XXIX

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-John, onde você esteve esses dias?

-Londres.

Respondeu sem desviar o rosto do espelho do quarto compartilhado enquanto abotoava as mangas de sua camisa branca. O cheiro fresco de banho recém tomado e colônia perfumavam o ar do ambiente. Alexandra, já trocada em um vestido preto de tecido fino e bordado que abraçava sua silhueta em curvas sinuosas, há pouco terminara o penteado de tranças que organizavam elegantemente seus cabelos marrom acobreados. Seus olhos verdes, pintados sutilmente em maquiagem neutra, brilhavam como os de um gato em noite de lua cheia, todavia, seu batom carmim, propositalmente escolhido, era quem roubava a cena. Era impossível que um homem sequer que a admirasse não desejasse seus lábios.

     Fingindo-se de entediada, a moça observava seu marido de braços cruzados e corpo apoiado no batente da porta do banheiro da suíte. Apesar do olhar incessante sobre os ombros de seu amante, como se sua beleza ainda a enfeitiçasse, um turbilhão de pensamentos devaneavam sobre onde ele teria estado durante seus dias de ausência. A lembrança da pequena mácula rubra no tecido da roupa de John fazia-lhe acelerar seu pulso em raiva. Por mais que seu coração quisesse negar a realidade, a razão e as provas o acusavam impiedosamente milhões de vezes.

Cada uma das palavras que ele proferia lhe soavam vazias, ela não mais acreditava piamente em nenhuma promessa ou aceitava respostas. Ao que tudo indicava, estava sendo enganada pelo homem que amava.

-Londres. Como nas últimas três vezes. Certo? - constatou, relembrando as explicações em frases vagas previamente dadas à ela pelo marido enquanto analisava friamente os movimentos de John, tentando captar alguma mentira pela comunicação não verbal.

-Exatamente, Alex. Como eu já disse. - respondeu o loiro, dando alguns passos em sua direção e beijando rapidamente uma de suas bochechas antes de entrar no banheiro da suíte.

Ela afastou-se, dando-lhe privacidade. A pele de seu rosto tocada pelos lábios parecia arder em rejeição. Seus olhos encheram-se de água assim que a porta fechou-se suavemente, mas nenhuma ousou escorrer e estragar a obra de arte em rouge, pó de arroz e rímel em seu rosto.

Alexandra estava cansada. Os últimos meses haviam sido marcados por uma incansável busca por respostas à perguntas que amontoavam-se cada vez mais. Sua intuição, inquieta, sussurrava que algo estava errado e o fato de John a excluir cada vez mais dos detalhes alimentava sua desconfiança. Escondia-lhe a verdade sem pudor algum, afastando-a com portas trancadas, omissões, sumiços durante finais de semana ou feriados tão descompromissados que cancelavam reuniões familiares com apenas uma singela nota rabiscada em caligrafia apressada ...

"Desculpe. Não me espere voltar para o jantar, estou fora da cidade com os rapazes resolvendo negócios por alguns dias.
John. "

E assim, tão facilmente, ele desaparecia por quanto tempo fosse necessário, sem maiores especificações de causa e tempo. Dois capatazes eram colocados nos arredores para proteção durante a saída dos três irmãos Shelby da cidade. Para a escolta da família de John: um na porta, outros dois em cada esquina da rua e mais alguns olheiros que acompanhavam as crianças de longe até a escola. Apesar de tudo isso, Alex não sentia-se segura. Não era como se John estivesse ali, tão perto na cama que uma esticada de braço tocaria sua pele. Ele resmungaria, sonolento, e retorceria seu corpo todo pra perguntar se estava tudo bem.

     Os dias caíram na rotina. Alexandra balanceava seu tempo entre trabalhar com Polly no escritório de apostas, estudar e dar atenção à cinco crianças que passavam maior parte dos dias sentindo falta de seu pai. Pobres pequenos, ao encontrarem com John em casa, alvoroçavam-se, disputando cada qual pela sua fatia de atenção.

Blind Love || John ShelbyOnde histórias criam vida. Descubra agora