I know

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Depois do ocorrido de ontem, Cecília não me deixou fazer absolutamente nada. Era dia de trabalho, os empregados estavam em constante conturbação e eu não podia ajudá-los, pois estava deitada em meu leito inércia, encarando o teto como alguma espécie de tratamento.

Sabia que ela estava indo contra as regras de Justin, talvez ele não soubesse do que aconteceu comigo, talvez sim, mas o fato era que ele não se importava e nunca se importou com a saúde de nenhum funcionário naquela casa. A maioria estava ali vinte e quatro horas do seu dia, outros preferiam dormir em suas próprias casas, e chegar de manhã no trabalho. Mas nada de atrasos, justin odiava isso.

O tédio predominava o quarto e, com ele, veio os pensamentos perniciosos. As lembranças...vejo que minha vida mudou bastante até aqui, e naquele momento passava como um filme em minha mente. O vento soprou, e tudo pareceu virar do avesso. Não sabia como concertar, não seria possível voltar a trás e nunca ter ido com meu pai, onde achei que seria um restaurante. Jamais pedi para nascer, como a vida pôde ser tão cruel comigo? Por que aquelas coisas aconteceram? Onde está o Deus que tanto falam? Ele se esqueceu de mim?

As perguntas são cada vez mais gritantes, e eu viro minha cabeça de um lado para o outro, na tentativa de afastar a minha própria voz de mim.

Quando percebo, lágrimas já molhavam as minhas bochechas. Quentes e salgadas. Aquilo era um castigo para mim? O que eu fiz de errado?
Meu rosto esquenta, meus olhos ardem e tudo parece estar preso em minha garganta.

Se você não chora, então, seu corpo vai se forçar a isso.

Como uma maneira de me acalmar, me levantei, minhas mãos estão trêmulas, assim como minhas dolorosas pernas. Sinto o gelado de minha pele em minha cabeça, quando a passei por meus cabelos de maneira lenta, procurando uma forma de fazer aquilo tudo parar.
Eu fechava os olhos e via ele. Meu pai, o meu agressor e Justin. Os três que eu gostaria de banir da Terra e de minha cabeça.

Já se passaram tantos dias, mas eu ainda lembrava da maneira que ele me olhava, da maneira cruciante que ele investia em mim, arrancando todos os meus sonhos e minha inocência. Também lembrava da jeito cruel que recebi a notícia de que ficaria nesta casa até completar uma idade adequada para servir em uma casa de prostituição. Tudo parecia tão errado, eu nunca deveria estar ali. Aquele não era o meu lugar.

Meus olhos encontram o espelho, observo meu corpo. O corpo que um dia ele tocou. Tenho uma expressão abatida, minhas vestes são triviais, uma calça jeans e uma blusa justa ao corpo.

Ergui a blusa larga de maneira lenta, tinha medo de olhar e ainda ver alguma marca deixada por aquele homem asqueroso. Não tinha, sumiram a dias atrás.

Aquele espelho reflete uma garota perdida, uma garota falha de todas as formas possíveis.

Em minha barriga, tinha um pequeno volume, talvez pelo tempo que passei comendo, para compensar os dias que passei sem engolir algo. Eu simplesmente não me sentia normal, tinha algo estranho comigo.

– Marie? – ouço a voz de Cecília antes mesmo de ouvir a porta, e eu me viro aturdida na direção da própria, que estava com a metade do corpo para o lado interno do quarto. Ela me lança um sorriso, mas desfaz assim que percebe a minha expressão chorosa, me parece preocupada. – estava chorando?

– claro que não.– levei as costas de minhas mãos até meus olhos, limpando todo o vestígio de água do meu rosto apressadamente. Assim que termino, olho para ela, esboçando um sorriso nitidamente forçado. – viu? Estou ótima. O que deseja? – falei, não esperando que ela acreditasse, pois sabia que não colocaria fé em minhas palavras naquele momento.

Why should I care about you? - 𝙎𝙚𝙖𝙨𝙤𝙣 1.Onde histórias criam vida. Descubra agora