Oi, voltei.
Boa leitura!
Eu não conseguia respirar. Nem sei se conseguiria de novo. Eu sabia que precisaria, afinal não era meu dia de morrer, ou era?
Talvez esse dia realmente tivesse chegado depois daquela loucura. Meus pulmões começaram a ficar tensos lutando para conquistar ar, mas eu não queria. Eu não iria inspirar oxigênio afinal eu finalmente tinha controle sobre algo. Podia controlar meu corpo, minhas decisões, o meu futuro. Se eu parasse de respirar, o controle estaria mais presente sobre mim do que de qualquer outro momento em dias...
— Socorro, eu quero falar baixo nessa merda, mas eu estou tão puto que simplesmente não vou parar de falar. Vou ficar falando igual uma matraca sem fim porque é o único jeito que eu consigo manter a calma — Igor falava tão rápido que quase não acompanhei. — Bruno, seu idiota! Você estragou tudo! Eu culpo você se a gente morrer. O que é que deu na sua cabecinha louca que era a hora da gente fugir? Eu vou ter que fazer isso se não...
Igor voou em cima de Bruno estapeando meu namorado. Me vi na posição de intervir e naquele momento precisei respirar fundo o que eu não queria. Mas perdi o direito de ter o que queria assim que esse sequestro começou. Luana segurou Bruno com toda força enquanto eu puxava o ruivo na direção oposta.
— A gente precisa manter a calma, porra! — Luana foi capaz de dizer as palavras certas pra manter todo mundo calado e os meninos não quiseram continuar investindo na briga.
CONTROLE. Era o que necessitávamos naquele momento. É o que eu precisei minha vida toda.
— Agora que isso já começou, vamos até o final. Não podemos ficar aqui. Vamos sair e tentar se esconder, se ouvirmos alguma coisa — disse o que me pareceu melhor. Nem eu sabia se fazia sentido o que pretendia explicar.
— Iremos pra qual lado? — quis saber Igor e soltei um suspiro relembrando tudo que gravara daquele lugar em apenas alguns dias. Eu sabia que se voltássemos pelo caminho que viemos do refeitório não ajudaria. Já que pelos meus cálculos, do refeitório para trás entraríamos mais adentro no esconderijo em direção às salas do interrogatório, a sala do sequestrador e o covil de outros prisioneiros. Era viável escapar por uma rota alternativa. Toda vez que voltávamos para nossas celas, tinha um corredor que ia para um lugar que ainda não sabia qual era.
— Tem um corredor — falei depois de alguns minutos. — Na direção dos nossos quartos, tem um corredor que sai pela esquerda. Eu não sei o que tem lá, mas talvez seja uma opção.
Sem mais dúvidas, Bruno assumiu a ponta do grupo com a pistola trêmula nas mãos. Luana avançou ao seu lado com uma pose protetora. Eu e Igor seguimos logo atrás. Ninguém disse mais um A. Eu fiquei com medo da gritaria inicial de nosso pânico ter alertado alguém. Esperava realmente que não. Seguimos pelo familiar corredor principal que levava aos nossos quartos e logo demos de cara com o corredor menor que eu indicara do lado esquerdo.
Avançamos pelo corredor esquerdo menor e ele era limpo apenas com paredes brancas e sem portas. Nenhum guarda para o nosso alívio coletivo.
— Vocês não podiam ter esperado mais um pouco... Pra isso? — Igor indagou de repente e entendi que ele queria se referir a fuga, mas agora estava mais calmo e com melhor consciência para discutir a atitude de Bruno.
— Por quê? Você tinha tido uma ideia melhor para fugir por acaso? — Bruno rebateu na violenta.
— Não! — respondeu rápido demais. — Eu só achava que não era a hora certa. Talvez tivesse aparecido uma oportunidade melhor.
Igor estava sendo muito estranho com a gente nos últimos dias. Ele não aparentava estar triste, mas mesmo assim queria se manter distante. Nesses momentos, eu invejava Letícia e Lu que podem entender ele melhor do que ninguém. O ruivo sempre vinha passar algumas tardes comigo, mas eu nunca fora sua melhor amiga e nem passava perto disso, porém sentia que havia algo que ele não queria contar para nós.
Um barulho alto como um estampido forte ecoou pelos corredores o que nos assustou e nós quatro nos abraçamos institivamente como se pudéssemos proteger uns aos outros em um escudo humano. Fechei os olhos.
— Tá livre — a voz de Luana foi acolhedora. Como sempre era. Mas dessa vez foi melhor. Não tinha ninguém ali...
Nossa caminhada prosseguiu por cinco minutos até que o corredor desembocou em uma sala. Percebemos que tínhamos que nos abaixar para não sermos vistos. A sala tinha alguns homens e mulheres sentados em uma mesa extensa. Eles estavam com os mesmos uniformes dos guardas que nos vigiavam.
— Joga essa carta, seu maldito! — a voz grossa de uma mulher que era guarda, reverberou para todos.
— Clarice, você precisa ter mais amor por essa vida! — O “maldito” respondeu com uma voz ignorante. Do outro lado da mesa em que eles jogavam, estavam prisioneiros. Eles tremiam enquanto olhavam para o jogo de cartas. Tinham medo verdadeiro de seus vigias.
— Como vamos passar por essa sala? — meu namorado levantou a dúvida.
— Voando é que não é, né meu querido? — Ironizou o ruivo na situação.
— Os vigias estão focados no jogo de cartas. Eles estão de costas para a porta do outro corredor. Temos que passar por trás deles e seguir por aquele corredor — Luana disse o plano tão rápido que até me assustei. Ela é tão esperta. Parece estar muito no controle nessas horas de pressão e eu gosto disso.
— Mas e se os prisioneiros nos denunciarem? Os guardas estão de costas e não vão nos ver, mas eles sim — levantei a questão.
— Vai dar certo, confia — Por mais que a Luana me dissesse, a única coisa que faria naquele momento era confiar. Saímos do nosso corredor e entramos na sala ainda meio abaixados. Os guardas não notaram nossos passos e continuaram a gritaria do jogo de cartas. Os prisioneiros nos viram no momento em que chegamos, mas cansados demais para fazer uma bagunça apenas nos encararam com olhos arregalados. Levantei as mãos na mesma hora, fazendo sinal para que eles permanecessem em silêncio e nos ajudassem. Tentando conter a excitação de que não eram eles que estavam fugindo, os prisioneiros tentaram ficar quietos apesar de alguns gemidos.
— Quietos! — Clarice se levantou com as cartas na mão, olhando para os presos. Nossos pelos se arrepiaram com o movimento repentino de uma das vigias. Igor olhou pra mim de uma forma que quase pude sentir o coração dele saindo pela boca. — Quem é que vocês pensam que são?
Clarice voltou a se sentar e rir com o jogo de cartas. Murmurei para Igor ficar calmo. Torcia para que os guardas não nos vissem. Terminamos o pequeno caminho até a porta de saída e por um milagre, não fomos vistos. Nos permitimos respirar no novo corredor que entramos. Jurei internamente buscar justiça por todas aquelas pessoas presas. Eles ajudaram na nossa fuga quando sequer tinham coisas a ganhar com isso.
Andamos pelos corredores a esmo mais perdidos do que qualquer coisa. Meu corpo parecia cansado, mas sabia que não era uma exaustão física e sim mental. Anos atrás, meu treinador ensinou isso em um dos meus treinos quando explicou que além de tudo, nosso psicológico deveria ser o melhor preparado para as competições, ou melhor, batalhas! Era o nome que ele costumava dar para quando íamos competir algum torneio de ginástica. Não íamos competir, íamos batalhar.
Nenhum guarda apareceu mais, o que pareceu ligeiramente suspeito, contudo tomamos susto quando nos demos de cara com a prisão da mãe de Bruno. A lembrança ainda estava viva na minha mente. Stephen mostrou elas pelas câmeras e socou Bruno sem parar naquele dia. Lembrar disso ainda me deixa desesperada o que me lembra que não podemos falhar no plano da fuga. Controle, Manuela. Controle.
— Será que tem como tirarmos elas? — indagou Bruno quase que imediatamente. Seu rosto demonstrava fúria e esperança ao mesmo tempo. A cela da família dele era completamente de ferro com apenas um monitor para fora que dias atrás, Stephen colocou sua palma da mão para reconhecimento e surgiu a imagem da senhora Pereira e a filha. Nem imagino o que meu namorado tá sentindo. Aproximo dele e seguro sua mão como uma forma de conforto.
Posso sentir o olhar queimante de Luana sobre nossas costas.
— Eu acho que provavelmente não vai dar, Bruno — sussurrou Igor. Era a primeira vez que via ele se pronunciar algo com cautela em dias. Até mesmo nosso ruivo sarcástico se compadeceu com a situação. Era um tremendo impasse. Se fôssemos embora, poderia ser que minha sogra e cunhada fossem torturadas ou morressem. Porém tentar tira-las de lá era impossível e caso não fugíssemos naquele momento, talvez nunca mais surgisse uma nova chance.
— Temos que ir... — pronunciou Luana, mas ela foi cortada por um barulho que passou zumbindo pelas nossas orelhas. Tomamos susto porque o barulho foi muito alto e a única coisa que fiz foi abaixar a cabeça. Meus ouvidos rangiam pelo barulho, mas assim que pude, levantei novamente para ver da onde aquilo viera. Ao olhar para o lado, me deparei com o monitor da cela quebrado em vários estilhaços. Havia um projétil que perfurara o monitor. Quando olhei para a outra extremidade do corredor, avistei Stephen com um revólver na mão e uma expressão vingativa.
— Vocês acharam que iriam fugir sem nem mesmo me chamarem para a festa? — Meu corpo não sabia como reagir naquele momento. Nossa fuga... Estava ruindo. Sem controle.
Assim que reparei, Bruno já estava correndo e eu também. Ele usando todo o seu físico que não treinava há dias e eu o mesmo. Não corremos em direção oposta ao Stephen. Por mais que pudéssemos ser atingidos por uma bala, avançamos para cima do homem de cabelos vermelhos. Ele ficou surpreso com a nossa reação e deixou a arma cair no chão. Bruno aproveitou da desvantagem para agarrá-lo com uma chave de braço. Com a força dos meus pés chutei a arma de Stephen para longe e ela acabou retinindo contra a parede, porém sem disparos. Bruno segurou Stephen que tentava fugir do golpe, mas permanecia preso.
— Eu acho melhor tu ficar calado ou se não arregaço essa sua cabeça! — A voz de Bruno saiu tão forte e tremida ao mesmo tempo de uma forma que nunca tinha visto. Aquilo não me assustou. Pelo contrário, acalmou. Tudo que nos fazia voltar a ter controle sobre a situação me agradava. E assim quem sabe, fugiríamos.
— Sabe, nunca critiquei! — Palmas surgiram e notei que era Igor — E você, Luana? Sempre amamos a Manu e o Bruno, não é? Sempre falamos bem. Que casal esses dois formam!
— Para de ser um falso do caralho. Sabemos que você não gosta de mim! — Bruno continuou tentando conter Stephen até finalmente bater no homem com uma coronhada fazendo o mesmo ficar atordoado.
— Eu? Jamais! — Igor fez uma pose como se estivesse sendo ofendido. Luana caiu na risada sem se conter. Tanto eu quando ela sabia que Igor falava muito mal de Bruno em todos os sentidos. Que ele era um jogador metido, um bonitão com vida ganha e rei de tudo. Eu nunca briguei com ele porque sabia que era uma brincadeira e que ele gostava de implicar com Bruno que boa parte do tempo não falava muito e tinha sua cara fechada.
— Ai, Igor, você tem noção que é uma pedra lapidada? — Luana continuou sua risada e me diverti com seu sorriso. Bruno suspirou abrindo um sorrisinho apesar de tudo. Igor, além de rir sobre a brincadeira tinha uma cara estranha como se estivesse envergonhado.
— É claro que tenho noção — respondeu se achando. — Essa ruiva aqui... Quer dizer... Eu quis dizer ruivo. — Rimos com sua encabulada. Ele pareceu olhar para outro lado fingindo que não aconteceu.
— Tá certo, ruivinha — brincou Bruno empurrando Stephen contra a parede. — Você é muito engraçadinha, mas temos um sequestro pra fugir, não é Stephen? Seu filho da puta.
— Quem diria? O Brunaca tem senso de humor! — Ri mais uma vez diante outra sentença de Igor — Seu senso é meio mórbido, mas tá no caminho. Vem comigo que você aprende muito.
— Beleza! Mas antes tenho que cuidar desse outro ruivo aqui — Ele pressionou a arma contra as costelas de Stephen que ganiu de dor com o desconforto da arma. — Você vai ficar quietinho, nos levar pra saída desse lugar e tirar minha mãe e irmã dessa cela. Agora!
Bruno empurrou o sequestrador na direção do monitor com força sem tirar ele da mira. Do jeito que eu conhecia meu namorado, ele atiraria sem pestanejar. Quando dependia da família, ele era capaz de tudo.
— Eu atirei no monitor, seus idiotas! A mãe e a irmã estão presas lá dentro e a única forma de tirá-las, é indo na sala dos sistemas desse lugar — o sorriso vil não largava o rosto dele. — Ou seja, terão que me levar para o quarto do chefe do sequestro.
Ele começou a rir sem parar como um louco.
— Cala a boca! — Igor desceu um soco nele sem pestanejar. — Meu Deus, como eu queria socar essa sua cara!
— Não tem como saber se ele está falando a verdade — constatou Luana e tinha razão. — Eu sinto muito Bruno, mas a minha ideia é sair daqui o mais rápido possível, procurar a polícia e torcer pra que elas fiquem bem. E temos que levar esse idiota junto, já que agora ele nos viu.
Bruno olhou para Luana com otimismo. Ele sempre olhava assim para ela. Eu não entendia, ou melhor, eu entendia sim. Ela era maravilhosa, talvez não tivesse noção disso, mas era a que mais tinha controle de todos nós, incluindo Samu e Letícia. Eu a olhava com admiração hora ou outra.
— Nos leve para fora daqui! — Bruno empurrou Stephen mais uma vez. Aquele maldito não arrancava o sorriso de merda do rosto. Que ódio! Maluco...
— Pelo visto não estou em posição de pedir nada, né seus merdinhas?
— Claro que não! Tá cego por acaso? Segue seu rumo! — Ordenou Igor e Stephen se rendeu começando a andar vacilante pelo corredor na direção da direita. Seguimos logo atrás e Bruno manteve a arma como uma ameaça visível.
Fomos seguindo pelos corredores a frente e começamos a reconhecer o caminho. Com certeza era o percurso que fizemos no primeiro dia. Chegamos a uma escada de pedra que eu sabia que já passamos por ali uma vez.
— Ele não está mentindo sobre o caminho — afirmei e todos me olharam. — Não sei se vocês se lembram, mas passamos por aqui dias atrás.
— Você se lembra? — Luana olhou para mim, curiosa.
— Sim. Eu gravei cada canto daqui. Eu sabia que se tivéssemos que dar depoimento ou fugir, teria que guardar alguma coisa. — Tanto Bruno quanto Luana sorriram na minha direção e entre si como um cumprimento silencioso. Fiquei confusa. Igor parecia perdido nesse momento.
— A partir daqui, terão muito mais guardas. Como pretendem passar? — Stephen estagnou de repente quando alcançamos um saguão vazio. — As entradas e saídas desse lugar são muito mais vigiadas.
— Arranje um jeito pra gente sair! — Bruno foi incisivo.
— Tem uma forma, mas vai dar trabalho...
— Como sabemos se podemos confiar nele? — Igor perguntou, nervoso e se escondeu atrás de Luana. Ela soltou um tapinha nele, repreendendo-o por fazê-la de escudo.
— Não podemos, mas acho que ele não quer acabar com uma bala na cabeça — falei olhando nos olhos de Stephen. Eu desejei que ele tremesse sob meu olhar, mas apenas abaixou a cabeça.
— Vamos por aqui — Stephen mandou continuarmos pela mesma rota, mas acabamos chegando em um elevador. Esse era diferente do que o que andamos no primeiro dia. Menor e quase sem nenhuma iluminação. Parecia aqueles elevadores de minas que vemos nos filmes. Ele era tão arcaico que só foi acionado com uma alavanca. Tremulou com sua tecnologia antiga e começou a subir.
— Olha no que uma festa nos enfiou! — Lu bateu a mão na própria testa — Estamos em um elevador que está nos levando para o fim do túnel... — Ela se referia ao teto gradeado. Podíamos ver que no fim da subida tinha uma luz extremamente forte brilhando. Depois de um tempo, o elevador parou em um andar diferente. Fiquei assustada. O andar era escuro e estreito. Parecia ter apenas um corredor.
— Um minuto atrás, vocês estavam com pose de durões e agora ficam com medo de um corredorzinho escuro? — zombou Stephen.
— Fica quieto. Eu te perguntei alguma coisa? — Bruno disparou. Tanto eu como Lu e Igor trincamos os dentes.
— Cara, você tá passando muito tempo comigo. Tá grosso, sarcástico e imprevisível. — Igor listou e aquela quebra de clima nos ajudou a avançar pelo corredor estranho.
As lanternas dos celulares fizeram uma grande falta. O chão não parecia cimentado e sim desnivelado e cheio de pedras. Aquele lugar parecia em uma condição bem diferente do esconderijo onde estávamos.
— Onde você trouxe a gente? — Eu não podia negar que toda aquela situação trouxe o lado mais maduro e sexy de Bruno. Eu conhecia seu lado bobo, romântico e indie, mas não aquele bad boy. Eu gostava desse novo.
— No quadro de força. Da parte externa do esconderijo — respondeu Stephen. — É aqui que está conectado tudo sobre a parte de fora para fugirmos.
— E cadê o tal quadro?
— Por aqui... — Stephen deu dois passos e de repente caí no chão. Alguém me empurrara. Estava tudo escuro e não consegui ver nada. Minha mão ardeu com um machucado ao bater no chão. Gritos começaram a ecoar pelo corredor escuro. Identifiquei a voz de Luana e depois a de Igor.
Levantei do chão com medo verdadeiro. Voltei alguns passos para trás fazendo força para enxergar o que acontecia, mas o breu era denso. Um grito muito agonizante veio de Luana e naquele momento meu coração se partiu. Avancei pelo corredor a procura dela. Não podia perdê-la. O que é que estava acontecendo?
— Vocês estão bem? — Perguntei e Bruno me respondeu positivamente, Igor também, mas não ela. Continuei procurando e minhas lágrimas já tinham empoçado todo meu rosto. Chamei por ela e nada. E logo as luzes se ligaram.
— AHHH! — Um grito de fúria surgiu. Pude ver Luana acertando um homem com uma grande arma no rosto dele. O homem tombou para o lado e ela me olhou sorridente. Corri para ela enquanto a mesma largava a arma no chão. Abracei minha amiga como nunca tinha feito.
— O que houve? — Indaguei enquanto ela arfava. Bruno segurava Stephen perto do quadro de força que finalmente enxerguei. Igor estava com mãos sobre a boca, assustado.
— Calma, Manu — notei que ela tentava recuperar o ar. — Estou bem. Tinha um guarda aqui dentro. Quando cheguei no fundo do corredor ele colocou a arma contra minha cabeça e senti na hora. Lutei contra ele no escuro e gritei quando ele tentou me asfixiar, mas consegui me livrar... — Abracei ela mais forte e a mesma riu. — Eu sou foda pra caralho. Acabei de deter um soldado armado. Tá bom que foi no escuro e tive sorte, mas me defendi...
Igor a abraçou em seguida e senti em Bruno um olhar de alívio.
— POR QUE NÃO DISSE QUE TINHA UM GUARDA AQUI EMBAIXO? — A voz de Bruno saiu forte e ele desceu mais uma coronhada na bochecha de Stephen. O sangue despontou da boca do sequestrador.
— Eu não conto todos os meus segredos — arfou rindo. Bruno empurrou o homem mau contra o quadro de força.
— Faz o que tem que fazer e se fizer merda de novo, eu juro, juro que atiro em você! — Stephen não parou de rir e acho que aquela cena ficaria presa na minha cabeça pra sempre. O dia que em que eu perdi o controle no breu com um sociopata e seu sorriso.
Stephen começou a mexer no quadro de força e em seus cabos. Ainda não tínhamos a ideia completa do que seria o plano. Então ele puxou alguns plugues das tomadas e a luz do teto piscou e não entendi o que aconteceu.
— E agora? Como fugimos? — perguntei confusa.
— Corremos. Temos dez minutos até a energia voltar — ele indicou o elevador com a cabeça e o seguimos. Tudo era muito estranho e Bruno não vacilou com a arma. O elevador começou a subir novamente. Agora não tinha uma luz no fim do túnel. Tudo estava escuro quando se olhava pelos buracos do teto do elevador. De repente, o cubículo metálico estabilizou e Stephen saiu para fora. Respirei ar puro. Olhamos ao redor, tensos. Quase gritei de empolgação.
— A lua — apontei com o dedo e Igor sorriu ao ver. Sorrimos juntos. Estávamos do lado de fora!
— Não temos tempo para ficar observando o céu. — Stephen foi grosso e começamos a andar. Fomos andando por um corredor com várias grades que mostravam o lado de fora. Pela luz da lua, avistei uma... Floresta?
Chegamos ao fim do corredor gradeado e de repente começou uma gritaria e correria.
— A luz acabou! Mandem alguém resolver isso! — Deveria ser um guarda que dera a ordem. Era para isso que o quadro de força tinha sido mexido. Para que não fôssemos vistos na fuga. A esperança inflou em meu peito como fogo, contudo a cacofonia dos guardas nunca cessou, nem sua correria.
— Se joguem no chão! — Mandou Stephen e fiz o que ele mandou, confusa. Meus amigos também me seguiram, em dúvida. — Vamos nos arrastar até o portão para não sermos vistos, vai ser por trás dos carros.
Ele foi se arrastando e acompanhamos seu ritmo. Bruno ia logo atrás dele com força e a arma em punho. Eu e os outros dois seguimos. A terra riscava meu rosto ao me arrastar. Aquilo dava muito nervoso. Guardas andavam para todos os lados em continência e aquilo fazia meu coração retumbar.
Parecia que íamos rastejar infinitamente ocultos pela fileira de veículos. Agradecia pelas minhas aulas de ginástica que facilitaram o movimento que exigia todo o esforço do corpo. Meus amigos não disseram mais nada, mas podia sentir seus pensamentos a mil.
Chegamos atrás do último carro e nos permitimos ficar agachados de forma mais fácil.
— O portão é logo ali. — falou Stephen e vimos o portão aberto. — Agora corram. A floresta é logo atrás.
— Você vem com a gente! — Bruno não afrouxou o aperto no pulso de Stephen. — Diz quando é pra correr.
Alguns guardas passaram e outros minutos se arrastaram, até que o caminho ficou livre.
— Vai! — Ele gritou de forma sussurrante e corremos como se dependêssemos daquilo. Vimos a floresta e fomos em direção a ela. Começamos a chegar perto das altas árvores.
— Lá! — Escutamos alguém gritar e de repente, a clareira em volta de nós e toda a saída do local ficou clara. O escuro se foi e junto vieram luzes de estádio. Homens correram e nos cercaram com armas e não pude raciocinar o que aconteceu.
— Por que as luzes se acenderam? — Indagou Bruno com ódio na direção de Stephen que já estava voltando para os outros guardas.
— Porque eu mandei um sinal de ajuda e vocês nem perceberam. Agora estão presos de novo. — Ele riu e quase chorei. Aquilo só poderia ser o inferno! Escutei a arma de Bruno cair no chão e um homem veio pra cima de mim. Ele colocou um pano com cheiro forte no meu rosto e desmaiei no minuto seguinte.
Sem controle.
XXX
Minha mente nunca ficou tão entorpecida daquele jeito em toda minha vida. É claro que as drogas ajudavam, mas eu estava me segurando para o vício não perder o controle. Minhas veias pareciam começar a inchar sempre pedindo por algo mais forte, quando a maconha não resolvia. Eu consigo me lembrar de algumas regras que criei para não dar tudo errado.
Se drogar apenas em festas dos fins de semana;
Ir pra casa do Bruno se eu usasse alguma coisa;
E jamais deixar que meus pais descobrissem.
Tomei coragem de abrir os olhos, cansada da moleza do meu corpo. Acima de mim tinha uma enorme lâmpada branca que tentei ignorar. Olhei para os lados e pude ver meus braços presos a duas pulseiras de ferro, uma de cada lado. Tentei me mexer, mas o meu corpo parecia estar em uma eterna inércia. Minha voz não saia mais do que gemidos roucos.
— Parece que alguém acordou — a voz que eu menos esperava. A voz que vinha imperando meus pesadelos, mentiras e problemas. O sequestrador.
— O que você... — tentei me recuperar falando, mas então senti outras coisas. Meus pés também estavam presos por tornozeleiras de ferro e aquilo me mantinha presa a uma fria cadeira metálica . Em um dos meus braços, tinha uma agulha espetada e algo estava sendo injetado em minhas veias. Olhei para agulha e esmaeci finalmente sentindo a dor dela.
— Eu tinha que te manter calma — seu olhar frio se arremeteu para o fio de plástico que injetava alguma espécie de droga pra me manter calma. Eu estava muito desesperada, mas era como se meu coração nem se movesse no ritmo do meu cérebro. Eu precisava de controle...
— Sabe, Manuela. Você e seus amigos, transgrediram algumas regras que já mais poderiam ser quebradas. Tentaram fugir de mim. Eu recebi a notícia e fiquei realmente surpreso, eu achei que todos nós estávamos chegando em algum lugar! Que vocês estivessem cedendo... Ou melhor, acreditando! — apontou seu dedo na minha cara e estremeci com uma raiva que nunca vi nele antes. Seu terno parecia estar mais branco hoje.
— Cadê eles? — comecei a espernear com as pulseiras e as tornozeleiras roçando minha pele. — Me leve pra eles agora! Eu preciso vê-los! — implorei por meus amigos como se fosse por ar. Será que eles estavam bem? Lu? E Bruno? Igor?
— Eu acho que não é o momento de você ir vê-los! — Ele andou para próximo de mim. Puxou a mão do bolso e brandiu um canivete contra a minha bochecha. Senti a faca descendo pelo meu rosto, desde por baixo dos meus olhos até o queixo e o começo do pescoço. O machucado ardeu e o sangue jorrou pela minha face.
Aquilo era o mais próximo que eu podia sentir da morte. Talvez fosse até pior do que morrer de verdade. Eu sabia que gritar não valeria a pena, ninguém apareceria pra ajudar diante daquela situação. Eu precisava estar no controle mesmo no meio daquele desespero.
— Você, Manuela, é uma pessoa muito má! É pior do que eu. Não vou admitir que você tenha controle sobre algo. Depois de tudo isso, eu descubro que você fugiu e me traiu. Influenciou todos os seus amigos!
— Não seja bobo! Eu não influenciei ninguém — gritei sentindo o sangue descer. — Nós decidimos fugir juntos. Preferíamos morrer tentando sair dessa merda de lugar do que morrer nas suas mãos.
— E quem disse que vocês iriam morrer? Eu ofereci um banquete a vocês por terem escutado com carinho minha história. Eu dei quartos e banheiros para vocês viverem. Eu nunca os torturei! Tinham que demonstrar clemência e crença, sua insolente! — Agora o canivete acertou meu braço. Um novo filete de sangue. Gani diante de mais líquido escarlate. Eu já poderia prever as próximas horas. Drogada por alguma coisa que ele colocava no meu sistema, cortada de todas as formas por aquele canivete e delirando por um sinal de esperança.
— Eu vou dar um tempo para você pensar nas coisas que tem dito para mim — saiu da sala sem dizer mais nada.
Eu tinha dito várias coisas para ele naquelas sessões idiotas. Claro que era tudo mentira. Nada sobre meus pais, nem sobre minha história. Eu jamais revelaria uma verdade. Aquilo era perigoso e não queria mais nenhuma pessoa envolvida nesse sequestro. O que será que meus pais faziam naquele momento? As vezes parava pra pensar nisso. Me procurando? Poderia ser. Achando que eu já tinha morrido? Talvez...
Podia quase enxergar minha irmã mais velha voltando para Pelotas com seu rosto preocupado. Fazia tanto tempo que eu a via. Eu a amava muito e sempre foi uma inspiração para mim e foi quando ela decidiu ir embora que experimentei a primeira droga. Foi assim que a montanha russa começou a descer. Rápido. Muito rápido.
Comecei a chorar e as lágrimas alcançaram o corte na minha bochecha. Ardia muito, mas me recusava gritar e não gritaria até o fim. Logo começou a me faltar ar, muito ar e quase desmaiei. Acho que era mais um daqueles ataques. De quando eu ficava completamente descontrolada e isso parecia refletir nos reflexos do meu corpo.
Muito tempo se passou. Pelo menos parecia na minha cabeça. A luz continuou ligada, mas tentei fechar os olhos e fingir dormir. O sangue parou de escorrer em bicas e fez uma camada na minha pele. Eu deveria estar deplorável.
Quando eu menos imaginava a porta se abriu novamente. E lá estava ele.
— Me diga a verdade. Será o caminho mais fácil. Ou se não terei que optar pelo caminho complicado — parecia bem mais calmo que na primeira visita. Não sabia dizer se era melhor já que seus lábios pareciam frios.
— Eu não sei o que você quer que eu diga. Já disse tudo. Meus pais e eu somos de descendência árabe e fugimos da guerra! Foi o pior momento de nossa vidas apesar de eu ainda ser uma criança. Demos sorte do meu pai ter um dicionário em inglês e isso nos ajudou a nos comunicar na viagem. Chegamos no Brasil e ele conseguiu um trabalho começando a arranhar o português. Deixamos o passado e prosperamos. Mas tenho medo de ser abandonada até hoje.
— Ingênua. Repete tanto a mentira que até se perde nela. No primeiro dia você conseguiu me enganar com aquela cara triste. Eu me compadeci a sua história de refugiada. Mas você começou a contar versões diferentes. Em uma delas, seus pais morrem. Em outra, eles tentam te mandar embora com uma tia e agora eles estão vivos? Achei que você era mais inteligente, Manuela.
Comecei a pensar. Eu tinha me perdido? Ele tinha razão! Senti minha boca ficar seca quando as lembranças voltaram à tona mostrando que a história tinha realmente mudado. Ele preparou o canivete novamente e atacou minha perna dessa vez. A ardência voltou com força e rugi com ódio em seu olhar. Ele não esboçava reação. O corte pegava do tornozelo pela extensão da batata da perna e dessa vez, um corte profundo.
— E agora, vai me falar a verdade? — O canivete sujo como uma ameaça.
— Vai ter que trabalhar muito para isso — afirmei sem medo. E ele trabalhou. Não fez mais perguntas nos minutos seguintes e me cortou por todo o lado e a única coisa que pude fazer era gritar. Dessa vez não me contive mais em não gritar. Minha pele estava quase invisível em meio ao sangue. Tinham cortes que ele forçava o canivete para dentro e pensei que aquelas cicatrizes ficariam ali para sempre possivelmente. Aquele momento ficaria incrustado na minha mente o resto dos dias.
A dor. A luta. E o controle.
— Pelo visto esses simples cortes não estão funcionando. — Ele foi ao fundo da sala e voltou com um galão branco. — Mas eu nunca paro por aí. Vou te perguntar mais uma vez... Vai me dizer a verdade?
— Nunca... — disse cerrando os punhos e tentando ignorar toda ardência, dor e sangue escorrido.
— Eu não sinto muito — e jogou o líquido do galão em mim pela a cabeça. O cheiro atingiu forte meu nariz ao mesmo tempo que o álcool invadiu meus olhos queimando eles. Gritei da forma mais dolorida e minha garganta ficou rouca. O álcool escorreu para dentro de todos os machucados da minha pele e pude sentir as feridas pulsando.
— Você se levou a isso, Manuela. Eu não tenho culpa nenhuma. Isso pode acabar. Apenas me diga a verdade. — Ele me encarou, mas eu não podia mais enxergá-lo. Era apenas uma silhueta em meus olhos embaçados.
— Se vai relutar, eu vou ter que continuar. E eu posso — pude perceber que ele se aproximou novamente com o canivete.
— PARA! — Arfei. Ele parou exatamente no momento que iria enfiar aquilo na minha pele novamente. — EU AMO OUTRA PESSOA! EU ESTOU NAMORANDO UMA PESSOA QUE NÃO QUERO!
Falei a primeira verdade que veio na minha mente. Será que aquilo bastaria?
— Meus pais estão vivos. Não somos árabes. Nascemos no Brasil e vivemos aqui desde então. Temos descendência mexicana, mas isso não muda nada. Pronto, você tem sua verdade — resolvi dizer tudo de uma vez.
— Finalmente, algo que eu queria. Eu já sabia sobre seus pais. Descobri tudo com seus amigos faz horas. Eu só queria que você me obedecesse e a tortura era preciso. Acabou que você me contou uma verdade até mais interessante. Alguém aqui traiu o Bruno? — Contar a verdade foi como soltar um peso e adormeci com o sorriso do sequestrador e muita dor. Mas antes de desmaiar completamente, ouvi ele dizer alguma coisa:
— Meu nome é Khalil Salim e todos devem me respeitar. Eu sou o profeta.
XXX
Acordei caída no chão da cela. Levantei pulando de susto. Olhei para os meus pulsos e pernas procurando as tornozeleiras e as pulseiras de ferro. Elas ainda pareciam pesar no meu corpo e ainda tinha nuances dele vindo em minha direção pronto para me cortar. Meu olho estava fora de foco e um ardor tremeluzia na minha visão.
Minha pele estava com todos os machucados abertos ainda. Comecei a chorar de dor. Me arrastei para a parede do fundo da cela pedindo para que tudo o que aconteceu fosse um mero pesadelo que ficaria apenas na memória quando voltasse a viver novamente.
Fui em direção ao banheiro muito devagar com tudo doendo. Seria melhor se eu lavasse aqueles machucados. Estando em completo choque, girei o registro e água que desceu lavando os cortes na clavícula, braços, pernas, rosto e barriga. Eu estava em carne viva e não via saída para isso.
Gritei de dor mais uma vez. Mas uma informação me fez esquecer tudo por um micro segundo. Seu nome era Khalil Salim. Ele era filho de Samira e viveu toda sua infância, solitário em uma vida destruída. A religião provavelmente fora sua única saída, mas nem todos os preceitos islâmicos foram o suficiente para salvá-lo. Era um psicopata. E agora estava deteriorando outras vidas.
Jurei comigo mesma no chuveiro. Iria matá-lo.
XXX
— Manu? Você está aí? — Luana me chamara pela parede, porém nem sabia como responde-la. Sentei na cama com as gases que tinham largado no quarto. Khalil deveria ter mandado deixar. Como se aquilo fosse adiantar de algo. O álcool inflara todos os meus machucados e tentava disfarçar que a dor já era normal.
— Oi... — respondi fracamente, incerta se eu queria mesmo conversar. Mas ouvir a voz dela já foi tudo. Aquilo já acalmava meu coração imensamente.
— Ai graças a Deus, você tá bem... Meu coração estava tão apertado. Eu pensei em orar mesmo acreditando tão pouco. Manu, o que ele fez? — A pergunta me atingiu em cheio e as lembranças voltaram como cicatrizes.
— Ah... — Gani como se toda a dor tivesse voltado intensamente e escutei Luana gritar desesperada do outro lado.
— Você quer que eu vá aí? Juro que quebro essas paredes. Não posso continuar escutando isso — o choro dela foi pior que todas as dores e afastei meus pensamentos ruins para chegar perto da parede para que ela me ouvisse melhor.
— Calma Lu, eu tô bem. Me perdoa se eu te fiz sofrer. Eu estou com muita dor e não há nada que você possa fazer para me ajudar. Aquele retardado me torturou e agora estou assim — choraminguei e ela chorou comigo.
— Eu juro que eu posso ajudar. — ela jurou, mas eu sabia que não tinha nada a fazer.
XXX
— Agora que vocês jantaram, teremos uma mudança de rotina! Pelo o que vi, todo mundo sofreu consequências por causa do que aconteceu dois dias atrás.
Tínhamos terminado de jantar no refeitório. Stephen aparecera para dar o ar da graça assim que largamos os talheres. Não conversamos muito entre nós. Bruno parecia arrependido e encarava minhas cicatrizes e bandagens toda hora. Eu tentei cobrir o máximo possível os ferimentos, porém foi impossível deixar tudo encoberto. Luana decidiu segurar minha mão o tempo todo. Não largou por um segundo sequer. Era o primeiro toque bem vindo de alguém depois da última pessoa que me tocou e cortou.
— Que mudança de rotina? — Igor mirou Stephen com menos coragem do que ele costumava demonstrar.
— Uma reunião! Essa reunião vai durar até tarde. Não é uma reunião normal. Teremos convidados interessantes. E para isso eu vou pedir para cada um ser acompanhado por um guarda diferente. Todos irão se preparar em salas separadas. Espero mesmo que nenhum de vocês faça besteira alguma no dia de hoje. Acho que o chefe não vai ter a misericórdia de torturá-los da próxima vez. Vão direto para a morte.
Eu com certeza ia preferir mil vezes a morte do que aquilo. Ainda sentia o álcool fervilhando.
Stephen continuou sorrindo para nós quando um guarda me pegou pelos cotovelos. Minha mão soltou da de Luana à força e olhei de forma triste para ela. Não queria me separar dela. De nenhum deles. Talvez fosse levada para uma nova tortura. E se a reunião fosse só um pretexto? Fui caminhando pelos corredores com o robusto guarda e por mais que quisesse, não tive forças de gritar. O medo, ele estava muito maior do que qualquer coisa. Maior do que o controle ou descontrole.
Suando muito frio e depois de muito andar, o guarda me empurrou para dentro de uma sala e bateu a porta atrás de mim. Me deparei com um cômodo escuro do qual não podia visualizar nada. Tateei pela frente e nada.
— Olá? — pronunciei.
— Manu? — A foz de Luana invadiu meus ouvidos. Pensei estar delirando já que tinha acabado de deixa-la no refeitório. Me aproximei seguindo sua voz. Nossos braços se encontraram no escuro e encontrei firmeza. Ela passou a mão por alguns dos meus cortes e estremeci com a exploração repentina. Nos abraçamos com força. Não fazia ideia de por que viemos parar na mesma sala e por que não tinha percebido antes que precisava tanto de um abraço real como aquele.
— Como viemos parar aqui? — Sua dúvida foi acompanhada das luzes que se ligaram. No canto da sala havia um cabideiro com vários estilos de roupa.
— Ele disse que teríamos que nos preparar. Temos uma reunião. — afirmei. Ela parecia anestesiada e não ligou muito para o que eu disse. Continuou a passar a mão e a averiguar toda a minha tortura. Achei estranho ela querer passar a mão em cada ferimento meu, porém não demorou muito para que me debulhasse em lágrimas e caísse no chão sofrendo. Luana não perdeu tempo e se ajoelhou. Ela beijou minha mão em um movimento fofo e antigo, seus beijos avançaram pelos meus cortes.
Meus machucados apesar de doloridos, puderam receber uma dose de euforia com aqueles beijos curtos e intensos ao mesmo tempo. O toque de seus lábios em minha pele foi libertador por alguns segundos. Lu ficou bem próxima depois de ter beijado meus braços e rosto. Seus olhos penetraram nos meus. Aquelas órbitas da escuridão que eu tanto amava e que me levava paz nos momentos mais doidos.
— Eu jurei que podia ajudá-la na cela quando estávamos separadas e agora estou cumprindo minha promessa. Aceito suas cicatrizes, Manu. Nem que seja para beija-las pra provar que você não as merece, nem jamais merecerá. — Ela beijou uma última vez a cicatriz que marcava meu pulso. Me permiti sorrir.Não esquece da estrelinha, porque eu voltei bitches!
Amo vocês!
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Nós Odiamos O Amor (CONCLUÍDO)
Teen FictionEra para ser mais uma festa normal, porém um desaparecimento aconteceu. Em Pelotas, Rio Grande do Sul, um grupo de seis amigos resolvem sair para badalar na cidade vizinha, mas somente dois retornam daquela festa. Samuel e Letícia vieram embora mais...