Epílogo | O retorno

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[Segunda-feira, 16 de fevereiro de 2021]

Acabei não fazendo o que disse que ia fazer na minha formatura, Ariel: não peguei o canudo, na hora da cerimônia, e destinei meus agradecimentos a mim mesmo. Só fiquei calado quando os professores compostos na mesa me entregaram o certificado. Para ser franco, senti que eu seria criticado se me posicionasse na tribuna e dissesse "gostaria de agradecer à única pessoa que me ajudou nessa árdua jornada de graduação: eu".

Consegui me controlar.

Havia muita gente no auditório onde estava rolando minha formatura. Tinha feiticeiro no meio, tinha prostituição, tem mentira e outras coisas mais. Deixando de lado o meu lado piadista, Ariel, vieram meus pais, minha vó, Junior, sua mãe (Beatriz) e os irmãos. Assim que vi Matheus e Brenda sentados em uma fileira, ao lado do meu namorado, nem acreditei. Depois de ter passado pela sessão de fotos e ter me sentido como uma celebridade rica e bela (a parte do "rica" se concretizaria no futuro, uma vez que eu já era belo), acenei para os gêmeos, e ambos, com suas mãozinhas, devolveram a atitude. Como é bom revê-los!

Sentei-me na cadeira ao lado de Juliano, que me lançou um sorriso orgulhoso, e esperei que todo o restante da cerimônia terminasse. Aquela chatice de agradecimentos dos docentes que compunham a mesa veio, seguida pelas palavras finais do chefe do nosso núcleo (o de Humanas) e pelas felicitações para nós, formandos. Ai, que tédio. Daqui a pouco serei expulso de novo por abrir outro pornô gay.

Eu sabia que era um dia importante, Ariel, mas meu interior não se adaptava muito a palestras, talvez porque meus pais, quando brigavam comigo, praticamente me davam sermões que pareciam não ter fim. Mas, em todo caso, não poderia reclamar da falação deles. Passar alguns minutos escutando repetidos "você não sabe que é errado jogar sua colega na piscina apenas por achar que ela é uma piranha?" do que apanhar.

Depois que toda a papagaiada chegou ao fim, o pessoal deu alguns gritos de comemoração (oh, gente, não precisava... sei que sou um charme), e todos nós jogamos os chapéus de formatura para cima. Esse foi um dos momentos da noite onde mais fiquei feliz.

— Ai, finalmente! Já estava quase indo à tribuna encerrar o discurso por conta própria — resmunguei, e uma aluna da minha sala que eu detestava arregalou os olhos para mim. Está olhando o quê, Ratatouille?

— Amigo — Juliano disse, abraçando-me. — Parabéns para nós!

Aleluia que apareceu alguém que eu não sentia vontade de guardar num potinho grande — o caixão, claro.

— Para você também, gato. Estou contente por termos chegado até o fim juntos.

Camila veio logo em seguida, rodeando seus braços em mim também. Realmente, o nosso trio de amizade foi formado desde que nos conhecemos e, desde então, nunca foi quebrado. O grupo nunca foi aumentado — graças a Deus, pois as pessoas da minha sala eram tão desanimadas quanto eu era nas vezes em que meus pais me pediam para jogar o lixo de casa lá na lixeira.

— Parabéns, amor — Camila disse para mim, me soltando.

— Igualmente — sorri com entusiasmo. — Você está radiante. — É como se eu tivesse aberto a câmera frontal do meu celular.

— É a maquiagem — ela brincou. — Em seguida, olhando por cima dos meus ombros, acenou para alguém. — Vou ali rapidinho.

— Okay.

Juliano, a essa altura, já tinha partido para um grupo de amigos tão ligeiramente quanto minha mania de fugir daquelas pessoas que vendiam chips das operadoras nas ruas. Aproveitei, então, para fazer o mesmo e ir para a fileira onde estavam as pessoas que me conheciam — aquelas que dariam a vida por mim (não que isso fosse uma atitude difícil de se fazer).

COMO [NÃO] SER UM BABÁOnde histórias criam vida. Descubra agora