Capítulo 3. mente cheia

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Quando finalmente as aulas terminam e eu estou livre desse inferno chamado escola, guardo o caderno na mochila preta básica (Aaron tem duas iguais, para garantia nos dias como o de hoje em que eu preciso assumir o seu lugar por conta de uma emergência), e vou rapidamente até o estacionamento do supermercado próximo à escola. Meu carro está me esperando, e em questão de minutos estou indo em direção à casa de Kevin.

Até o local em que deixo meu carro tem que sempre ser bem pensado nesses dias. Aaron nunca vem de carro, portanto, chegar de carro em um dia e nos outros não, poderia chamar um pouco de atenção. Além disso, preciso sempre evitar ao máximo falar com qualquer pessoa, pois um detalhe mínimo pode comprometer a nossa jogada.

Não sei quais seriam as consequências caso a escola descubra que fazemos isso, mas aposto que não seria algo muito bom. Meu irmão não pode reprovar mais um ano e eu não quero continuar aqui, preso nessa cidade. Quero que nós dois juntos possamos ir pra faculdade, ter uma vida longe do inferno que é essa cidade.

Além disso, eu tenho medo de o que pode acontecer ao Aaron se ele sentir que fracassou novamente. Ele não lida bem com fracassos e nem com a ideia de fracassar, e todas as vezes que algo assim aconteceu, é na sua segurança em que ele descontou.

Enquanto eu passei horas sentado em salas de aula, fingindo prestar atenção e anotando coisas da aula, eu só anotava as mesmas coisas no caderno: a pergunta "o que vou fazer com o meu irmão dessa vez?" e uma lista de coisas que preciso fazer assim que estiver com ele.

Sempre que coisas assim acontecem, gosto de olhar para meu irmão, conversar com ele e ver como ele está. Não sou especialista, mas não confio em quase ninguém para dizer que ele está bem. Kevin é o namorado, e mesmo que confiando nele para cuidar do meu irmão, não confio nele para entender o meu irmão. Quero ligar pra Betsy, pedir ajuda e deixar ela decidir os próximos passos. É nela em quem eu realmente confio.

Não sei se eu aguento decidir mais alguma coisa. Preciso de ajuda.

Quando estaciono em frente à casa de Kevin, procuro pela cópia da chave da casa no porta luvas. Ao entrar na casa, fico em silêncio e ando diretamente até o quarto dele.

- Oi - me apoio no batente da porta, cruzando os braços na altura do peito. Kevin e Aaron estão deitados na cama. O quarto escuro iluminado apenas pelo brilho fraco da televisão. Aaron não se move, continua deitado na barriga do namorado, ganhando carinho no cabelo sempre muito bem arrumado.

- Oi - Kevin tenta sorrir, mas percebo que ele está se controlando para não chorar.

Ver o quanto Kevin está esgotado me faz ter medo.

Desde o início fiquei preocupado com como essa relação poderia fazer mal para meu irmão, que esqueci que Kevin poderia sair machucado dela também. Sei que Kevin ama o Aaron, mas se ele decidir que não aguenta mais, o meu lado egoísta vai me fazer odiá-lo. Odiá-lo por deixar o meu irmão para que eu lide sozinho.

- Meu amor - Kevin fala em um tom de voz suave para meu irmão. Aaron continua com os olhos direcionados à televisão. - Eu vou preparar algo para nós comermos. Seu irmão deve estar com fome. Eu logo volto.

Cuidadosamente, ele afasta meu irmão, o fazendo deitar em cima de um travesseiro e ajeita a coberta em cima de seu corpo. Kevin dá um beija na têmpora de Aaron e arruma um pouco dos cabelos bagunçados. Quando ele se afasta da cama em direção a porta onde estou, ele está sorrindo, mas ao chegar no corredor, o sorriso sumiu de seus lábios e seus olhos estão cheios de lágrimas.

- Cozinha. - Meu tom de voz é firme e baixo. Seguro seu braço e ando com ele até a cozinha. Fecho a porta, para abafar mais ainda o barulho. - Pronto, agora você pode chorar por 2 minutos. Depois disso, nós dois vamos conversar sobre tudo isso. Só 2 minutos.

I can't stop staring at you || AFTGOnde histórias criam vida. Descubra agora