Wake Up

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ten years ago

A cor amarela filtrada pelo vidro de proteção do microondas, era a dona de toda a minha atenção petrificada. Os olhos centrados no saquinho que crescia a cada pipoco sob a luz, enquanto o cheiro amanteigado invadia minhas narinas minúsculas. Esperar e esperar. Ser paciente. Talvez essa não fosse a minha melhor qualidade, não quando de um de meus alimentos favoritos.

— o saco já cresceu o suficiente, Marie? — meu pai gritou do outro lado da parede, onde estava preparado para iniciarmos um filme que eu escolhi.

— ainda não, papai! — gritei de volta, a voz fina e clara na escuridão incerta. Minha atenção novamente voltou para aquele saco no interior da máquina, e bati pequenas palmas quando chegou ao tamanho indicado. — agora sim, papai!

— traga pra cá, querida — sua voz ecoou seguida de uma risada rouca. Abri a porta com cuidado e usei uma luva para retirar a pipoca ensacada do pequeno forno, guiando-a para perto do balcão, onde precisei de um banquinho para subir e despejar o conteúdo em uma tigela. — venha logo, Marie, você está perdendo o filme!

— estou aqui, papai — um sorriso grande estampou meus lábios quando parei em frente ao portal da sala, olhando-o com a tigela em mãos. Seu sorriso de resposta foi ainda mais genuíno, iluminado apenas pelas luzes coloridas da programação. Caminhei até ele e me esforcei para subir no sofá e me aquecer em seu calor.

— hmm... o cheiro dessa pipoca está ótimo — ele enfiou os dedos grossos na bacia, pegando uma quantidade da pipoca e levando até os lábios. Fiz o mesmo e o olhei enquanto mastigava.

— sim! — e nós dois gargalgamos com a boca lotada, só então levando nossa atenção para o filme.

Deitei a cabeça no braço do meu pai, que se moveu para envolver meu corpo enquanto admirava as cores e imagens existentes dentro de uma pequena caixa. Inspirei o ar para dentro de meus pulmões, e sorri mínimamente quando um dos protagonistas se diz estar apaixonado pela personagem e aproveita a oportunidade para pedi-la em casamento.

— papai... — um sussurro sonolento e longo.

— oi, querida

— o senhor já se apaixonou? — o questionamento é cauteloso. O olhei nos olhos brilhantes, que pareciam cinza ao se misturar com o ambiente.

— sim, pela sua mãe, Marie — vejo que um músculo se moveu em sua bochecha, deixando claro seu desconforto ao mencionar tal pessoa.

— ela... vocês já se casaram? — meus olhos piscaram em sua direção, encontrando seu olhar em meio à escuridão oscilante.

— não, não nos casamos. Éramos apenas amigos e quando começamos a namorar, tivemos você, querida — seus dedos percorreram meus cabelos, que se soltaram de minha cabeça e foram parar em meu rosto.

— então eu fui um erro?

— não, meu amor, você foi um presente — ele sorriu e retornou sua atenção para a TV solitária a nossa frente.

— por que todas as crianças têm uma família grande e eu não, papai? — forcei a voz para parecer firme, mas falhou quando meu lábio inferior tremeu involuntariamente, deixando claro o que aconteceria a seguir.

— porque Deus quis assim, Marie

— Deus não queria que eu tivesse uma família grande? — meu sussurro pareceu trêmulo, e levei os pequenos dedos aos meus olhos, secando-os discretamente.

— Deus quer apenas que dê valor a esta, mesmo que não seja grande...

today.

Why should I care about you? - 𝙎𝙚𝙖𝙨𝙤𝙣 1.Onde histórias criam vida. Descubra agora