XLII - Não!

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VITÓRIA NARRANDO:

Daniel  freou bruscamente o carro em frente a uma casa  que eu não conhecia. Uma sensação ruim cresceu em meu íntimo, fazendo com que um medo começasse a me sufocar. O nervosismo fizeram minhas mãos tremerem, o ar falhou em meu pulmão.
Será que é  seguro?, pensei. Eu nem sei onde estou, e na última vez que entrei em uma casa desconhecida as coisas não acabaram bem para mim. Ele desligou o carro, retirou a chave da ignição e me disse:
-- Não precisa se preocupar. Isso não é  ima armadilha.
-- Eu sei, mas é seguro? Digo, nessa casa mora quem matou Carlos, e se ele me machucar, e se ele te machucar.
-- Ele não fará isso. Ele pode ter matado Carlos, mas ele não conseguirá fazer o mesmo comigo.
-- Como você pode ter tanta certeza?  Ele é um assassino.
-- Ele também é meu amigo. Vamos?
-- Ok, vamos.

Descemos do carro, e começamos a andar em direção a casa. Daniel caminhava apressadamente em direção a porta,  fazendo com que às vezes, eu precisasse correr para poder acompanha-lo. Assim que parou em frente a porta, Daniel tocou a campainha, e segundos depois Henrique a abriu. Meu Deus!, pensei. Foi ele quem matou Carlos. Mas por que ele fez isso?
-- Daniel? 
-- Oi, Henrique. Nós precisamos conversar.
Henrique olhou por cima dos ombros de Daniel, e me viu há  alguns metros de distância. Ele ficou surpreso, e se direcionando para Daniel, perguntou:
-- O que ela está fazendo aqui?
-- Ela veio comigo. Podemos conversar? É muito importante.
-- Claro, espere alguns minutos. Eu irei pegar meu casaco e conversamos aqui fora.
-- Claro.
Ele sumiu dentro da casa, e alguns minutos depois retornou vestido um casaco cinza, e com um cachecol enrolado no pescoço.
-- Me desculpe, é só que eu estou fazendo uma reforma. Lá dentro está uma bagunça -- justificou ele, quando fechou a porta à suas costas. 
-- Sem problemas. -- Daniel abriu um sorriso amarelo, em seguida acrescentou: -- Nós vinhemos aqui hoje para falar sobre a morte de Carlos.
-- Ah, sim. Uma tragédia. Apesar de não sermos mais próximo, eu senti a dor do luto como se ainda fôssemos amigos. Eu não fui ao velório, não queria parecer hipócrita. Eu e ele, não éramos mais amigos, e eu não tinha motivos para fingir isso.

Daniel ficou em silêncio, ponderando cada palavra mentirosa que ele dizia. Henrique desenrolou  o cachecol do pescoço, e o segurou entre os dedos.

-- Eu vi os noticiários. Eu sinto muito que eles estejam acusando seu irmão.
-- Não foi ele quem o matou! -- exclamei, e Henrique voltou sua atenção para mim. -- Nós sabemos da verdade.
-- Que seria? -- perguntou ele,  curioso.
-- Você o matou! -- afirmei, encarando-o.
-- Você está louca? Eu jamais faria isso!
-- Não. Você o matou, e nós sabemos da verdade -- disse Daniel. -- Eu vi seu colar na cena de crime. O colar que eu te dei. E a arma usada para matar Carlos, foi a mesma que ele te deu. Diga à verdade Henrique. Você o matou, não foi?
-- Do que vocês estão falando? Como você pode acreditar no que ela diz? Nós somos amigos, você sabe quem eu sou.
-- Por isso estou te perguntando se foi você. Ultimamente, todos nós estávamos com raiva dele, e não me surpreenderia que você o tivesse matado. Então, foi você?
-- Não, não foi eu!
-- Não perca seu tempo Daniel, ele não dirá a verdade. Vamos pegar as imagens e levar a delegacia -- sugeri, e Daniel apenas acenou com a cabeça.
-- Vocês não farão nada! -- exclamou Henrique, quando eu e Daniel começamos a caminhar em direção ao carro.
Nós nos viramos, e vimos ele com a arma na mão -- a mesma arma. Ele a  apontava para nós, dedo indicador no gatilho e o metal reluzindo como prata a luz da lua. Naquele momento percebemos nosso erro: nós não devíamos ter ido ali. Devíamos ter ido imediatamente a delegacia assim que descobrimos. Agora a verdade morreria com nós. Novamente, me arrependi de ter confiado em Daniel novamente.
-- Henrique, se acalma. Você não precisa fazer isso. Eu e Vitória vamos embora, e você pode tentar fugir.
-- Ai que você se engana. Eu tenho que fazer isso. Ela é tão culpada quanto Carlos, ela destruíu nossas vidas. Além do mais, eu não quero viver fugindo. Vocês são os únicos que sabem a verdade. E eu realmente sinto muito. É um mal necessário -- Com a arma apontada para minha direção, Henrique a destravou e em seguida puxou o gatilho.
O som insurdecedor do tiro soou pela rua, e aquela bala cortou o ar com uma rapidez sobre humana, vindo em minha direção. Porém, antes que ela me perfurasse,  Daniel me empurrou para trás e se colocou em minha frente. A bala perfurou o seu peito com tanta força, que ele caiu para trás.  A cena se desenrolou em câmera lenta: seu corpo despencando no ar, e caindo no chão em seguida.  A poça de sangue crescendo cada vez mais; a minha expressão de horror;  o arrependimento recaindo sobre Henrique. Corri em direção ao corpo imóvel de Daniel, enquanto esbravejava, a voz desesperada:
-- O que você fez?
-- Eu não quis feri-lo. O tiro era para ter pego em você -- disse Henrique, desesperado. Ele realmente não tinha a intenção de matar Daniel, era para eu ser a sua última vítima.
-- O que você está fazendo parado ai? Chame uma ambulância.
Me agachei ao lado de Daniel, e trouxe sua cabeça para meu colo. Sua dificuldade para respirar crescia rapidamente, e o pequeno buraco vermelho em sua camiseta branca começou a desaparecer no meio da mancha de sangue.
-- Daniel, se acalma, vai ficar tudo bem. Respira, e não se canse muito, a ambulância já está a caminho. -- Eu coloquei minha mão em seu peito e presionei o ferimento, tentando desesperadamente estancar o sangue que agora escorria livremente pelos meus dedos, não importasse o quanto eu tentava impedir.
-- Já está tudo bem. Não preciso de mais nada... Eu estou nos braços do meu primeiro amor, a primeira pessoa que verdadeiramente amei. E  que ironicamente, ainda amo, com todas as minhas inúteis forças...  Eu sei que... que  você não sente o mesmo por mim, mas tudo bem. Te amar, mesmo não sendo correspondido, foi suficiente. Você e Rafael serão muito felizes juntos, e isso me deixa feliz, me consola.
-- Ei, shhh. Não se canse, ok? Você conseguirá sair dessa.
-- Acredito que não. Já é tarde demais. -- Ele puxou o ar com dificuldade, e lentamente continuou: -- Não houve um só dia, em todos esses anos em que eu não me arrependi de tudo que eu te fiz. Não houve um só momento em que eu não pensei em você. Eu preciso que você me perdoe. Eu não quero morrer sem o seu perdão.
-- Eu te perdou, Daniel. Você salvou a minha vida, e você sempre será lembrado por isso.  -- Ele sorriu com dificuldade. Uma fina linha de sangue escorreu pelo canto da sua boca.
-- Eu faria isso de novo mil vezes se fosse preciso.
-- Eu não mereço isso. Você não devia ter entrado na frente da arma. Você devia ter deixado eu morrer.

As lágrimas começaram a correr pelos meus olhos, mas Daniel continuava lutando por mais alguns minutos de vida. Seu peito subia e descia com dificuldade e sua voz se tornava cada vez mais rouca. Ele segurou firme em uma de minhas mãos, e olhou em meus olhos.  Estranhamente, eu senti toda sua dor, sofrimento e culpa, vivido nos últimos anos. Eu tive pena, pois sabia que havia causado mais sofrimento a ele. Agora, eu me arrempendia profudamente, por ser a causa de toda aquela dor. A verdade era que,  minha vingança não trouxe nada de bom a ninguém. Uma vingança sangrenta que só trouxera morte e sofrimento para todos.

-- Eu estou com medo... -- disse Daniel, a voz falha e embaralhada. -- Eu não sei o que vai conhecer depois. Está doendo. Está doendo muito.
-- Ei, não precisa ficar com medo. Eu estou aqui do seu lado, e eu não te deixarei. Você não está sozinho, nunca esteve. E não importa o que acontecer depois, você vai enfrentar.
-- Está cada vez mais difícil respirar. Eu não quero morrer, eu não quero ir.  
-- Não fale, muito. Poupe suas energias. A ambulância já está  chegando.
Olhei em direção a rua, para onde Henrique estava. Porém, eu não o vi. Ele não estava lá. Parecia que ele nunca houvera estado ali. Olhei em volta, procurando ele escondido em algum canto, e novamente não o vi. Ele fugiu, pensei. Fugiu antes que a Polícia chegasse. Senti a mão de Daniel apertar a minha, e curvando meu olhar em sua direção, o vi movimentar a boca com dificuldade para falar.

-- Em 28 anos, você foi a melhor coisa que me aconteceu. Eu...

Lentamente a mão de Daniel soltou a minha. Seu peito não se movimentava mais, e seus olhos estavam fechados.  Parecia que ele estava dormindo. Mas não, ele estava morto, se sacrificou por mim. E aquilo poderia ter me salvo da morte, mas me condenou a culpa.

-- Daniel? Daniel aguente firme, está me ouvindo? -- Mas ele não ouvia. Já era tarde. -- Você não pode morrer. Por favor, não!

Chorando, eu curvei minha cabeça sobre aquele corpo imóvel, e ainda quente. Ali, liberei toda a dor e desespero presos em mim. O cheiro do perfume que Daniel usava ainda estava presente em sua roupa, no entanto, o cheiro do sangue também já se fixara ao corpo. Ao longe, abafado pelo som do meu choro, ouvi as sirenes da ambulância vibrarem cada vez mais próximo, acendendo uma pequena faísca de esperança, que mais tarde, se apagou tão rápido quanto se acendeu.
O corpo de Daniel foi colocado em um saco preto para cadáveres, sendo levado para análise em seguida. Vários policiais me interrogaram, e revistaram  a casa de Henrique, que descobri estar algemado dentro de uma das viaturas. Perguntei a um dos policiais o que ele fazia lá, e me disseram que ele havia se entregado.

Assistindo toda aquela cena -- o sangue em minhas mãos, o saco de cadáveres, a arma caída no chão. -- Eu cheguei a uma conclusão: eu não podia continuar ali. Precisava partir.

Vingança SangrentaOnde histórias criam vida. Descubra agora