Só vi Júnior correr para a porta do trailer pela qual entramos e trancá-la com calma, sem fazer barulho. Depois, apontou para a porta oposta.
— Vem comigo — sussurrou, pegando minha mão. — Seja discreto.
Vish, Maria... Normalmente, nas vezes em que meus amigos da faculdade pediam para que eu fosse discreto ao olhar para um garoto gato no corredor do nosso bloco, eu só faltava chegar perto dele, segurar seu braço e perguntar "estão falando desse rapaz aqui?".
As vozes no exterior cresceram mais. Não demorou muito para que eu começasse a me sentir como se estivesse participando de um crime. Ai, caramba. Eu deveria ter trazido meu taco de beisebol...
— Será que ele tá aí? — perguntou outro rapaz da gangue, pois a voz era nova e feia, meio anasalada.
— Tem que estar. A luz tá ligada.
Júnior abriu bem lentamente a porta dois, pegando a chave, e me conduziu para fora do trailer. Do outro lado, só havia árvores e mais árvores. A escuridão ganhava força à medida que a distância se tornava maior.
— Por que a gente não se escondeu debaixo da cama? — indaguei num sussurro.
— Ela é baixa demais — ele me respondeu em tom igualitário, trancando a porta com a mesma cautela que eu usava ao entrar no quintal dos meus colegas de infância para pegar "emprestado" uma bola de vôlei. Aspas, porque nunca a devolvia. — Não caberíamos lá.
Assenti. Algo me informou que ele já tentou fazer isso antes.
Ouvimos uma batida na janela do outro lado.
— Júnior?! — chamou o Zé Droguinha. — Cadê você, mano?!
— Vou ver lá do outro lado — anunciou a voz anasalada.
Ih, ferrou... Até ergui minhas mãos em um gesto de rendição e comecei a trabalhar em algumas formas de negociar com a gangue, mas parei de fazer isso quando Júnior me olhou como se eu fosse louco.
— Não. Vem. — Ele me puxou, discordando do meu pensamento, e me orientou para a floresta. — Não faça barulho, por favor.
Ele estava me pedindo muito. Entretanto, como se tratava de um ato de fuga, fiz o meu melhor, apressando meus passos com ele em direção a algumas das árvores à nossa frente. Júnior teve bem mais sucesso do que a mim, pois escolheu um tronco que o encobria perfeitamente, enquanto que eu, mais perdido que um bêbado em uma casa de espelhos em um circo, tentava achar outra árvore tão espessa quanto a dele. Todas elas me pareciam muito finas.
— Ei! — Júnior sussurrou, me chamando. Sua mão estava estendida na minha direção da mesma forma que Jack, em "Titanic", fazia ao chamar a Rose. Que romântico... A diferença era que Júnior e eu morreríamos baleados, e não congelados. — Rápido!
Sem hesitar, corri para perto dele, que me puxou com agilidade e rapidez suficientes para me fazer perder o ar. Caraca! Será que ele é assim no sexo também?
— Desculpa — falei bem baixinho. — Os crimes que eu cometia na escola não envolviam traficantes.
— Shhh. — Ele levou o indicador à minha boca bonita, calando-me. — Agora não. Consegue ficar em silêncio por um minuto?
Não.
— Sim.
Seu olhar malandro respondeu um "ótimo", e ele tirou o dedo dos meus lábios. Percebi que estávamos tão perto um do outro que nossos peitos se tocavam. Mais do que isso: nossas respirações se colidiam. Seria muito clichê beijá-lo agora, já que minha oportunidade anterior foi jogada no lixo?
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COMO [NÃO] SER UM BABÁ
RomanceSó existe uma coisa que Demétrius Esteves detesta mais do que crianças: cuidar de crianças. Para compensar o dano causado por ter arremessado o carro em um poste, ele agora precisa trilhar o que aparentemente seria o seu pior pesadelo: bancar o babá...