27 | O valor do ser humano

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[Segunda-feira, 11 de janeiro de 2021]

Fui à casa de Estelar depois do meu turno na segunda-feira. Como meu carro já estava em mãos, tudo ficava mais fácil, e aquela sensação de poder absoluto e dominador voltava a atingir meu interior todas as vezes que eu estava sob o controle do volante. Só havia um lugar que eu me deixava ser comandado: na cama. Fora dela, o modo ativo era acionado.

— Então você aceitou mesmo a proposta do ricaço lá? — perguntei, sentando na cama de Estelar.

Ela, toda feliz, fez que sim.

— A ideia inicial é manter o namoro com Douglas por um mês — explicou enquanto dobrava suas roupas dentro da mala que a acompanharia no próximo sábado. — Se funcionar, poderemos continuar o lance por mais tempo. Vai depender da nossa relação. Ele está torcendo para que dê certo, e acho que eu também estou.

Fiquei perplexo.

— Não entendo. Você vai a um programa, conhece esse tal de Davi...

— Douglas.

Douglas. Aí ele fica apaixonado por você e te propõe um mundo luxuoso — fui citando. — Meu Deus, o máximo que eu ganhava dos meus namorados era um vale-refeição em um restaurante de comida ruim! Ou uma caixa de bombons, mas aí eu a jogava no lixo na maioria das vezes, pois ela quase nunca era da Nestlé. — Pus o indicador nos lábios. — Ah! Teve uma vez, no meu aniversário, que Caio, um dos meus namorados, contratou um daqueles carros que ti­nham uma enorme caixa de som que cantava para­béns no meio da rua para todo mundo escutar, mas achei isso tão brega que me escondi dentro de casa e fingi que o aniversariante não era eu.

Ela riu.

— Não sei por que ainda fico surpresa.

— Em todo caso, nenhum deles me deu uma viagem para a Inglaterra, como você ganhou — terminei, encantado. — Estou feliz por você, meu amor, e juro que não é como nas vezes em que eu dizia "parabéns por ter ganhado uma pista do Hot Wheels" para meu colega na infância, sendo que, por dentro, levado pela inveja, eu desejava que ela quebrasse no dia seguinte. — Suspirei, ignorando esse dia triste. Triste porque não consegui roubar a pista. — Eu estou feliz de verdade por estar indo viajar. Você merece o mundo.

Seus olhos castanhos por trás dos óculos brilharam. Então, evidentemente emocionada, Estelar veio para perto de mim e me envolveu com um abraço tão quente quanto seria a futura casa da minha vizinha Rosângela — o inferno.

— Obrigada, querido. — Ela beijou meu cabelo. — Vou sentir sua falta quando estiver viajando. Você é maravilhoso.

— Concordo.

Estelar revirou os olhos, mas riu.

— Eu também estou feliz por você — ela disse, voltando a rebuscar no guarda-roupa as vestimentas que levaria na mala.

— Pelo quê?

— Por ter superado Diego.

Ah. Como eu iria imaginar que, de repente, ela fosse querer conversar sobre coisas satânicas, né, Ariel?

— Saber que você não sofreu por ele me deixa mais aliviada — Estelar acrescentou. — Ainda bem que Júnior apareceu para você.

Deitei-me na cama, de modo que pudesse encarar o teto laranja do quarto da minha amiga.

— Júnior, definitivamente, não é como Diego — murmurei, tomando posse da verdade irrefutável. — Meu futuro namorado gosta do meu humor... e ele tem o olhar mais sublime que já vi. Além disso, diferentemente do que acontecia quando eu transava com Diego, Júnior consegue me fazer querer andar de muletas depois do sexo.

COMO [NÃO] SER UM BABÁOnde histórias criam vida. Descubra agora