Era uma casa de esquina simples e empoeirada, que se destacava por não apresentar qualquer cheiro de podridão dentro dela — uma mudança bem-vinda. Hector nos guiou de forma que ficássemos fora da vista do pátio da escola e entramos pelo portão de carros.
Como Hector e Alex descreveram, era afastada das avenidas principais, com ruas de paralelepipedos esburacadas. Haviam algumas residências por perto mas a maior parte dos lotes tratava-se de terrenos baldios sem uso. Diferente da escola onde começamos o nosso pesadelo, aquela parecia velha e precária, seus prédios vermelho-escuro com a pintura encardida. Rodeando o pátio haviam dois edifícios: um de três andares em formato de L e um menor ao lado. Por cima deste, pude identificar o telhado de um ginásio.
Não houve suspense: no exato momento em que nos esgueiramos ao lado da janela tivemos vista perfeita para o pátio do colégio e para as pessoas que haviam nele.
Uma mulher negra de cabelos longos e cacheados estava casualmente sentada em um banco de pedra, tentando acender o cigarro com um fósforo. Um grosso pedaço de madeira estava apoiado no banco, ao seu alcance. Quando outra mulher se aproximou, de pele escura e cabelos presos em um turbante apertado, a primeira deu um sorriso educado e desistiu do fósforo, guardando o cigarro no bolso e dando espaço para ela sentar. A segunda apoiava o braço direito na barriga e estava desarmada.
Hector murmurou para que olhássemos onde os carros estavam estacionados e conseguimos ver três homens: o primeiro tinha apenas as pernas à mostra, estirado sob um carro; o segundo era um senhor velho de barba e cabelos brancos que conversava e ria com o terceiro; mais jovem, robusto e barbudo, de aparência séria.
— O motoqueiro — Tom sussurrou e entendi que ele se referia ao homem jovem e barbudo, que em sua jaqueta de couro parecia um clássico motociclista. — tem uma arma na cintura.
Às vezes, quando se movia, sob sua jaqueta era possível ver uma pistola que eu não sabia identificar. Nenhuma das pessoas no pátio parecia alerta, somente conversavam com tranquilidade.
Deixei um suspiro de surpresa escapar quando, de trás do carro, dois cães apareceram correndo em direção ao "motoqueiro": um buldogue e um vira-lata alto e esguio, ambos de aparência bem cuidada. Até então não havíamos visto qualquer cachorro que não fosse Mei — exceto, claro, aqueles mortos e comidos.
— Mei iria latir com toda a certeza — murmurei para mim mesma e Melissa virou seu rosto, mas não me respondeu.
— Tem alguém diferente de antes? — Tom perguntou para Hector, sem tirar os olhos da janela.
— O cara armado não estava do lado de fora da outra vez. Nem a mulher do turbante. A de cabelo cacheados, o velho e o cara embaixo do carro já havíamos visto. Acho que o cara é mecânico, porque também estava embaixo de outro carro naquela vez.
Antes que pudéssemos perguntar qualquer coisa, as duas garotas viraram o rosto na direção dos prédios, de onde quatro crianças surgiram correndo. Por impulso, levei a mão até meu facão, sentindo o coração acelerar, mas em questão de segundos mostrou-se desnecessário: se fugiam de algo, não era por estarem amedrontadas. Mais um cachorro, grande e preto, saltava atrás delas, seguido de um yorkshire com só três pernas.
Da porta onde eles saíram, uma idosa de aparência realmente velha sorria. Estava trajada com a batina de freira, uma enorme cruz prateada pendendo no peito. Mais um homem saiu do prédio, este de aparência mais jovem e pele escura, caminhando em direção às garotas no banco. Apoiava despreocupadamente um machado preto de cabo longo no ombro, mas seu semblante divertido contrastava com a aparência assustadora da arma.
Quando umas das garotinhas que saiu correndo soltou um grito de excitação pela brincadeira, a mulher de cabelos cacheados levantou-se e deu uma bronca grosseira nela.
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Em Desespero
HorrorLIVRO 2. O mundo como conhecia está destruído e Rebeca vaga pelos seus escombros. Após encarar a morte de frente, encontrar novas pessoas por quem lutar e um lar para proteger, finalmente achava que tinha aprendido a lidar com aquele mundo. Porém o...