-Capítulo 05-

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"Ei garota!" A voz dele me faz ter um sobressalto. Minha respiração está acelerada e estou tremendo bem mais. "Falei com você. O que você tem?" Styles pergunta me olhando atentamente.

Aqui não, não agora! Me forço a voltar a realidade. Eu me odeio por lembrar daquele dia, odeio me entregar a escuridão dentro de mim, me sinto fraca e covarde por não lutar. "Nada, estou bem." Falo baixo controlando meu corpo e minha mente. O soldado me olha como se eu fosse maluca. Talvez eu esteja ficando.

Percebo que já chegamos na escada para subir no navio. A escada é feita de corda, como se fosse uma rede para escalar, nunca fiz isso na minha vida. Vejo a água lá embaixo e meu medo fica exposto em minhas expressões.

Os soldados que já estavam no navio pegam as minhas malas lá em cima. Olho para atrás. "Não sei como subir." Falo. Styles me olha sem interesse. "Não deveria estar aqui então." Ele diz. Respiro fundo e seguro a escada de corda colocando o pé em um dos buracos. Arregalo os olhos quando sinto que abandonei a madeira do deck. Coloco o outro pé em outro buraco e começo a subir do jeito que consigo. A corda treme com minha falta de prática. Vou escalando devagar ignorando o assobios e frases nojentas que escuto dos soldados.

"Poderia subir sem nada." É ouvido acompanhado de risadas.

É triste saber que tantas mulheres passam por isso e até por coisas bem piores durante essa guerra. Infelizmente não só na guerra, o assédio é uma coisa completamente normal aqui.

Coloco o pé no lugar errado e já fico esperando a minha queda na água gélida e turbulenta. Sinto minha mão doer e vejo ela enroscada na corda, deixando a mesma branca. "Tá com pressa gata." Escuto.

Sinto uma mão fria na parte de baixo da minha coxa me dando impulso para continuar. Faço força para soltar minha mão e sinto a mesma formigar pelo sangue preso. Escalo mais um pouco e pego as mãos do soldado já dentro do navio.

Alívio toma conta de mim quando meus pés se encontram no piso firme de madeira do navio. Respiro fundo e me sento em um relevo. Passo a mão em minha nuca tentando deixar a minha respiração normal. Vejo o soldado subindo e logo ele está dentro do navio ao meu lado. "F..foi você que.." Gaguejo. "Foi." Ele responde me olhando de cima a baixo e se sentando do meu lado. Ele geme de dor olhando para o estômago.

"Acho que alguma coisa aqui se soltou." Fala fazendo uma careta de dor. Me levanto e pego minha bolsa. "Preciso dar uma olhada. Algum ponto pode ter arrebentado com o esforço." Falo. Ele desabotoa sua camisa e eu observo o curativo. Não era para estar sangrando. Me agacho um pouco para ficar na altura do seu machucado.

"Essa posição me faz lembrar de algumas coisas. Te lembra também?" Ele fala com malícia. Ignoro sabendo muito bem do que ele está falando. Infelizmente eu sei. Tiro seu curativo sem nenhum cuidado. "Sua mão tá gelada." Ele fala quando minha mão esbarra por sua pele quente o fazendo arrepiar. Como eu pensava, seu ponto arrebentou. "Vou precisar fazer outro." Falo. Pela careta dele, obviamente ele não gostou. Pego uma agulha, uma linha nova e passo o mesmo gel no local. Me levanto e fico esperando o gel fazer efeito.

O olhar do soldado está em mim e eu desvio o olhar por isso. Depois de alguns segundos olho para ele novamente e ele continuava me encarando. Seu olhar parece querer olhar através da minha alma.

"O que aconteceu?" Ele pergunta me fazendo ficar surpresa. "Como?" Tento me fazer de desentendida. "Você sabe muito bem." Ele fala ainda me olhando nos olhos. O que é melhor do que usar a frase da pessoa contra ela mesma? Penso em falar 'Como você disse, não é da sua conta.' Mas acho que Margaret não se orgulharia disso em seu túmulo.

"Só.. fiquei assustada." Falo e volto a me agachar. Ignoro seu olhar em mim. "Não se mexe, por favor." Peço. Começo a dar o último ponto mais uma vez. Mesmo com o gel anestésico sinto ele tremer, afinal estou costurando sua pele. Não demorou muito para terminar e enfaixar de novo.

"Toma dois desse por dia." Falo entregando um medicamento pra ele. "Vai cicatrizar rápido e diminuir a dor." Falo. "Se precisar de mais alguma coisa, vai na enfermaria. Adeus e desculpa por ter salvado você." Digo e pego minhas coisas. Saio de perto dele antes mesmo dele me responder.

Encontro Melissa um pouco mais afastada e vou até ela. "Onde fica a Enfermaria?" Pergunto ignorando o olhar do soldado que está com ela. "Não sabe procurar?" Ela fala com desdém. Respiro fundo e olho ao redor. Vejo uma porta grande de aço e entro na mesma. Percebo que é o refeitório.

Não vou perguntar pra nenhum desses soldados, aposto que algum vai vim com algum tipo de gracinha. Me viro para voltar onde estava. O navio não é grande, posso conseguir achar sozinha. Saio do refeitório e começo a olhar ao redor mais uma vez.

Eu me sinto literalmente uma burra por estar perdida em um lugar pequeno, mas o que eu posso fazer? Nunca pisei em um navio de guerra antes. Isso não é muito normal para alguém da minha idade, certo?

Deixo os meus pensamentos de lado e volto a me concentrar em achar a enfermaria. Vou tentando passar pelas dezenas de soldados andando na minha frente.

Encontro uma porta com uma luz vermelha em cima. Empurro a mesma que faz um barulho de velha e entro na cabine não tão grande. Percebo soldados nas macas. Minha necessidade em ajudar todos aqueles homens desperta no mesmo segundo, mas minha atenção é voltada para o homem loiro me olhando. Percebo que é o mesmo enfermeiro da praia.

"Você parece meio perdida." Escuto sua voz grossa e meio que tenho um sobressalto interno. Olho bem para o seu rosto. "Não vou mentir, um pouco." Falo. Ele me encara com um sorriso de canto bem branco. Desvio o meu olhar.

"Tudo bem.. Eu to bem perdida." Falo com sinceridade e volto a olhá-lo. Ele sorri e tira o estetoscópio do pescoço. A cada passo que ele dá na minha direção, minha respiração se acelera ainda mais. "Posso guardar as suas coisas?" Ele pergunta estendendo a mão. Volto a respirar normalmente e entrego as mesmas. Ele dá um leve sorriso e se afasta para guardar minhas bolsas.

Me odeio por ser tão fraca.

DUNKIRKOnde histórias criam vida. Descubra agora