Sozinha e desesperada, eu corria pelas ruas sujas e mal iluminadas de Birmingham. O ar frio e saturado pela umidade não parecia suficiente para meus pulmões, a respiração descontrolada clamava por mais oxigênio. Os sentidos, um tanto quanto dormentes pelo drink de gin bebido mais cedo, obrigaram-se a alertar com a adrenalina liberada no sangue. Meu tornozelo direito, já inchando, latejava de dor depois de eu ter pisado em falso alguns metros atrás no percurso. Dois homens de estatura média e comportamento primitivo haviam me encurralado em um beco logo que saíra de um pub. Contudo, por sorte, a embriaguez não fora tanta a ponto de impedir-me de conseguir liberdade. Com um chute bem dado no meio das pernas de um e um soco no nariz do outro, eu ganhara tempo para fugir, mesmo que não o suficiente para que desistissem. Ambos me perseguiam insistentemente e a passos largos, cheios de raiva.
Meu delicado vestido de seda bege estava roto. Um pequeno rasgo na costura bem na lateral da perna dava-me mais conforto para movimentação, mas as repugnantes marcas de dedos sujos no tecido ao redor seios serviam de evidência. A sandália de salto fino médio, escolhida a dedo para trazer elegância, jamais se imaginaria sendo descartada em uma sarjeta lamacenta qualquer durante minha fuga. Pés de pele fina pisavam nus as pedras de brita pontiagudas e as irregularidades ásperas das ruas, com força, até solarem um sapato de sangue.
O vento, um tanto quanto intenso daquela noite, excepcional à época de verão inglês, batia contra a pele do corpo, secando as lágrimas e o suor antes mesmo que escorressem, levando consigo aos poucos o calor da pele. A exaustão tornava-se maior a cada passo da corrida. Nenhuma alma humana ousara aventurar-se naquela noite, eu estava sem socorro e me amaldiçoava internamente por ter saído de casa sem minha pistola como proteção.
A cada pouco, olhava para trás esperançosa de que não os veria mais ao meu encalço, mas eles sempre estavam. Eu, por mais que estivesse me esforçando ao máximo, não ganhava mais do que alguns metros de vantagem. O desespero já tomava conta.
E foi em um segundo desses desvios de atenção que senti meu corpo chocar-se contra alguém na esquina. O baque fora grande o suficiente para que me lançasse ao chão, ralando meus cotovelos sem piedade pelo asfalto e enchendo o que sobrara do meu vestido com fuligem. Amedrontada, mantive os olhos cerrados por um ou dois segundos, tentando recuperar o folego enquanto rezava fervorosamente a um Deus qualquer que não me permitisse ser alcançada pelos dois perseguidores. Quando finalmente juntei coragem suficiente para encarar o que estava por vir, observei, ainda que embaçado por lágrimas, duas figuras, ainda mais altas vistas do chão, que me encaravam empunhando armas.
Outros dois homens, estes trajando capas e ternos muito mais bem recortados. Expressões duras como mármore, olhos do mesmo azul. Um deles, apontava a arma para mim, o outro, para os bárbaros que antes me seguiam.
Estremeci involuntariamente, assustada, ao som de dois tiros sendo disparados em direção aos meus abusadores, vendo-os bater em retirada covardemente sem um arranhão sequer. Certamente não estavam armados para revidar. Estava grata por terem me livrado, mas não menos desconfiada. Nada me garantia de que eu não seria a próxima vítima das balas, e, sem uma arma, não poderia ir longe sem ter o corpo perfurado caso também estivessem de más intenções. Coloquei-me sentada sem movimentos bruscos, usando a parte superior das mãos para secar algumas lágrimas da bochecha enquanto fitava os dois rapazes desconfiada e ainda muito exausta fisicamente.
-Abaixe a arma, John. A moça está desarmada. - disse um deles, aparentava ser o mais velho.
John não se moveu. Apesar da aparência jovem e angelical, uma expressão perigosa cravada em seu rosto metia medo em quem olhasse. A arma também não se moveu.
-Diga seu nome.– ordenou com a voz firme.
-Alexandra. - minha pronúncia saira não intencionalmente mais baixa do que o normal, tremulando com medo.
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Blind Love || John Shelby
FanfictionAlexandra Marie Mills era uma jovem que vivia confortavelmente em Londres até que, em uma esquina, o destino a expusesse a realidade das gangues inglesas que despontaram ao fim do século XIX e início do século XX. Mesmo que tal cenário sempre a espr...