É bom ter você de volta

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THOMAS


A aula foi literalmente um inferno. Dylan me ignorou durante todas as horas possíveis, e sempre que algum amigo nosso tentava nos colocar na mesma conversa, ele fingia não estar ouvindo. Nossos amigos perceberam, claro, mas só um de fato sabia o motivo de estarmos assim: Connor. E ele não me julgou, e nem me censurou com os olhos. Mas eu desconfiava que isso fosse durar pouco.
No intervalo, porém, tive meu pensamento confirmado.
- Ei, cara. Posso falar com você? – estamos saindo da fila do refeitório, e ele tenta agir como se nossa conversa não fosse nada demais.
- Claro.
Ele indica o final do refeitório com a cabeça, e o sigo enquanto atravessamos o espaço lotado.
Quando passamos em frente a mesa da Bonnie, sinto meu respiração falhar. Ava está lá, mas sua expressão diz o oposto. Ela não participa da conversa, por mais que as meninas tentem. Seus olhos estão baixos, então ela não me vê quando passo pela mesa. Mas Bonnie sim, e me lança um olhar curioso.
- Aqui parece bom. – Connor diz, e encaro a mesa vazia próxima à parede.
-Manda vê. – deixo minha bandeja sobre a mesa, e me sento, esperando que o sermão comece.
Connor inspira fundo e então solta, parecendo estar se preparando para dar uma palestra ou se apresentar para um público.
- Quando você vai conversar com o seu irmão?
- Quando ele quiser falar comigo .
- Do jeito que as coisas estão indo, nunca.
Não posso deixar de revirar os olhos.
Quanto exagero!
- Ele só tá magoado, Connor. Eu entendo que não queira falar comigo agora.
- Já se passaram três dias, Thomas, e vocês ainda não conversaram. Você quer continuar com esse clima pesado na sala? Não prefere ficar bem com seu irmão?
- Claro que prefiro. Mas não quero conversar enquanto ele está de cabeça quente.
Connor passa os olhos pela multidão, como se estivesse se certificando de que ninguém está prestando atenção na nossa conversa.
- Olha, eu não te julgo, ok? Isso é entre vocês dois. Mas quanto mais vocês deixam isso pra lá, pior fica.
Ele tem razão. Droga!
Mas também não quero mais um soco na cara, o que claro, vai acontecer quando eu tentar conversar com ele. Dylan está bravo, e eu não tenho o direito de me defender caso ele parta pra cima. Se for para ele ficar melhor, eu aceito mais uma surra.
- Tudo bem. Passo na sua casa mais tarde. – respondo, e Connor solta um suspiro de alívio.
- Valeu, cara. – ele pega o sanduíche da bandeja e dá uma mordida, se lambuzando de maionese.
Encaro meu hambúrguer com desinteresse, tentando entender quando perdi meu apetite.
Será que foi quando o Connor me chamou para conversar? Ou quando decidi conversar com o Dylan hoje? Ou pior, quando percebi que marquei de conversar com o Dylan e a Ava no mesmo dia?
Porra! E agora?
Eu preciso me desculpar com os dois, mas não sei se consigo fazer isso no mesmo dia. Será que meu rosto aguenta tanta surra?
Tomara que sim!
- O que vocês estão fazendo aqui? – Jude pergunta, enquanto se joga na cadeira ao lado e abre a latinha de refrigerante.
Connor me encara, perguntando se o Jude sabe de alguma coisa. Faço um aceno com a cabeça e ele diz :
- Estava convencendo o Thomas a falar com o Dylan.
Jude ergue as sobrancelhas e me encara.
- E você vai?
- Vou.
- Corajoso. – meu primo elogia. Ou pelo menos espero que tenha falado como elogio.
- Ele precisa consertar as coisas. – Connor diz.
E então uma imagem vem à minha cabeça. Connor com uma roupa branca e uma auréola sobre a cabeça, agindo como um anjo bom e tentando me levar para o caminho do bem... Enquanto Jude, com uma roupa vermelha e com um par de chifres sobre a cabeça, está tentando me convencer a fazer exatamente o oposto, ou seja, o mal.
- E depois ele vai precisar consertar o rosto. – Jude diz com um sorriso amigável.
Connor me lança um olhar culpado, e abre um sorriso de boca cheia.
- Claro que não. – ele diz, mas com falta de confiança.
-  Claro que sim. – Jude diz, ainda com o maldito sorriso no rosto.
- Chega. Os dois. – interrompo. – Já decidi, eu vou falar com ele.
- Tudo bem. Você que escolheu dar um par para essa manchinha aí. – meu primo aponta para o meu hematoma.
Abro a boca para mandá-lo se foder, mas Nicole, com uma calça jeans extremamente colada e  uma blusa de uma alça só, me distrai.
- Oi, Thomas. – ela diz, mas a forma como fala, é como se estivesse cantando as palavras.
- Oi, Nicole. – respondo, mas não no mesmo tom sugestivo que ela.
- Ainda estou esperando aquele encontro. – ela posiciona as mãos sobre a mesa, dando uma visão completa do decote.
Desvio o olhar e encaro meus amigos. Jude esqueceu do refrigerante, e a encara como se ela fosse uma visão no meio do deserto. Já Connor, parece temer erguer o olhar. Se eu estivesse no lugar dele, namorando com a louca da Gena, também estaria. Ela com certeza arrancaria minhas bolas.
- Foi mal, Nicole. Não vai dar.- abro um sorriso de desculpas.
- Adoro quando você se faz de difícil. – sua língua alisa seu lábio inferior, e posso jurar ter ouvido um gemido vir do lado do Jude.
- Não estou me fazendo de difícil. É sério! Eu não posso mais.
Agora que todos, ou pelo menos todos que importam, já sabem que gosto da Ava, não tenho motivos para continuar fingindo ser o que não sou. Chega de tantas garotas. Depois da surra que levei, decidi que preciso dar um tempo na comunidade feminina. Quero me concentrar mais em mim.
Vou nadar mais, andar mais de moto e me preparar para tirar minha carteira.
- Ah, tá bom. – ela ri.
O que eu preciso dizer para que ela entenda ?
- Nicole?
- Sim? – ela estica a palavra como chiclete.
- Eu estou falando sério.
E de repente, é como se eu tivesse ofendido ela.
Nicole me fuzila com tanta raiva, que uma parte minha reage e se encosta na cadeira. É um sinal de rendição. Mas a outra se prepara para fugir, é o instinto de sobrevivência alarmando na minha cabeça. Os animais fazem isso quando estão de frente com  um predador. E o meu, se chama Nicole.
- Espera aí. – ela ergue a mão , e só então percebo suas unhas afiadas.
Ela sempre teve essas unhas?
- Você está me dispensando? – ela pergunta incrédula.
Engulo o medo e forço minha voz a sair.
- Eu só acho melhor a gente parar com isso.
- “Isso”?. – ela exclama, ofendida. – Eu sou “isso”?
- Não, eu não falei isso. Eu só quis dizer que...
- Esquece. – ela ordena. – Você não é tudo isso mesmo. Pode ser bonitinho e ter um beijo bom, mas não é o único cara no mundo. – então ela desvia seu olhar para Jude, e em um segundo está livre de toda a  raiva e está sorrindo. Espera, o quê? Eu perdi alguma coisa? – Jude? – ela canta.
- Oi? – meu primo responde, prontamente.
- Você está livre hoje à noite? – ela soa como uma gata.
Acho que se a escola permitisse, ela já estaria em cima da mesa fazendo um show.
- Pra você? Eu tô livre todo dia. – ele responde, e ela solta um grito animado.
- Ótimo. Me pegue às 19:00 horas.
- Estarei lá. – e então ela já está rebolando em outra direção.
- Isso foi tenso. – Connor diz , e aceno com a cabeça.
- Falem por vocês, porque eu, tenho um encontro. – meu primo se gaba.

A barraca do beijo 2Onde histórias criam vida. Descubra agora