“Todo o homem que é um homem a sério tem de aprender a ficar sozinho no meio de todos, a pensar sozinho por todos - e, se necessário, contra todos.”Romain Rolland
Quando eu tinha 16 anos minha mãe, provavelmente suspeitando dos meus desejos "anormais" me obrigou a frequentar a igreja e participar do coral juvenil. Eu nunca senti vontade de estar num meio tóxico como aquele, mesmo com meus pais sendo extremamente fanáticos, mas não me vi com outra opção já que ficaria sem minha mesada e proibida de sair se não o fizesse.
Então comecei a frequentar a igreja, nessa época eu já sabia perfeitamente que não era comum, já sabia disso antes mesmo de conhecer meu melhor amigo, já até mesmo havia ficado com algumas mulheres, mas Victoria Hull, foi algo novo para mim, ela era a filha do pastor, alguns meses mais nova que eu, ela era linda, e tão divertida, nos aproximamos devido ao coral, eu era péssima, nem sabia seguir o ritmo, e Vicky era a responsável pelo coral juvenil, então ela me ofereceu algumas aulas depois dos cultos para que eu aprendesse a não ser envergonhada frente a todos os membros da igreja, eu não estava ligando muito para isso, mas ela foi tão simpática em me oferecer ajuda, e ela no geral era a única gentil comigo naquele lugar, então eu acabei aceitando. Eu sempre acreditei fielmente que não deveríamos nos arrepender de nada, que tudo que acontecia era por um motivo, mas até hoje não sei se foi algo bom ou ruim eu e Vicky termos nos envolvido, foi algo profundo, ela foi minha primeira paixão, tínhamos planos até de fugir para longe, onde pudéssemos viver juntas e felizes, mas quando nos descobriram, ela logo tirou o dela da reta falando para seu pai que eu a tinha beijado a força, eu não fui contra sua versão, simplesmente assumi tudo calada, e aqui acabei, em Howard.
Segundo meus pais, eu não ficaria aqui para sempre, logo cairia quando estivesse curada, mas eu duvidava que um dia estivesse curada como eles queriam, então minha estadia aqui seria muito longa.
Passei a noite me revirando na cama, algo compreensível, nem eu mesma sabia explicar oque tinha acontecido dentro da sala da diretora, aquela química inexplicável, o desejo... O encaixe. Ao menos sabia o nome da diretora, e ela já estava mexendo com minha cabeça, me deixando confusa, a verdade é que fui eu quem comecei isso, sem pensar nas consequências, que poderiam ser muitas, ela era a diretora da madhouse, se sentisse que estava em risco, poderia me acusar de várias coisas contra ela, poderia me deixar na "solitária" pelos próximos meses até que eu estivesse louca o suficiente para nem saber meu próprio nome, tudo isso poderia acontecer e eu não a conhecia, não sabia do que ela era capaz, sei que boa fama nenhum diretor de madhouse, asylum ou hospício possuía, eles tinham fama de sádicos e ela poderia não ser diferente. Mas eu não pensei em nada disso enquanto seus lábios estavam contra os meus, e mesmo se ela não fosse assim, se alguém espalhar um boato que eu e ela tivemos algo, isso poderia acabar com a minha vida e com a dela.
Eu fui uma tremenda irresponsável, essa era a completa verdade.
Cheguei a conclusão que deveria esquecer isso, esquecer que um dia tivemos algo, seria melhor para mim e certamente era oque ela queria.
...
— O que aconteceu? — perguntei quando cheguei ao lado de Claudette na fila, algo estava estranho, todos no refeitório estavam quietos, os enfermeiros e algumas freiras que eu encontrei no caminho pareciam até mesmo aflitos.
— Não soube? — ela me perguntou, e eu neguei com a cabeça não me surpreendendo por Claudette saber disso, afinal ou eu era muito desinformada ou ela que era muito informada, eu apostava na segunda opção — Encontraram Michael Angelim morto no armazém hoje um pouco antes do sino ser tocado.
— Como? — perguntei boquiaberta, Claudette somente ergueu uma das mãos, indicando para mim esperar, então caminhou até às freiras da cantina e começou a colocar sua refeição sobre a bandeja branca, eu segui seus passos colocando apenas macarrão no meu prato como sempre.
Caminhamos em silêncio até o fundo da terceira fileira de mesas novamente, e só quando já estávamos sentadas, com Claudette desembrulhando os talheres de plástico que ela continuou.
— Uma das freiras encarregadas das refeições dos pacientes encontraram o corpo dele, aparentemente fresco ainda, estão decidindo que medidas adotar ainda, porque segundo oque eu soube, é a segunda morte em quatro meses — arregalei os olhos chocada, duas mortes? Como eu não sabia disso?
— Não falaram nada sobre mortes frequentes para meus pais.
— Claro, e manchar a imagem da madhouse? — respondeu com obviedade — Mas a questão é que ainda não sabem o que vão fazer, a polícia está em cima da diretora e as suspeitas estão sendo postas sobre algum paciente.
— Impossível, aqui é muito rigoroso, não teria brecha — olhei para o redor pensativa, então algo me veio à mente, mas preferi ficar quieta — Quem você acha que foi?
— Imagino que algum paciente, Lauren, o que mais tem aqui são assassinos — deu de ombros como quem não se importa.
— Como pode estar tão tranquila? Estão matando pacientes, podemos ser as próximas!
— Improvável, temos famílias e isso já seria um fato bem relevante para sermos descartadas por um possível serial killer — franzi o cenho confusa, Claudette suspirou sem paciência — Você é muito lerda Lauren, é só pensar, quem está fazendo isso não é qualquer doente, é alguém que sabe o que está fazendo, para não ter sido pego mesmo com tanta segurando, e tem boatos que rolam solto sobre isso ser algo recorrente, mas que não vai ao conhecimento da polícia para não acabarem fechando a madhouse, a pessoa que está matando pega pessoas sem famílias, que não vão ser procuradas, algo que passe despercebido, entendeu? — acenei lentamente assimilando suas palavras — Somos de famílias ricas, não estamos avulsas aqui — novamente deu de ombros.
— Como pensou nisso?
— Como você não pensou? — revirou os olhos — Isso é bem óbvio, qualquer otário iria supor isso.
— Às vezes você me dá umas facadas que nem sente, sabia? — disse revoltada.
— Ser sincera sempre foi uma das minhas qualidades.
— Só espero que você esteja certa, ainda tenho esperanças de conseguir sair daqui com vida.
— Sempre estou.
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Madhouse
Romance- No século 20 não precisava de muito para você ser considerado fora dos padrões e automaticamente ser visto como uma pessoa com algum problema mental. A instituição mental de Howard foi fundada pelo monsenhor Timothy Howard para ser algo revolucion...