Samuel Sábado, 24 de Junho, 19:07

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Pago pela maçã do amor e, antes que consiga dar a primeira mordida, meu celular toca no bolso traseiro da minha calça e preciso atendê-lo

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Pago pela maçã do amor e, antes que consiga dar a primeira mordida, meu celular toca no bolso traseiro da minha calça e preciso atendê-lo.

- Alô? Mãe?

- Samuel? Onde você está meu filho? – a voz dela está abafada pelo barulho de música e vozes altas. Ela parece estar em uma festa. Qual será o evento beneficente ou o jantar de gala da noite?

- Na minha escola mãe, estamos tendo nossa Festa Junina hoje. – preciso falar alto, pois também estou cercado de vozes e música alta.

- Já estou sabendo, o Aderbal nos buscou no aeroporto e nos contou. Disse que vocês estão fazendo um trabalho muito bonito de arrecadação de recursos com a renda das barraquinhas para doarem à uma ONG que cuida de crianças carentes não é isso?

- É isso mesmo. O Zé Roberto, nosso diretor, quis contribuir com essa ONG que o pai de uma aluna ampara. Ele disse que eles estão precisando muito de uma reforma na estrutura da casa onde ela funciona.

- É muito nobre da parte dele, filho. Você sabe como seu pai e eu nos importamos com as causas sociais, não é? Por isso viemos até aqui, queremos fazer nossa contribuição pessoalmente.

- Aqui? Aqui onde? – alarmes internos disparam pelo meu corpo. Os ouvidos zumbem, o coração acelera e os olhos percorrem frenéticos a multidão.

- Na escola, oras, estamos cruzando o portão de entrada neste minuto. Poderia vir nos encontrar por gentileza?

- Sim, sim. Já estou indo. Não saiam daí. – digo com urgência e disparo em direção ao pátio do colégio.

Cruzo a quadra em velocidade fazendo as barraquinhas adornadas com bandeirinhas e luzinhas, e recheadas de objetos multicoloridos, parecerem um borrão de cores.

Quase derrubo uma banquinha baixa, de pé de moleque e cocadas, que não enxerguei e, ainda em velocidade, dou um salto sobre uma fogueira falsa, de papel celofane, fazendo às vezes de fogo em meio a galhos tortos.

Acho que me empolguei com a trilha sonora de "Pula a fogueira". Eu teria dado um Google no meu iPhone para descobrir se existe alguma superstição nisso, mas preciso encontrar meus pais rápido, antes que eles resolvam fazer um tour pelo colégio e deem de cara com a Babi.

Eles não fazem nem ideia de que estou namorando e muito menos quem. Eu ainda não pretendia apresentá-la aos meus pais. Coitada, Babi não tem a menor noção de onde se meteu ao aceitar namorar comigo. Não é justo lançá-la aos tubarões assim, no escuro, sem nem ao menos prepará-la para encarar a mandíbula mortal. Dona Marieta não é fácil. Suo frio só de imaginar as barbaridades que ela pode disparar quando souber que ela é filha de professores. Lembro bem do que os namorados sem sobrenome ou origem nobre, da Stela e da Sabrina, sofreram na mão dela.

Minha esperança é que meu pai veio junto. Normalmente ele é mais sensato, talvez consiga segurar a onda da minha mãe e evitar maiores constrangimentos.

Dobro a esquina no corredor da sala do 1º ano e chego ao pátio, na entrada do colégio. De longe avisto os um metro e noventa e cinco do meu pai se destacando na multidão. Desvio das diversas pessoas vestidas à caráter e finalmente paro diante deles.

- Samuel! Você está hilário com este bigodinho filho. – minha mãe e seu distorcido ponto de vista sobre as convenções sociais me saúda.

- Oi mãe, o bigode pintado com carvão é praticamente obrigatório, é tradição da caracterização em festas juninas. – respondo amargo.

- Tá engraçado mesmo. Não combina com você – Samantha dá risadinhas e eu sorrio sem vontade pra ela.

- Já entendi Samuel, agora nos leve depressa até o diretor, por favor. Quero entregar esse cheque. Estamos exaustos da viagem e ainda temos chão até Caiscais.

- O diretor? Não precisa mãe, eu entrego por vocês, podem ir descansar. – sugiro mais do que depressa.

- Eu gostaria de entregá-lo pessoalmente. – meu pai intervém - Quero cumprimentá-lo por sua bela iniciativa e exemplo para os alunos.

- Isso mesmo Orlando – minha mãe o apoia.

- Mas ele está lá na quadra preparando a quadrilha dos professores. Vocês vão precisar esperar por ele e vão pegar o maior trânsito até em casa.

- Ele não quer que vocês se encontrem com o diretor, porque ele é o sogro dele. – Samantha cai na gargalhada.

- Sogro? Como assim sogro? – alarmada, minha mãe olha com espanto para minha irmã e troca olhares significativos com meu pai. Certamente reprovando o fato de que minha namorada não seja exatamente da alta sociedade.

- Dã! Mãe, ainda não sacou? O Samuca está na-mo-ran-do. Pronto, falei. – fuzilo Samantha com os olhos e sorrio amarelo para meus pais que se entreolham assustados.

- Isso é verdade Samuel? – muito sério, meu pai me pergunta.

- É claro que é, e já faz um tempão. – Samantha não contém sua verborragia mesmo depois da minha reprimenda silenciosa. Acho que ela está se vingando por eu não ter concordado em trazê-la comigo para a festa mesmo depois de Marcelinho ter dito que também viria com sua família.

- Pois agora eu faço mais questão ainda de conhecer o diretor. – resoluta, minha mãe desvia de Samantha e passa reto por mim sem nem olhar para trás. Todos nós a seguimos. Inclusive as gotas de suor frio que brotaram na minha nuca.

O DELÍRIO DA NOVIDADEOnde histórias criam vida. Descubra agora