Antes mesmo de abrir os olhos senti o desconforto dos meus ossos e músculos por estarem sobre uma superfície fria e dura. O cheiro de mofo era proeminente, e assim que finalmente consegui abrir os olhos estranhei o fato de feixe de luz algum te-los incomodado.Obriguei-me a rolar para o outro lado, percebendo o único e fino relance de claridade proveniente do que parecia ser a fresta inferior de uma pesada porta de ferro.
Sentei-me rápido demais, fazendo com que minha visão do filete iluminado apagasse por alguns instantes e senti-me no mesmo momento como se meu corpo pesasse mais do que eu pudesse suportar. O chão parecia puxar-me com magnetismo.
Apoiei minha cabeça nas palmas das mãos como se aquilo fosse pará-la de girar ou fazer com que minha visão turva voltasse ao foco. Meu estômago revirou-se em um sentimento nauseante que logo me subiu pela garganta, dando-me tempo apenas para segurar o cabelo antes de esvaziar tudo ali mesmo.
O cheiro azedo e o nojo que me invadiram fizeram-me querer vomitar mais, mas me afastei em direção à porta até encostar-me nela, com os olhos ainda lacrimejando pela sensação.
Permaneci em silêncio por algum tempo tentando me recompor, queria lembrar como fora parar ali. Algumas lembranças confusas e fragmentadas teimavam em emergir fora de ordem, intercaladas pela não reminiscência, como peças de um quebra cabeça a ser montado. Me levaram para um carro. Tudo escuro. John estava ficando para trás. Alguém me carregava. Tudo escuro. Alguém me segurava firmemente enquanto eu me debatia. Tudo escuro. Forçavam-me a beber algo amargo de um cantil cor de bronze. Tudo escuro.
Fiquei ali tentando encaixar os fatos, ainda drogada pelo que haviam, muito possivelmente, me forçado a beber. De repente, algo clicou em meu pensamento. Minhas mãos imediatamente procuraram pelo tecido leve e liso da seda esmeralda em meu vestido de festa. Mas ao contrário, tocaram algo mais áspero, feito de algodão. Alguém havia trocado minhas roupas.
Mil pensamentos dispararam em meu cérebro, junto com o sentimento de repulsa ao pensar que algum daqueles homens poderiam ter me tocado nua. No escuro, coloquei a mão sobre a boca para abafar um soluço antes de disparar em choro. Deixei que todas as lágrimas caíssem e todos os soluços fossem ouvidos por cada canto daquele lugar, até que enfim cessassem. Sentia minha garganta seca, de uma sede mais forte do que eu jamais sentira antes.
Vi de esguio uma sombra mover-se por baixo da porta e, aproveitando minha possível única oportunidade do dia, juntei forças para, custosamente, dizer em palavras secas e pouco audíveis após dar dois toques no metal.
-Alguém aí? Por favor...posso ter um pouco de água?
Não houve resposta. Então decidi tentar mais uma vez. Poucos segundos depois, houveram alguns estalos e finalmente uma pequena porta abriu-se na parte superior da maior. Eu não podia ver quem falava, mas ouvi uma voz grave debochar:
-Então a princesa enfim acordou?
Estremeci internamente ao ouvir o apelido "princesa", aquele homem o pronunciava de certa forma a deixar transparecer um sentimento que me causava repugnância. Era tão diferente quando proferida por John...
-Estou com muita sede, por favor.
-Seu jantar é às sete, espere. Não posso fazer nada, são a regras. - respondeu grosseiramente.
-E que horas são?
-Duas da tarde. Perdeu o horário do almoço.
-Eu imploro, mesmo que seja menos de um copo...tenho muita sede.
-Não há nada que eu possa fazer. Agora, cale a boca e me deixe trabalhar. - gritou e bateu a portinha, fechando-a.
️Muito cansada para insistir, tinha tantas perguntas sem resposta: Onde estava? Há quanto tempo? E o principal: como sairia dali sozinha?
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Blind Love || John Shelby
FanfictionAlexandra Marie Mills era uma jovem que vivia confortavelmente em Londres até que, em uma esquina, o destino a expusesse a realidade das gangues inglesas que despontaram ao fim do século XIX e início do século XX. Mesmo que tal cenário sempre a espr...