"O fim de um novo começo"
Já passava das 13h quando chegamos ao hospital central. Identificamos-nos e subimos para um andar diferente do que estava acostumada a encontrá-los. O quarto 36 era no final do corredor e até chegar lá, sentia meu coração acelerado e cada vez mais angustiado. Eu só me tranquilizaria quando visse que todos estavam bem.
Ao entrar uma claridade muito forte invadiu minha vista. Uma grande janela iluminava todo o cômodo e após me acostumar com ela, encontrei o olhar que tanto esperava rever. Ele sorriu para mim e me encarou caminhar até ele em silêncio. Ethan estava na cama reclinada, vestindo aquela roupa branca e com o cabelo mais bagunçado do que o normal. Sua fisionomia estava cansada, mas um sorriso sereno não saia de seu rosto. Senti uma enorme vontade de abraçá-lo, mas me contive, pois não queria machucá-lo. Cheguei até ele e toquei sua mão – seu aroma inesquecível invadia cada parte do meu corpo e uma sensação maravilhosa de alívio tomou conta de mim. Não resisti e lhe dei um beijo. Um beijo rápido, mas o suficiente para me acalmar ainda mais.
― Senti tanto a sua falta. – ele disse ainda com a voz fraca.
― Eu também. – respondi tocando seu rosto – Está sentindo dor? – poderia parecer uma pergunta idiota, mas eu precisava saber para poder abraçá-lo em breve.
― O efeito da anestesia já começou a passar, então estou sentindo algumas fisgadas, mas nada muito doloroso. – ele respondeu apontando para uma região um pouco abaixo do seu peito.
― Fico feliz que esteja bem, querido. – foi a vez de tia Steph se pronunciar. Eu havia esquecido completamente de sua presença – Como está o seu pai?
― Pelo que me falaram ele precisa ficar mais tempo em observação para ver se a nova parte do fígado se adapta normalmente. Mas ele está acordado e respondendo muito bem a todos os exames. – Ethan concluiu.
― Ótimo! Bem, vou deixar vocês a sós. – tia Steph me encarou com um sorriso maternal – Estou na cafeteria, querida.
Acenei com a cabeça e a vi se retirar. Ethan me encarava em silêncio e mais uma vez eu tentava ler, em vão, seus pensamentos. As olheiras fundas em seu rosto denunciavam o quão horrível foram aqueles últimos dois dias.
― Desculpe não estar por perto. Eu devia ter ligado para saber como... – comecei a dizer e fui interrompida.
― Você não deve pedir desculpas. Tudo aconteceu muito rápido. É melhor você se sentar. – ele apontou com o queixo para a poltrona ao lado da cama.
Sentei-me ainda segurando sua mão e fiz um sinal para que ele continuasse:
― Depois que você foi embora, naquela tarde que você pagou a conta do hospital, começaram a fazer alguns exames no meu pai antes dele ter alta e logo detectaram que algo em seu fígado estava errado. Um inchaço ou algo do tipo devido à cirrose hepática que ele adquiriu durante todos esses anos de muita bebida. Tentaram novamente a hemodiálise, mas não adiantou nada. A única alternativa seria um transplante de emergência, porém ele não resistiria a tempo de esperar um doador falecido, então precisavam de um vivo, com o fígado saudável e com o mesmo tipo sanguíneo e eu me ofereci como doador. Fizemos mais alguns exames e eu estava dentro de todas as exigências, marcaram o transplante e cá estamos nós. – ele sorriu cansando.
Tudo realmente aconteceu muito rápido. Em dois dias tudo praticamente havia se resolvido e todos pareciam bem. Aliviei meu coração ao saber que mesmo que eu tivesse ligado no dia seguinte para saber de notícias, não conseguiria falar com Ethan devido a todo o procedimento antes do transplante. Eu estava ainda mais aliviada ao vê-lo ali sorrindo, mesmo depois de todos os acontecimentos. Lembrei-me de que havia trazido algo a ele e comecei a procurar em minha bolsa:
― Toma! É para você. – eu disse lhe entregando uma caixa de bombons sortidos – Eu sei que você não poderá comer agora, mas o que vale é a intenção. – eu sorri. – Lembro-me de que há uns meses atrás, alguém me deu bombons no dia mais difícil da minha vida. – eu disse me referindo a ele – Lembro-me também que essa mesma pessoa me disse que os bombons serviriam para adoçar meu dia e, bem, realmente funcionou.
Ethan sorria enquanto apoiava a caixa em seu colo. Seus olhos me encaravam em silêncio e notei que uma lágrima tímida caia de seu olho esquerdo. Eu nunca o havia visto chorar – na verdade eu imaginava que isso jamais acontecia – e não fazia ideia do que fazer naquela situação. Decidi respeitar e deixá-lo colocar para fora os sentimentos que deviam estar o atormentando. Ainda de cabeça baixa ele se afastou um pouco para o lado, dando-me espaço para sentar junto dele naquela minúscula cama. Eu entendi o recado e logo me sentei ao seu lado. Sua respiração estava calma e o cheiro de álcool hospitalar com o aroma de sua pele trazia uma sensação tranquilizante em meu corpo.
― Posso te ajudar em algo? – perguntei depois de um tempo.
― Sim. – ele respondeu – Cante para mim. – ele pediu agora me encarando.
Aquele pedido havia me pegado de surpresa e fiquei por alguns segundos sem reação. Meu coração acelerou e minhas mãos começaram a suar. Ele já havia me visto cantar três vezes – no luau, na festa de Andrew e no show de talentos – mas eu nunca havia cantado apenas para ele:
― Você está me pedindo um show particular? – eu brinquei tentando não demonstrar nervosismo. – Cobrarei muito caro por isso.
― Eu não vejo a hora de poder pagar essa dívida. – ele respondeu dando, finalmente, aquele sorriso torto que eu tanto esperava.
Ethan estava de volta.
― Que música você gostaria de ouvir? – perguntei ainda me preparando psicologicamente.
― Qual é a sua favorita? – ele rebateu a pergunta.
Pensei por alguns segundos e logo a imagem de meu pai veio em minha memória. Comecei a cantar sua música favorita. A música que ele cantava quase todas as noites para eu dormir quando era criança: I don't want to miss a thing do Aerosmith.
O trecho que dizia:
"Deitado perto de você,
sentindo seu coração bater e me perguntando o que você está sonhando,
querendo saber se é a mim que você vê."
era a parte que mais se encaixava naquele momento. Aquele momento que eu gostaria de eternizar e guardar para sempre em um potinho.
― Sua voz é linda!
― Não se acostume com isso, Ethan Walker.
― Meu nome completo fica extremamente sexy quando dito por você, Abby Stuart. – Acho que já disse isso antes.
― Mas eu jamais me cansarei de ouvir.
Foi ali, naquele momento em que eu tive a absoluta certeza de que o meu agora poderia durar para sempre.
FIM!
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SETEMBRO (concluída)
Teen FictionAbby Stuart nunca foi muito fã de clichês, mas surpreendentemente, sua vida havia se tornado um daqueles clichês bobos de filmes. Perder seus pais em um acidente de carro, mudar de cidade e começar em uma nova escola - esses eram apenas alguns que a...