá ajudá-lo, nunca ajuda. Eu também estou nervosa, ansiosa e temerosa, mas não posso deixar transparecer isso a ele, não nesse momento. Não hoje.

- Está ouvindo toda essa gente lá fora? Não é nem metade de Tâmasus e é uma multidão. Vão chegar mais e mais conforme a aproximação do horário da coroação...

- Vai ficar tudo bem. Já está, na verdade - digo, o abraçando mais forte. - Não tente reprimir o que está sentindo aqui, não para mim. Mas faça o possível para se manter firme diante deles. Já pensou no que falar?

- Algo parecido com o discurso dos outros reis que Tâmasus já teve...

- Eles estão cansados disso, não acha? A mesmice de sempre... Terá uma reação mais positiva deles se for original. Só... Seja você mesmo, como está sendo aqui. Sei que não é fácil, mas esqueça o nervosismo por cinco minutos e ficará tudo bem. Não precisa ser algo de longas palavras, apenas seja objetivo. Qualquer coisa, olhe para o horizonte ou para mim. Estarei ao seu lado. Sempre.

Ele me encara. Gosto quando faz isso, como uma viajem dez anos no passado, pra dentro daquela gruta. Ainda uso por debaixo das roupas Reais o lindo colar que Dériko fez para mim, tendo como pedra principal a junção de duas ametistas, uma verde e uma azul unidas formando um coração humano. Já ele, usa um anel com o mesmo modelo de pedra do meu colar. Um conjunto como lembrança do nosso primeiro ano juntos. Lembro como se fosse hoje: nós dois naquela gruta, eu deitada em seu peito, quando ele se levanta, estende a mão como forma de convite para fazer o mesmo, coloca a mão em um dos bolsos e tira uma pequena caixa.

- Hoje faz um ano do nosso primeiro encontro, nosso primeiro beijo... Fomos rápido demais, mas, depois de esse tempo juntos, percebo que estaremos ligados por nossas almas para sempre, e... - Estava com as mãos trêmulas de nervosismo, mas ainda assim se ajoelha diante de mim - Sei que ainda temos que manter nosso relacionamento escondido por conta de meu pai, mas considere isso com um símbolo sincero de nossa união. Escolha um.

Artrópota: Árvore-MármoreOnde histórias criam vida. Descubra agora