Capítulo 14.

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Limpei o suor da testa no momento que vi Carol subindo as escadas com copos de limonada gelados. Depois de tanto tempo fora com Melissa, havia até me acostumado com a realidade mais "apocalíptica", e lembrar como ainda éramos capazes de produzir gelo no condomínio parecia quase um delírio.

— Já terminou esse andar, Beca? — Carol sorriu, olhando ao redor para a sala que eu terminara de varrer e passar pano.

— Aham, os quartos também!

Era dia de faxina no condomínio, que fazíamos uma vez na semana. Carol, com a ajuda de Tom e Samuel cuidavam da casa onde viviam; Alex e Hector ficavam com a que Alex morava sozinho; e o resto de nós dividia-se para limpar e organizar o casarão principal, que além de morarmos, era quase o "quartel general" do condomínio. Mais tarde eu ainda teria que dar uma geral na casa abandonada que eu ficava, por isso havia começado mais cedo e terminado antes dos outros.

— Nossa, você é rápida! — Carol me estendeu um copo — Acho que não vou mais te deixar sair daqui, precisei ensinar os outros até a varrer o chão.

Sorri com a brincadeira e bebi metade do copo de uma só vez. Todo aquele trabalho fazia meus braços latejarem da mesma forma que eu me sentia matando zumbis.

Conversamos um pouco, mas a mulher logo desceu para continuar seu trabalho, deixando-me sozinha com Mei. Cheguei mais perto das janelas com o vidro abertas, aproveitando um pouco o ventinho de fim de manhã.

— Rebeca, você tá aí? — ouvi a voz de Melissa subindo a escadaria e Mei imediatamente começou a abanar o rabo.

— Aqui amiga!

— Nossa, já terminou tudo? — ela olhou ao redor enquanto caminhava em minha direção, recebendo Mei com um abraço apertado, já que a cachorra conseguia botar as patas em seus ombros e ficar quase do mesmo tamanho que minha amiga — ai, Mei! Suas unhas estão gigantes, que inveja.

Sorri, feliz com a companhia dela. Já fazia mais de uma semana que havíamos voltado da escola e ninguém saíra para buscar comida ainda, embora começava a ficar evidente que precisaríamos em breve.  Sentia um pouco de falta de sair com Melissa.

— Uhum. Desculpa se vocês burguesinhos nunca lavaram uma louça na vida, mas eu fazia faxina desde os meus 14 anos — brinquei. Naquele tempo que parecia tão distante em que ainda estudávamos no mesmo colégio, eu era a única do grupo que estava lá graças a uma bolsa esportiva.

— Beleza, cozinha sua comida pela próxima semana — Melissa devolveu, sentando do meu lado em frente à janela.

Apesar das piadas, a expressão de Melissa parecia dura. Depois de alguns segundos em silêncio, ela continuou:

— Amiga, precisamos conversar — ao ouvir suas palavras, senti meu coração começar a bater forte e precisei respirar fundo, incerta do que poderia vir — não quero insinuar que esse problema é seu, mas não acho justo que fiquemos fofocando sem você saber. Na verdade, você pode até desconfiar. Eu, Carol e Samuel acreditamos que Guilherme está com depressão.

Ao invés de surpresa, meu único sentimento foi uma pacífica contemplação, como  se aquela fosse a peça final de um quebra cabeça.

— Carol e Samuel...? — Perguntei, incentivando minha amiga a continuar.

— Bom, você sabe que o Gui e Sam acabaram se aproximando desde então. Foi Samuel quem percebeu primeiro a mudança de comportamento e contou para a mãe, e ela contou para mim porque não queria colocar mais peso em suas costas.

— Justo. Eu também percebi uma mudança. Agora que você falou, talvez tenha começado há mais tempo, mas nessa última semana ele parecia mais...

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