"E depois da tempestade..."
Por incrível que pareça acordei cedo naquela manhã de domingo. Não havia conseguido dormir tão bem como desejava e minhas olheiras confirmavam isso. Não desci para tomar café, atitude que fez minha tia bater em minha porta:
― Não vai tomar café, querida?
― Não estou com fome, tia. Mais tarde eu desço para comer algo. – respondi ainda na cama.
― Tudo bem! – ela respondeu e ouvi seus passos descerem as escadas.
Tomei um banho morno para esfriar as ideias e logo que saí do boxe ouvi meu celular apitar. Era Elena:
E. "Estou entediada! O que acha de vir aqui em para a gente fofocar?"
Se eu ficasse a tarde inteira em meu quarto, certamente iria ficar entediada também e acabaria pensando em coisas que me deixariam desanimada. Então não pensei duas vezes em responder a mensagem de Elena:
A. "Chego ai em meia-hora.".
●●●
Elena morava em um bairro ao lado do meu e cheguei um pouco antes do combinado. Assim que entrei seguimos para a cozinha. Sua casa era enorme e muito bem organizada; o que não combinava muito com ela. Seus cabelos alaranjados estavam presos em um rabo de cavalo e ela vestia algo parecido com um pijama:
― Quer sorvete? – ela perguntou abrindo a geladeira.
― Sim. – respondi me sentando em frente à ilha de mármore – Sua casa é linda! – eu disse olhando em volta.
― Minha mãe iria adorar ouvir isso – ela respondeu – Foi ela quem arquitetou e decorou a casa inteira.
― Sua mãe é arquiteta? – perguntei pegando a colher que ela me entregava.
― Sim. – ela deu uma colherada no pote bem nossa frente – E a sua?
Eu não estava preparada para responder aquela pergunta. Elena me pegou de surpresa e eu não a culpo por isso – eu nunca havia mencionado o acidente envolvendo meus pais.
― Meus pais... Morreram em um acidente de carro. – eu respondi quase sussurrando.
Elena tirou a colher da boca e me encarou com olhos assustados:
― Meu Deus, Abby. Eu sinto muito! – ela gaguejou.
― Tudo bem – eu disse – Você não sabia.
― Eu jamais podia imaginar isso... – ela ainda tentava encontrar as palavras.
― Vai fazer um ano na semana que vem. – eu resolvi abrir o jogo de uma vez. Elena sempre me ouvia e me aconselhava. Já estava na hora dela saber de tudo.
― Por isso você se mudou para cá. – ela afirmou chegando a uma conclusão.
― Sim. – eu balancei a cabeça – Moro com a minha tia Steph. Ela não estava em casa quando você foi lá.
― Eu não consigo me imaginar no seu lugar. – Elena admitiu ainda abalada – Mesmo com tudo isso você ainda consegue ser uma garota incrível e alegre.
― A vida precisa continuar não é mesmo? Minha mãe sempre me dizia isso. – eu tentei sorrir.
― Agora eu sou muito mais sua fã, Abby Stuart. – ela abriu um sorriso reconfortante. Era bom ter Elena como amiga. Eu havia tirado a sorte grande.
Nunca fui de ter muitas amigas no Kansas. Eu só via as garotas que estudavam comigo no colégio mesmo; nunca frequentamos a casa uma da outra. Minha amiga mesmo sempre foi uma vizinha chamada Lucy. Nós crescemos naquele bairro, mas não estudávamos na mesma escola. Lembro-me que sempre brincávamos na casa da árvore feita pelo pai dela em seu quintal. Era extremamente divertido! Ela se mudou um ano antes do acidente e nunca mais tive notícias suas. "Seria legal reencontrá-la um dia." – eu pensei.
― Mas me conte! O que aconteceu no baile ontem depois que eu fui embora? – perguntei mudando de assunto.
― Era isso mesmo que eu queria saber, Miss Kansas... Por que você foi embora tão cedo? O melhor do baile ainda nem tinha começado.
― Eu estava começando a ficar com dor de cabeça... – eu menti.
― Abby, eu te conheço a pouquíssimo tempo, mas eu já saquei o que acontece quando você mente. – Elena disse me fazendo lembrar de Ethan dizendo que eu não sabia mentir – Você olha para baixo sempre que isso acontece. – Elena admitiu sorrindo em seguida.
Meus olhos realmente me entregavam.
― Ok! – eu levantei os braços em sinal de rendição – Edgar tentou me agarrar e Ethan veio me defender. Eles acabaram discutindo e quase não saíram na porrada porque, por algum milagre, o Ethan achou melhor não brigarem.
― Então foi por isso... – Elena deu um pulo da cadeira em que estava sentada – Algum tempo depois que você foi embora, eles dois se engalfinharam perto do banheiro. Se não fosse pelo professor Hopinks, acho que Ethan teria desfigurado o rosto de Edgar.
― Não acredito. – eu disse fechando os olhos – Ele não fez isso! – eu bati no balcão de mármore.
― Acho que a letra E te persegue, Miss Kansas. – ela tentou brincar, mas parou de sorrir quando viu minha fisionomia carrancuda – Eu estaria muito feliz se dois garotos brigassem por minha causa. – ela sussurrou dando de ombros.
― Não sei se foi mesmo por mim que eles brigaram, Elena – eu exclamei.
― Como assim? – ela quis saber.
― Na hora em que Ethan veio me defender, Edgar estava bêbado e acabou mencionando o pai de Ethan no meio da discussão. – eu expliquei.
― Nossa! Ele pegou realmente pesado. – Elena voltou a se sentar – Agora tudo faz mais sentido ainda.
― E o que aconteceu com eles? – foi minha vez de perguntar.
― Os dois estão suspensos das aulas até terça-feira. – ela respondeu fazendo uma careta.
Como o Ethan era estúpido. Prefere sair no tapa ao assistir as aulas! Vai ver ele já está acostumado a passar por isso, afinal ele era o recordista de suspensões do colégio.
Naquela tarde, Elena também me contou que ela e Tom estavam cada vez mais próximos e que ele já a havia convidado para ir ao cinema no próximo final de semana. Eu fiquei muito animada por ela – as coisas estavam começando a dar certo para o seu lado.
― Estou adorando seguir seus conselhos, Abby. Obrigada, mais uma vez. – ela disse assim que nos despedimos.
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SETEMBRO (concluída)
Novela JuvenilAbby Stuart nunca foi muito fã de clichês, mas surpreendentemente, sua vida havia se tornado um daqueles clichês bobos de filmes. Perder seus pais em um acidente de carro, mudar de cidade e começar em uma nova escola - esses eram apenas alguns que a...